'Ficarei', 'Quero Voltar', 'Perdoa', 'Numa Noite Branca', 'Bem Longe num Sonho Meu'... A verdade é que poderíamos ficar aqui durante várias linhas de texto a enumerar as músicas dos Anjos que foram verdadeiros sucessos.

Em miúdos animavam as festas de familiares e amigos, depois surgiu o projeto Sétimo Céu e, finalmente, a marca Anjos. Volvidos 20 anos, o balanço é mais do que positivo.

Nelson e Sérgio Rosado dizem com orgulho ao Notícias ao Minuto que a sua carreira é "uma das bem felizes" que existem no panorama musical nacional.

E feliz é também a relação com os fãs, especialmente as fãs, como não poderia deixar de ser. É com admiração que constatam que "as miúdas de há 20 anos são agora mulheres e vão aos concertos com a família toda", o que não é coisa pouca para uma banda que muitas vezes foi rotulada com "tudo o que era foleiro", apenas por seguir um género musical pop.

Olhando para trás, sente-se aquela saudade dos primeiros tempos: das multidões que gritavam pelos seus nomes, das montras que racharam com a pressão das fãs, das rádios locais que visitaram e até das coreografias.

O mais recente ponto alto da carreira foi o lançamento de 'Eterno', a música que Sérgio escreveu para cantar à mulher no dia do seu casamento. A partilha com o público foi obrigatória. "Não podia ser egoísta", explicou.

Como era a vossa relação quando eram crianças?

Nelson: Eu era o mais reguila, o mais traquina. Mas nós dávamo-nos bem. É uma questão de personalidades e as nossas jogam bem uma com a outr. E depois o ambiente familiar, a harmonia que existia em casa também fazia com que nos déssemos bem no plano pessoal e, depois também, no profissional.

Mas andavam muito de candeias às avessas um com o outro?

Sérgio: Tivemos uma relação de irmãos muito idêntica a quase todas as famílias. Claro que tivemos situações complicadas, como todos os irmãos, e a nossa mãe é que sofria porque na altura trabalhava em casa então passava muitas horas connosco [risos].

A harmonia familiar foi transportada para o âmbito profissional?

Nelson: Sim e é engraçado transpor isso para o trabalho. A verdade é que ganhámos o hábito de trabalhar juntos desde sempre, desde muito pequeninos.

Sérgio: E sempre houve química e empatia em palco. Às vezes a nossa forma de pensar pode levar a algum choque em determinados momentos, mas o que é interessante é que o produto final fica bastante enriquecido.

Já aconteceu entrarmos assim um bocadinho aziados, mas o palco é como que um remédio

Já aconteceu subirem ao palco chateados um com o outro?

Sérgio: Já aconteceu entrarmos assim um bocadinho aziados, mas o palco é como um remédio. Não me recordo de nada que tenha corrido mal num concerto por estarmos chateados.

Nelson: Em estúdio já aconteceu, mas nada de grave. Acaba por ser sempre tudo ultrapassado, porque temos personalidades que se conjugam e completam.

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O Nelson tem 42 anos e o Sérgio 38. Ambos nasceram em fevereiro© Facebook/Anjos

Como é a personalidade do Nelson?

Sérgio: O Nelson é muito mais hiperativo e enérgico do que eu. Ele é obcecado com a perfeição das coisas, com os pormenores, com a organização do dia a dia. Eu sou muito mais tranquilo, muito mais relaxado

Não existem personalidades perfeitas mas há, de facto, umas bem felizes e a nossa é uma delas

E a do Sérgio?

Nelson: O Sérgio tem um lado muito mais criativo que é importantíssimo . Acabamos por conjugar essas duas personalidades completamente diferentes. Não existem personalidades perfeitas, nem carreiras perfeitas, mas há, de facto, umas bem felizes e a nossa é uma delas.

Vocês começaram a cantar e a tocar muito cedo. Quando foi o primeiro espetáculo com direito a cachet?

Nelson: Foi em 1988, em Almada, numa passagem de ano. Era uma festa com amigos e familiares, mas eles acharam por bem dar-nos um cachet. Daí que assumamos que começámos a cantar e a tocar – como amadores – há 30 anos.

E como profissionais?

Sérgio: Há 20 anos. Foi quando começámos a gravar o álbum ‘Ficarei’ e a marca Anjos foi registada, em outubro de 1998. Mas o álbum só saiu em 1999.

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Irmãos Rosado no início da carreira enquanto Anjos© Facebook/Anjos

No ano passado lançaram o álbum ‘Longe’, mas estiveram cinco anos longe dos estúdios...

Sérgio: Sim, é verdade que estivemos um pouco ausentes no que diz respeito a discos lançados, mas não estivemos afastados. Nós somos muito de performance, vivemos muito do contacto com o público e, felizmente, nunca precisámos de fazer muita promoção e talvez tenha havido aqui um erro de estratégia que já está identificado.

Por que motivo não precisavam de apostar na promoção?

Sérgio: Porque concerto gerava concerto. Houve uma altura em que lançávamos um disco praticamente todos os anos. Depois surgiu o projeto de fazer um álbum acústico e correu tão bem que prolongámos mais um ano, ou seja, estivemos dois anos com aquele disco em várias salas de todo o país.

Foi por isso que as pessoas tiveram a sensação de que haviam estado ausentes?

Nelson: A questão é que não fomos aos coliseus, andámos pelas salas de Braga, Évora, Beja, Guimarães com promoção local. São digressões que nos enchem o ego e nas quais se contam histórias sobre as canções, não se canta apenas.

