Não existe aspiração maior para os pais do que ter a certeza de que os filhos têm tudo para serem felizes. Depois de crescer pressionada para atingir o sucesso e com o primeiro filho prestes a nascer, Christine Carter tentou descobrir o que a sociologia tinha a revelar sobre a felicidade na infância. Apoiada por estudos científicos e orientada pela experiência de vida, a autora partilha algumas certezas sobre a melhor forma de atingir a meta máxima dos seres humanos, a tão ambicionada felicidade.

Como surgiu a necessidade de explicar aos pais que é possível fabricar a felicidade?

Ao contrário do que se possa pensar, em criança, eu não era o retrato da felicidade. Sentia-me muito ansiosa, era tão tímida e facilmente frustrada que chorava todos os dias na escola até à segunda classe. Surpreendentemente, tornei-me uma professora comunicativa. Aos 28 anos, era bem sucedida, perfecionista e estava grávida.

Com o meu primeiro filho a caminho, tomei consciência de que algo tinha de mudar. Não queria que os meus filhos fossem ansiosos como eu. Decidi investigar a felicidade sob uma perspetiva académica da sociologia da felicidade na infância. Queria saber que tipo de crianças estava feliz e porquê, conhecer os seus hábitos e crenças.

De que forma é que o comportamento dos pais determina o dos filhos?

A principal diferença entre os ambientes sociais das crianças felizes, versus as infelizes, é que os pais tendem a ensinar essas habilidades e servem de exemplo. Vários estudos focados em modelos distintos de parentalidade demonstram que os pais ternos e amorosos, mas que sabem estabelecer limites, cumprindo as regras e aplicando-as, tendem a ter filhos mais seguros, mais sociáveis e felizes.

Qual a importância da inteligência social na busca de felicidade?

A inteligência emocional e social é um dos pilares da felicidade. Os pais podem incutir aos filhos inteligência social através da emoção que depositam em cada atitude e na sua própria capacidade de serem felizes. Este atributo desenvolve-se transmitindo às crianças a capacidade de serem optimistas, de saberem partilhar e perdoar. Podemos ajudar os nossos filhos a fazer amizades e ajudá-los a lidar com a dor quando se sentem tristes e revoltados.

Devemos também atribuir importância aos jantares em família. O jantar é uma boa altura para saborear as alegrias do dia e o momento presente. Os estudos provam que as crianças que jantam regularmente com as famílias são emocionalmente mais estáveis, têm melhores resultados escolares e são menos propensas à obesidade ou a sofrerem de distúrbios alimentares.

Quais são os erros que os pais cometem e que se revelam inimigos da felicidade dos filhos?

O principal erro é que os pais tendem a preocupar-se com a felicidade dos filhos, antes de cuidarem de si próprios. Se realmente querem construir um ambiente onde a criança se sinta feliz, o primeiro passo é conseguirem ser felizes sozinhos.

A felicidade, a paz interior, a satisfação e a alegria estão dentro de nós e não adianta procurá-las apenas no mundo exterior. Nunca é tarde para se ser um adulto feliz, mesmo tendo sido uma criança infeliz. O altruísmo e o voluntariado são caminhos para uma felicidade duradoura.

Na sociedade atual, como pode uma mulher colocar a máscara de oxigénio e encontrar tempo para se organizar e rejuvenescer, como refere no livro?

É importante arranjar tempo todos os dias para fazer algo que nos dê prazer. Mesmo que tenha apenas dez ou 20 minutos para ler, por exemplo, é vital fazê-lo. Programe esse momento como se fosse um encontro a que não pode faltar. Esses minutos irão contribuir para que se sinta bem consigo própria. E a felicidade como pais influencia a dos filhos a diversos níveis.

Uma pesquisa recente atribuiu uma relação entre mães que se sentem deprimidas e resultados negativos nos filhos, como ansiedade e outros distúrbios comportamentais. Os pais deprimidos tendem a ser menos eficazes e, consequentemente, menos aptos a corrigir o mau comportamento das crianças.

Como é que a felicidade pessoal influencia o bem-estar da criança?

