Cerca de sete mil doentes com fibrilhação auricular que não podem tomar anticoagulantes para prevenir os acidentes vasculares cerebrais têm agora uma nova esperança: um dispositivo introduzido por cataterismo, sem recurso a cirurgia, técnica já utilizada em dois hospitais públicos.

“O que é habitual usar nestes doentes para prevenir a formação dos AVC são os medicamentos anticoagulantes, que diminuem a capacidade de formar coágulos dentro das cavidades auriculares, mas aumentam também o risco de causar uma hemorragia”, explicou à Lusa Eduardo Infante de Oliveira, cardiologista do Hospital de Santa Maria.

As estimativas indicam que um quarto dos doentes com fibrilhação auricular (arritmia cardíaca) não pode usar este tipo de terapêutica e, “até há pouco tempo, não havia nenhuma alternativa para oferecer a estes doentes, que ficavam bastante desprotegidos”, adiantou.

Segundo o médico, esta ideia não é propriamente nova porque os cirurgiões já encerravam o apêndice auricular esquerdo quando faziam intervenções cirúrgicas por doença valvular em doentes que apresentavam fibrilhação auricular, um distúrbio do ritmo cardíaco

“O que é inovador é a capacidade de podermos fazer isto sem intervenção cirúrgica, mas por cateterismo, que é uma via minimamente invasiva em que o risco para o doente é substancialmente inferior”, explicou Eduardo Oliveira.

O médico explicou que a fibrilhação auricular é uma contração desorganizada das aurículas, que não contraem de uma forma eficaz e o sangue fica estagnado dentro dessas estruturas, particularmente dentro do apêndice auricular esquerdo, que é a cavidade que é encerrada com o dispositivo.

“O intuito de encerrar esta cavidade é porque é nesse local que se formam 90 por cento dos coágulos que depois migram para a corrente sanguínea e podem causar o acidente vascular cerebral”, justificou.

Neste momento, o dispositivo já foi aplicado com sucesso em 24 doentes que apresentavam risco elevado de AVC e tiveram episódios hemorrágicos significativos.

O dispositivo já está a ser aplicado nos hospitais de Santa Maria e Santa Marta, estando prevista a sua implementação no primeiro trimestre de 2012 em Coimbra e, provavelmente, no Norte do país, avançou o médico.

Os AVC resultam do bloqueio súbito de artérias cerebrais por trombos que se libertaram do apêndice auricular para a corrente sanguínea.

Estudos demonstram que mais de 90 por cento dos trombos formados nestes doentes têm origem neste apêndice.

O risco de AVC aumenta com a idade, mas também o risco de hemorragia, e, segundo o cardiologista, “os mais idosos são os que mais beneficiam do tratamento com medicamentos anticoagulantes, mas simultaneamente podem sangrar com mais facilidade”.

Um estudo de eficácia e segurança, realizado em cerca de 800 doentes, demonstrou existir uma redução de 29% do risco de AVC e de 28% da taxa de mortalidade nos doentes submetidos ao encerramento percutâneo do apêndice auricular esquerdo quando comparados com os doentes medicados com terapêutica anticoagulante.

Estima-se que a fibrilhação auricular atinja cerca de 2,5% da população portuguesa acima dos 40 anos.

14 de dezembro de 2011

@Lusa