“Não vale a pena ter ilusões de que vamos conseguir interromper a circulação do vírus. Não há país nenhum neste momento que tenha essa ilusão. Portanto, a primeira prioridade é tentar cobrir, o mais possível, as pessoas que são de grande risco nas primeiras 10 semanas [da campanha de vacinação]”, para prevenir a doença grave e não sobrecarregar os hospitais, disse Manuel Carmo Gomes à agência Lusa.

“Se evitarmos que haja um número muito grande de pessoas a ir parar aos hospitais, estamos a reduzir o impacto e o objetivo é esse: proteger vidas e proteger também o sistema nacional de saúde, portanto, daí a razão de se dar prioridade a estas pessoas e é isso que vai acontecer”, reiterou.

Carmo Gomes, membro da Comissão Técnica de Vacinação contra a covid-19, afirmou que o vírus que está a circular não é o mesmo do início do ano, com capacidade de fugir aos anticorpos, sendo que a maioria da população já foi vacinada ou infetada há vários meses, o que faz com que a concentração de anticorpos no sangue esteja muito baixa.

Contudo, explicou o professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, a população continua protegida de doença grave, porque há uma parte do sistema imunitário que se mantém protetor, o que se chama “imunidade celular”.

“Os anticorpos podem baixar, nós podemos ser infetados, mas a imunidade celular, que é uma segunda barreira de defesa do sistema imunitário, continua a proteger-nos contra doença grave e não há evidência (prova) que todo este novo jardim zoológico de subvariantes do vírus seja capaz de vencer a nossa imunidade celular a não ser nas pessoas que têm doenças crónicas, as pessoas mais idosas que têm um sistema imunitário mais em baixo, imunocomprometido por qualquer razão. E são estas pessoas que nós priorizamos agora para a vacinação”, realçou.

Segundo o especialista, a vacina que vai ser administrada contra a covid-19 é monovalente, dirige-se apenas à subvariante XBB.1.5 do coronavírus SARS-CoV-2, mas protege “contra a esmagadora maioria das variantes que estão a circular do vírus neste momento”, sendo que “não houve felizmente evidência (prova) de que estas novas subvariantes sejam mais patogénicas”.

Manuel Carmo Gomes avançou que se sobrarem vacinas, provavelmente, serão disponibilizadas para toda a população que se queira proteger, mas ressalvou que a prioridade são as pessoas com risco significativo de ter doença severa. “Nós sabemos que o risco de ir parar ao hospital de uma pessoa com mais de 70 anos, nomeadamente os mais idosos, os maiores de 70 e de 80, é muito maior do que uma pessoa de 50, 40, 30 anos”, vincou.

Questionado sobre se as pessoas mais vulneráveis deviam usar por sua iniciativa máscara em locais fechados com aglomerados de pessoas, o epidemiologista disse que é uma “medida inteligente” e que deve ser adotada por “pessoas que não querem ser infetados de maneira nenhuma, e há 1001 boas razões para não querer ser infetado, nomeadamente as pessoas que são mais frágeis ou que contactem com pessoas muito frágeis em casa, por exemplo”.

“Não creio que existam razões para estar a impor, exceto em situações muito particulares, como unidades de saúde, locais onde estão pessoas muito fragilizadas, a utilização de máscara neste momento. Não quer dizer que daqui a dois meses não mude de opinião (…). Agora as pessoas têm que ter consciência de que têm que se proteger”, nomeadamente em locais onde o ar não está ventilado, espaços fechados com grandes concentrações de pessoas.

Por outro lado, também é “uma medida inteligente” as pessoas que estão infetadas ou têm sintomas como tosse, espirros, utilizarem por iniciativa própria, máscara para proteger os outros com os quais contacta no trabalho, nos transportes públicos, etc.