“Se os centros de saúde só estão abertos no horário de expediente estão, portanto, abertos para reformados e desempregados. Os outros cidadãos que têm direito a aceder aos centros de saúde sem necessidade de faltar ao trabalho têm muitas dificuldades de acessibilidade”, afirmou em entrevista à agência Lusa o bastonário da Ordem dos Médicos, que está a terminar o seu segundo mandato.
Para José Manuel Silva, o alargamento do horário dos centros de saúde é imprescindível para desobstruir as urgências hospitalares e para criar o hábito nos cidadãos de recorrerem ao médico e ao enfermeiro de família.
Neste período de maior incidência de gripe, o bastonário refere que, mesmo na zona Norte, se sente o aumento de procura de urgências dos hospitais quando é uma região que tem uma cobertura de quase 100% ao nível dos cuidados de saúde primários.
Ou seja, José Manuel Silva defende que há que criar uma cultura de procura dos centros de saúde, em vez de “se cair na demagogia” de culpar os doentes por irem às urgências.
“As pessoas não são estúpidas. Se vão à urgência e estão lá seis horas, não vão fazer turismo. Se vão à procura de uma resposta é porque não têm uma resposta melhor a outro nível. Enquanto culpamos os doentes não implementamos soluções”, comentou.
Considera ainda que deve haver uma política que faça com que as pessoas procurem os centros de saúde também através do telefone.
“Os enfermeiros e os médicos de família podem aconselhar com muito mais propriedade e qualidade do que um telefone que atende as pessoas com um algoritmo rígido”, disse, em referência ao atendimento da Linha Saúde 24, serviço sobre o qual o bastonário tem contestado a perpetuação.
Confrontado com a realidade de que muitas vezes há centros de saúde em que a demora a atender telefones é significativa, José Manuel Silva volta a lançar argumentos contra a Linha Saúde 24.
“[Os centros de saúde não atendem] Porque têm falta de meios? Se têm, o investimento na Linha Saúde 24 deve ser feito nos cuidados de saúde primários. O doente é mais bem atendido pelo seu médico ou enfermeiro de família”, insistiu.
Esta mudança de atitude das pessoas face aos cuidados de saúde que procuram deve fazer parte, segundo o bastonário, de uma promoção da literacia para a saúde que considera que tem sido manifestamente insuficiente.
A literacia em saúde pode ser definida como a capacidade para tomar decisões em saúde fundamentadas.
“Precisamos de literacia em saúde, o que retirava muitas pessoas durante o inverno das urgências”, argumenta o representante dos médicos, que considera importante passar mensagens simples às pessoas.
Exemplifica com o boletim de saúde infantil, no qual considera que deveria constar que é normal que as crianças até aos dez anos tenham em média dez infeções por ano, cerca de metade das quais com febre.
Ainda sobre a informação que chega ao público, José Manuel Silva lamenta que quando os centros de saúde decidem alargar os seus horários de atendimento nos picos de gripe esse anúncio seja apenas feito “na véspera ou antevéspera”.
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