Emoções como felicidade são incrivelmente contagiantes, espalham-se como vírus. As pessoas felizes têm relações sociais mais fortes do que as pessoas menos felizes, em parte porque a felicidade leva os outros a quererem ser nossos amigos e porque ter amigos nos torna felizes.

Além disso, as emoções positivas dão-nos mais recursos para sermos melhores pais, e isso afeta os filhos, também. Estes tendem a imitar as emoções dos pais, principalmente, nos primeiros anos de vida. Se a família demonstra sinais de felicidade é natural que esse estado de espírito se reflicta nas crianças. As pesquisas mostram que quanto mais juntos estamos, mais semelhantes nos tornamos.

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Que passos os pais devem seguir para criar o ambiente familiar ideal?

Manter sempre a calma, mesmo em situações de conflito, ajudar os filhos a ver a perspectiva do outro e não apenas a deles e encontrar soluções que obteriam bons resultados com qualquer pessoa. Para controlar uma birra ou briga entre irmãos, é melhor respirar fundo primeiro e tomar uma decisão para moderar o conflito.

Qual a atitude mais correta a devem adoptar num processo de divórcio para evitar que os filhos saiam prejudicados?

É importante que as crianças tenham a oportunidade de manter relações profundas com os dois progenitores. Quando os pais separados conseguem colaborar de uma forma eficaz, o contato pai-filho tem tendência a aumentar, o que, por sua vez, reforça uma melhor paternidade e laços mais fortes entre pais que não vivem em casa e os seus filhos.

No livro «Educar para a Felicidade - 10 passos para ajudar pais e filhos a serem mais felizes», menciona os benefícios de uma criança crescer com um pai positivamente interessado. Como é que as mães devem agir se isso não acontece?

Nenhuma infância é perfeita. As mães só podem tentar promover o envolvimento do pai, mas a sua ausência ou distância não significa que os filhos tenham de crescer infelizes. Mesmo as famílias imperfeitas e disfuncionais, muitas vezes, têm crianças muito felizes.

No meu livro não pretendo ensinar as leitoras a serem super-mães, mas a fazerem o que estiver ao seu alcance para serem boas mães e conseguirem que os filhos se transformem em adultos felizes e realizados. E sem culpas em relação aos erros do passado, pois este sentimento só irá consumir a energia presente.

De que forma é que a perfeição pode ser inimiga da felicidade?

A perfeição é uma forma particular de infelicidade em si mesma. Por definição, significa nunca estar feliz consigo próprio ou com o trabalho. Pressionar para o sucesso, geralmente, resulta ao contrário.

A longo prazo, as crianças pressionadas raramente crescem a saber quem são ou o que querem para si e muito menos o que as torna felizes. Os pais que dão demasiada importância aos resultados têm mais tendência a ter filhos com elevados níveis de depressão e ansiedade.

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Que estratégias os pais devem usar para estimular a curiosidade dos mais novos e a vontade de aprender?

O mais importante é valorizar o esforço que as crianças fazem para atingir os objetivos e não a inteligência inata, o talento. Quando tem uma boa nota no teste, deve-se elogiar o seu esforço, em vez de dizer algo como «Que boa nota tiveste no teste. És muito inteligente!». Este tipo de elogio é confuso e causa problemas.

Precisamos de transformar a mensagem positiva em frases como «Sei que és capaz se te esforçares». Devemos ajudar as crianças a envolverem-se no processo de aprendizagem, em vez de focar a atenção no resultado final.

O currículo de Christine Carter

Doutorada em sociologia, na Universidade da Califórnia, Berkeley, na especialidade de felicidade na infância, Christine Carter tornou-se diretora executiva do Greater Good Science Center, um centro de investigação multidisciplinar da mesma universidade, com a missão de explicar ao público as pesquisas na área da felicidade, altruísmo e compaixão. Um dos meios que utiliza para cumprir a sua tarefa é o seu blogue. Mãe de duas filhas, Christine Carter colabora com vários jornais e revistas nesta área.

Texto: Fátima Lopes Cardoso com Christine Carter (socióloga)