Cada vez mais dou por mim a observar os dois. Fico observá-los enquanto andam de um lado para o outro, um atrás do outro, um a explorar e o outro a tentar brincar. Começarmos com uma troca de pequenos gestos, algumas festinhas, alguns puxões, que mais tarde deram origem a pequenas interações em conjunto, pequenas chamadas de atenção, pequenas tentativas de comunicação, e depois evoluíram para algumas brincadeiras, só esporadicamente, só quando o mais velho lhe apetecia.
A diferencia de idade ainda é de 3 anos, pelo que tinha receio que não brincassem muito. Quando o mais pequenino nasceu, suspeito que o mais velho não lhe achava muita piada. Era um bebé, que (só) chorava, (só) comia, e (muito) dormia. Não fazia mais nada, e ficava quieto, calado, durante muito tempo, e ainda por mais roubava-lhe as (suas) atenções todas.
Suspeito que ficou desiludido com o "presente" que teve, e que durante tanto tempo tinha ouvido falar com tanta excitação, "que sorte, vais ter um mano!", "vai brincar tanto contigo!!!","um irmãozinho? vai ser o teu melhor amigo!!". E as suas expectativas foram subindo e subindo, e acabaram por serem goradas. Afinal, este "mano" não fazia jus aquilo do que lhe tinham prometido.
Agora, com o mais novo já com 18 meses, a andar lindamente, e a fazer-se entender já razoavelmente bem (através de muitos gestos, e poucas palavras), os dois já entram num diálogo só deles, com troca de gestos e carinhos, correria e muitas gargalhadas. E eu dou por mim a observá-los. Quando um vai buscar o outro para brincar, quando um puxa o outro e deita-se por cima de si, ou quando olham os dois um para o outro e numa troca de olhares combinam qual a próxima asneira a fazer. São brincadeiras ainda muito infantis, sem nada de complicado, próprias das idades, e que enchem a casa. Um corre, o outro vai atrás, e atiraram-se para o chão a rir. Agora foge e esconde-se, solta um gritinho para chamar o irmão, e fica à espera que o descubram. Apanhados os dois atrás da cortina, ou debaixo da cama, na tentativa de esconderem-se da mãe que os procura para o jantar.
E tão depressa são inseparáveis como inimigos. Tão depressa estão de mãos dadas a correm-me pela casa fora, como já está um a chorar porque o mais novo destruí-lhe o castelo de legos ou roubou-lhe os carrinhos. Um chora porque acha que tem legítima razão para tal, o outro chora só porque gosta de imitar o irmão. Zangam-se, chamam pela mãe, fazem as pazes e num abrir e fechar de olhos tornam-se grandes amigos outra vez. Assim, de um momento para o outro passaram de amados para desamados, de heróis para vilões. Irritam-se, zangam-se, atiram com os carrinhos ao chão, batem com os pés, e quando está instalada a trovada, eis que um faz algo que o outro achou piada, e assim, no meio do choro e lágrimas, alguém-se ri, contagia o outro, e volta o sol a brilhar.
Nunca percebi bem esta dualidade entre irmãos, esta facilidade automática e instantânea em voltar tudo ao normal, que nasce quando nasce o nosso irmão. E multiplica-se quando nascem os outros irmãos. Não se ensina, não se aprende, não se sabe explicar nem traduzir, esta cumplicidade inata, consanguínea e imaterial, (só) sentida pelos irmãos e irmãs.
Esta facilidade que temos de rapidamente fazer as pazes, e esquecer tudo. Esta cumplicidade, a troca silenciosa de olhares, o partilhar de memórias e de aventuras, de histórias para mais tarde contar, só a temos com os nossos irmãos. São os nossos melhores amigos, os nossos companheiros, quem melhor nos pode entender, e muito ajudar.
Marta Andrade Maia
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