Os media são fonte de informação, por vezes de conhecimento, que é a informação digerida pela experiência. Quando assim é, cumpre papel nobre e de grande utilidade, alargando a capacidade de questionar a todos os que forem curiosos ou interessados no tema, e torna ator quem durante séculos foi excluído de decisões que afetam o seu próprio interesse, nomeadamente os doentes e suas famílias. Assim sendo, os media têm uma responsabilidade idêntica à dos professores, privilégio que só deve ser atribuído a quem se propuser esclarecer com isenção e rigor. Poucas coisas serão tão devastadoras na vida de uma criança quanto um professor ignorante no assunto que lecciona, preguiçoso na busca das fontes de onde colhe o conhecimento e que, com leveza e sem sentido da responsabilidade, ensina mentiras.

A minha vida profissional rodou em torno de três eixos: a saúde infantil, o cérebro e o cancro. Temo que se as questões jurídicas, de economia, políticas etc., forem tratadas por revistas e televisões com o mesmo grau de exatidão com que são tratadas as questões da saúde vivamos numa sociedade ficcionada. Na verdade, os erros grosseiros, a valorização de terapêuticas sem qualquer base científica, a promoção de charlatões sem cuidar da probidade do que afirmam, é prática comum nos media portugueses. O role é enorme e vai desde as chamadas “medicinas alternativas”, até às terapêuticas milagrosas que vendem esperança aos desesperados, passando por quem interpreta sentimentos e ações à luz de teorias psicológicas com pés de barro.

A ignorância é a mãe de todos os vícios jornalísticos. Ignorância de quem lê, impreparação de quem escreve. Se é perseguido quem intruja inocentes com o “conto do vigário”, ou a quem leva o ouro para benzer e afastar um mau-olhado, já nada sucede aos canais de sinal aberto que anunciam terapêuticas formidáveis, e que levam a que famílias penhorem casas ou se endividem até ao fim das suas vidas porque confiam em quem não merece crédito.

A “notícia” é a moeda de transação que faz girar o mundo dos “blocos informativos” em conluio com quem não consegue fazer passar o “milagre” pelo crivo razoavelmente apertado das revistas científicas. A ética jornalística utilizada na seleção das notícias referentes à saúde tem de ter o mesmo rigor que se aplica noutras áreas, sem o que as televisões e jornais acrescentarão vítimas, às vítimas da vulnerabilidade que a doença sempre traz, acrescida da fragilidade de acreditar. Os professores têm o enorme privilégio de educar, os media também, se não esquecerem que tal regalia é acompanhada de uma responsabilidade de igual dimensão.

Nuno Lobo Antunes
Neuropediatra e Diretor do PIN
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