Esta e outras recomendações do Comité das Nações Unidas dos Direitos das Pessoas com Deficiência figuram de um documento com 11 páginas, redigido na sequência da avaliação de Portugal sobre a aplicação e cumprimento das normas estabelecidas pela Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
Uma comitiva, liderada pela secretária de Estado para a Inclusão das Pessoas com Deficiência, Ana Sofia Antunes, foi ouvida em março, tendo sido essa a primeira vez que Portugal foi submetido ao processo de monitorização desde que ratificou a convenção, em 2009.
Agora, o Comité das Nações Unidas manifesta preocupação pela forma como as pessoas com deficiência são tratadas em Portugal, em matérias que vão desde a justiça, saúde, educação, transportes ou acesso a uma vida independente, além de preocupação com a forma como a crise afetou a vida destas pessoas.
No que diz respeito à Justiça, o Comité diz-se preocupado com o facto de o Código de Processo Penal declarar inimputáveis as pessoas com deficiência psicossocial e que “não se respeitem as suas garantias processuais no curso dos procedimentos penais”.
Por isso, pede que Portugal “retire da legislação penal o critério de perigosidade e as medidas preventivas e de segurança relacionadas com isso, nos casos em que uma pessoa com deficiência psicossocial seja acusada de ter cometido um crime”.
Pede também que seja revista a legislação penal para garantir que “todas as pessoas com deficiência tenham as garantias do devido processo, incluindo a presunção de inocência”.
Interferências nas liberdades individuais
Outro aspeto que preocupa o Comité tem a ver com as pessoas com deficiência declaradas legalmente incapacitadas e que são alvo, “contra a sua vontade, de processos de interrupção de gravidez, esterilização, investigação científica, terapia eletroconvulsiva ou intervenções psicocirúrgicas”.
A forma como as pessoas com deficiência são vistas pela lei portuguesa traz “profunda preocupação” ao Comité, que questiona como é que ainda existe um “grande número de pessoas com deficiência submetidas ao regime de tutela total ou parcial” e que, por causa disso, estão “privadas do exercício de certos direitos, como o direito ao voto, a casar, a formar família ou a gerir bens e propriedades”.
Pede, por isso, que o Código Civil seja revisto e harmonizado de modo a garantir que as pessoas com deficiência possam casar, adotar ou ter a custódia dos filhos.
Sobre a crise e as medidas de austeridade, o Comité sublinha “os esforços” feitos por Portugal para mitigar o impacto das medidas nas pessoas com deficiência, mas diz-se preocupado com o facto de não haver qualquer tipo de apoio para pessoas que “se veem obrigadas a viver em situação de indigência ou pobreza extrema”, por não terem rede familiar ou acompanhamento.
Nesse sentido, pede a Portugal que “reveja com urgência” as medidas de austeridade, ofereça serviços de apoio à vida independente, intensifique os esforços para melhorar o direito a um nível de vida adequado e à proteção social.
Quer também que Portugal recorra aos Fundos Estruturais Europeus ou outros para minimizar o impacto das medidas de austeridade nas crianças com deficiência, melhorando o apoio dado às famílias.
Por outro lado, o Comité afirma-se preocupado com o facto de não haver uma política nacional para a vida independente e pede a Portugal que adote uma estratégia nacional, onde seja incentivada a vida em comunidade em vez das instituições.
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