
De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde e do Centro Europeu para a Prevenção e Controlo das Doenças, nos últimos 20 anos foram detetados mais de 360 mil casos de Borreliose Lyme (BL) na Europa, uma doença que afeta o sistema nervoso central, entre outros órgãos e sistemas, com sintomas semelhantes aos da esclerose múltipla e até de fibromialgia.
O estudo hoje revelado e que é considerado “inédito” envolveu cientistas do Centro de Investigação e de Tecnologias Agroambientais e Biológicas (CITAB), da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), e do Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT) da Universidade Nova de Lisboa (UNL).
“A infeção ocorre através da mordedura de uma carraça infetada que habita áreas florestadas. Por exemplo, durante a caça ao javali, assim que o animal é morto, a carraça procura imediatamente um novo hospedeiro”, explicou Maria das Neves Paiva Cardoso, do CITAB.
Os cientistas alertaram para o "risco elevado de saúde pública", não só para os caçadores mas também para as pessoas que trabalham ou efetuam atividades de lazer ao ar livre em espaços agroflorestais.
Cuidados a ter
Por isso, para evitar o contágio, dizem que os caçadores devem manipular os animais com luvas, colocar as meias por fora das calças e, quando chegam a casa, verificar se têm carraças no corpo, nomeadamente pedindo a uma outra pessoa que os examine. Já os cães devem estar desparasitados externamente e utilizar coleiras repelentes.
“Outro problema é que, depois do leilão (dos animais abatidos), os caçadores transportam o javali dentro do carro que, muitas vezes, é a viatura da família. As carraças vão ficar no jipe e podem lá sobreviver durante vários meses”, afirmou a especialista.
A investigação, desenvolvida em parceria com os Laboratórios de Ecologia Aplicada e de Inspeção Sanitária da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), revelou a presença de ADN da bactéria em três dos 90 javalis analisados.
“Os dados agora conhecidos são muito promissores e um estímulo para prosseguir a investigação da BL, de modo a conhecer-se mais sobre o modo de transmissão da bactéria aos humanos e animais domésticos e selvagens, e com vista à redução dos riscos para a saúde pública”, acrescentou Maria Luísa Vieira do IHMT.
A especialista salientou ainda que esta descoberta “era perseguida há anos, e sem sucesso, por várias equipas de investigadores estrangeiros.”
Maria Luísa Vieira referiu que a BL é uma doença “subdiagnosticada no país e por isso pouco reportada".
A infeção ocorre através da mordedura de uma carraça infetada e os sintomas mais comuns da doença são a fadiga generalizada, inchaço dos gânglios linfáticos próximos da zona de mordedura, mal-estar, dores de cabeça, por vezes febre e calafrios, rigidez do pescoço, dores musculares e articulares, podendo ocorrer paralisia facial e outros distúrbios do sistema nervoso central.
O diagnóstico de referência da doença em Portugal só está disponível na área de Lisboa, mas os investigadores consideraram que Trás-os-Montes apresenta "fortes argumentos" para a instalação de uma unidade equivalente.
“Uma unidade especializada de diagnóstico de BL vai permitir um diagnóstico mais rápido e avanços na investigação, nomeadamente perceber que outros animais domésticos e selvagens são hospedeiros de carraças infetadas, e que impacte podem ter na saúde pública”, defendeu Maria das Neves Paiva Cardoso.
A investigadora da UTAD concluiu que a “região tem uma grande área agroflorestal com condições ideais para o desenvolvimento da carraça e a caça é uma atividade com enorme peso económico”.
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