HealthNews (HN)- A MSD promove este sábado uma conferência para analisar os benefícios e o impacto da Inteligência Artificial. Qual a importância do evento no contexto atual da saúde?

Hugo Gamboa (HG)- Considero que a educação dos médicos precisa de ter uma noção mais clara sobre o potencial destas novas tecnologias. São ferramentas que vão representar muitos desafios, mas também muitas oportunidades… É por isso que considero que a não participação da classe médica nesta discussão será muito limitante. A saúde do futuro passará por estas tecnologias de IA, sendo por isso que os médicos são chamados a perceber melhor o seu funcionamento. Portanto, a Conferência Leading Innovation, Changing Lives pretende apoiar clínicos na utilização destas ferramentas e mostrar seu potencial.

HN- Hoje em dia há uma maior preocupação pela medicina preventiva. Em que medida a Inteligência Artificial possibilita a realização de diagnósticos mais precoces e precisos?

HG- A recolha de dados sobre os indicadores de saúde dos doentes é uma fonte preciosa para que a IA funcione. Estas informações vão permitir detetar variações, de forma muito precoce, sobre mudanças de peso ou mesmo de alterações no sono. Todos estes dados são analisados por algoritmos, gerando alertas para o próprio doente e para o clínico que o acompanha. Isto permite com que o médico intervenha depressa, sobretudo numa situação reversível.

HN- Cada vez mais ouvimos falar sobre a importância da informatização dos dados nas unidades de saúde. Considera que a IA permite uma melhor gestão e otimização dos recursos?

HG- Sim, mas as experiências mais notáveis na história da introdução da IA na Medicina é mais no apoio ao diagnóstico. Temos alguns algoritmos que conseguem identificar erros ou falhas de dados e que conseguem complementar os dados com informação de outras fontes para podermos ter a melhor perspectiva sobre o doente. Tem vindo a ser utilizado o Data Curation para o apoio à decisão dos clínicos.

HN- Mas equipar hospitais e centros de saúde com este tipo de tecnologia de ponta representa um investimento económico significativo…

HG- Sim, mas aos poucos começamos a ver a introdução deste tipo de tecnologias. Um exemplo muito simples é o reconhecimento da fala. Temos médicos que no seu dia-a-dia utilizam estas ferramentas para realizar relatórios clínicos. É algo que poupa tempo aos médicos e que já faz parte da prática clínica. Portanto, nem tudo tem que significar uma mudança radical…

HN- E no que toca à melhoria dos indicadores de saúde das populações, qual o impacto da IA?

HG- A monitorização dos dados e a previsão daquilo que pode acontecer a um determinado grupo de doentes vai permitir orientar práticas clínicas e tipos de tratamentos eficazes para a criação de “valor em saúde”. Trata-se de uma visão que mede o custo e o benefício para o doente.

HN- A humanização no tratamento das doenças é algo que tem vindo a ser fortemente discutido pela comunidade médica. A IA não contraria este princípio?

HG- Alguns destes processos tendem a gerar automação, isto é, permitem com que algumas tarefas sejam feitas diretamente pelo computador e não por um médico. Portanto, pode contribuir para a otimização dos recursos, mas a questão da desumanização pode acontecer.

Numa experiência que fizemos em que acompanhamos, de forma remota, doentes após uma intervenção cirúrgica verificamos que, por haver mais transmissão de informação, o contacto dos enfermeiros à distância foi maior do que o tempo que os pacientes teriam se fossem ao hospital. Portanto, estas tecnologias às vezes até permitem humanizar mais, se forem bem usadas, os cuidados de saúde.

HN- O erro médico está entre as principais causas de morte nos Estados Unidos. De que forma a IA pode contribuir para diminuir estas estatísticas?

HG- A IA permite o auxílio na tomada de decisão. Estes algoritmos fornecem aos médicos uma sugestão de diagnóstico. No entanto, há situações em que é importante que os clínicos questionem algumas destas sugestões… Pode acontecer alguns médicos perderem competências por causa da automação da IA. Os médicos devem continuar a ser críticos.

Portanto, respondendo à pergunta, a IA pode diminuir o erro médico, mas se o levarmos ao extremo podemos gerar erros por confiar demasiado na tecnologia.

HN- Uma nota final

HG- Quando olhamos para o futuro da IA, a questão da substituição dos médicos é sempre algo muito premente. De qualquer forma, é importante frisar que a ligação do ser humano com a tecnologia é o que vai potenciar o futuro da saúde. Portanto, a IA não se trata de substituir os médicos, mas sim um trabalho conjunto. O contacto humano vai ser sempre mantido.

Entrevista de Vaishaly Camões