Numa carta enviada hoje à administração do Centro Hospitalar e Universitário do Algarve (CHUA), cerca de um mês depois de terem comunicado que se recusavam a fazer trabalho suplementar, os chefes de cirurgia justificam a medida com a "persistência das atuais, inaceitáveis e degradadas condições de trabalho no serviço de Urgência".
Em declarações aos jornalistas após um encontro que reuniu vários médicos e o bastonário da Ordem dos Médicos, no hospital de Faro, o diretor do serviço de Cirurgia, Martins dos Santos, disse que esta era "uma posição última", depois "de várias promessas" de melhoria das condições, sublinhando que há "uma exaustão que põe em causa a qualidade" do serviço prestado.
Aos jornalistas, à margem do encontro, a presidente do Conselho de Administração do CHUA, Ana Paula Gonçalves, disse que caso os cirurgiões avancem com a intenção de não fazer urgências em 01 de janeiro, o serviço será garantido por um conjunto de 12 médicos tarefeiros que já “há muito tempo” que colmatam estas falhas.
Uma das reivindicações dos chefes de equipa expressas na missiva, a que a Lusa teve acesso, é o pagamento idêntico ao dos chamados médicos tarefeiros, uma vez que, "para o mesmo trabalho", a remuneração "está sujeita a regimes muito díspares".
Ana Paula Gonçalves, afirmou compreender que os médicos não vejam essa disparidade “com bons olhos”, mas sublinhou que esse não é um problema cuja resolução “esteja na mão” da administração do CHUA, uma vez que “existem regras” diferentes para o pagamento de quem tem vínculo e dos tarefeiros.
Entres os problemas enumerados pelo chefe do serviço de Cirurgia, há também limitações de espaço e de condições para observar os doentes, falta de camas para internamento de doentes urgentes e dificuldades no acesso ao bloco operatório.
"Os cirurgiões não têm condições para observar doentes, têm uma única sala onde têm de observar 30 a 40 doentes e têm sistematicamente dificuldade em aceder ao bloco operatório”, referiu, acrescentando que a falta de camas faz com que os doentes se “amontoem” no serviço de Urgência.
Aquele responsável diz que em 32 anos no hospital de Faro a situação “nunca esteve tão má” como agora, com risco para os profissionais e para os utentes, já que está em causa, também, até “a sua capacidade de discernimento”.
Ana Paula Gonçalves admitiu que há falta de espaço no hospital, mas adiantou que está previsto, no próximo ano, o alargamento do serviço de Urgência.
A intervenção está já no plano de investimentos para 2020 e vai permitir “acomodar melhor e com maior conforto” os doentes, embora já tenham vindo a ser concretizadas melhorias pontuais no serviço, referiu.
“O nosso hospital é mesmo um hospital inadequado à tipologia de cuidados que os doentes hoje merecem. Nós isso não escondemos, de maneira nenhuma. Agora, que não está nas nossas mãos, de um dia para o outro, fazer isso, não está”, afirmou.
Aos jornalistas, o bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, manifestou “total solidariedade” para com aqueles profissionais, que “estão muitas vezes a trabalhar sem a segurança clínica adequada”.
"O que estes médicos estão a fazer é dar um grito de alerta", disse, responsabilizando o Ministério da Saúde, que tem "que olhar com outros olhos para esta situação" e tomar medidas para que os médicos do Serviço Nacional de Saúde (SNS) sejam pagos de forma idêntica aos chamados tarefeiros.
Miguel Guimarães defende que os médicos “que fazem SNS todos os dias e que vestem a camisola”, quando estão a fazer serviço de urgência em horas extraordinárias, “sejam pagos da mesma forma que são pagos os médicos tarefeiros.
Segundo o bastonário, os tarefeiros são contratados à hora por um valor que varia entre os 40 e os 50 euros, enquanto os médicos que estão no quadro dos hospitais ganham entre 12 a 17 euros à hora pelo mesmo serviço.
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