São espetáculos mais intimistas?

Sérgio: Sim e não tínhamos um espetáculo igual, era consoante o nosso estado de espírito e o próprio público. No concerto de Guimarães foram quase três horas no palco, as pessoas não nos deixavam sair e as pessoas do teatro, coitadas, a quererem ir embora [risos].

Clique deu-se quando olhámos para o público à frente dos palcos e vimos uma geração nova a cantar as nossas músicas

O disco saiu no ano passado, mas o single ‘É o Amor’ foi lançado há dois anos. Sentiram-se pressionados a fazê-lo?

Sérgio: A verdade é que tínhamos de lançar qualquer coisa nova. E esse clique deu-se quando olhámos para o nosso público à frente dos palcos e vimos uma geração nova a cantar as nossas músicas. Aí percebemos que tínhamos de lançar o disco o mais depressa possível.

Qual é o desafio que se coloca perante uma geração nova de fãs?

Sérgio: O desafio foi atualizar o nosso som sem que perdêssemos a identidade. Começámos com um registo muito pop - ‘Perdoa’, ‘Ficarei’, ‘Quero Voltar’ - e depois fomos sempre acompanhando e evoluindo.

Os pais passam o gosto pelos Anjos aos filhos. É muito engraçado

Quem é vai aos concertos dos Anjos?

Sérgio: É o público da nossa geração que já não vai tantas vezes porque tem as famílias, mas que quando pode vai e leva a família toda. Os pais passam o gosto pelos Anjos aos filhos. É muito engraçado.

Nelson: São as miúdas de há 20 anos que agora são mulheres e têm maridos e filhos e vão todos. Quando sabem que há um concerto dos Anjos organizam-se para ir e têm uma espécie de revenge pessoal. É muito giro.

As pessoas ainda compram discos?

Nélson: Compram. O nosso público gosta de ter a capa e de juntar à coleção. É claro que agora é diferente. Nós temos discos de platina que na altura equivaliam a 40 mil CD vendidos, agora só equivalem a 10 mil.

Essa mudança foi de fácil adaptação para os Anjos?

Sérgio: Sentimos que tínhamos de dar aqui uma volta para acompanhar os novos cenários que iam surgindo, a questão do YouTube, por exemplo, perdemos essa fase. Já chegámos tarde.

Houve uma fase em que não se ligava muito à música portuguesa, mas agora houve um regresso em força.

Nelson: E muito devido a uma nova geração. Geração essa que participa, sem preconceitos, no nosso álbum ‘Longe’.

Antigamente a pop era misturada com tudo o que era foleiro

Porquê sem preconceitos? Já houve preconceitos?

Nelson: Antigamente a pop era misturada com tudo o que era foleiro, uma ideia que era difundida por uma determinada elite que quando não conseguia alocar o teu estilo de música alocava-o ao género pimba. Hoje em dia isso já não existe.

É a perceção do que é português que está diferente?

Nelson: Hão-de reparar que hoje em dia tudo o que é tradicional está a ser valorizado. Temos vários exemplos disso: as tascas, os barbeiros, os alfaiates… Na música isso também aconteceu, mas nós nunca mudámos radicalmente a nossa cena.

Sérgio: E somos uns felizardos por continuarmos a fazer aquilo de que gostamos.

Quando lançámos o ‘Ficarei’, em 1999, fizemos uma tour pelas rádios locais

O que também está diferente hoje é a forma de se relacionarem com os fãs.

Sérgio: Sim, quando começámos não havia redes sociais. Mas isso foi muito bom para nós, porque conhecemos outra realidade e era bom que os artistas de agora pudessem passar por essa fase. Quando lançámos o ‘Ficarei’, em 1999, fizemos uma tour pelas rádios locais do nosso país durante quase um mês... algumas eram em caves e nós chegávamos à vila ou aldeia e estavam todos à nossa espera!

Era difícil lidar com as fãs?

Sérgio: Foi algo que também foi evoluindo, tal como nós. Mas passámos por coisas incríveis, as pessoas não fazem ideia.

Representávamos um outro tipo de coisa que os Excesso não representavamNelson: Para entrarmos nos estúdios da Valentim de Carvalho tínhamos mil e tal adolescentes à porta, os seguranças tinham de nos ir buscar. Nós representávamos um outro tipo de coisa que os Excesso não representavam. Em termos musicais estaríamos num registo diferente do deles, apesar de a linha ser pop e de atingirmos basicamente o mesmo público. Mas havia ali uma franja de público que gostava muito de nós, mas não gostava deles.

Algum episódio desse género que vos tenha marcado?

Sérgio: Houve uma sessão de autógrafos na Valentim de Carvalho do Rossio [que já não existe]. A pressão por dentro era tão grande que as montras racharam. Havia alturas em que os seguranças agarravam em nós e começavam a correr, que era só a pior coisa que se podia fazer [risos]. Depois com o decorrer do tempo começámos a perceber que as pessoas só queriam uns beijinhos, autógrafos e conversar.

Ainda sobre essa época. Quem teve a ideia de fazer o videoclipe do ‘Perdoa’ daquela forma?

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Nelson: [Risos] Foi a produtora. Naquela época havia vários vídeos que marcaram muito. Lembro-me de um do Ricky Martin em que ele dançava à chuva e nós tínhamos a idade e o estilo que apelava muito ao ‘sex appeal’.

Sérgio: Mas esse videoclipe tem uma história que agora é engraçada, mas na altura assustámo-nos. No dia em que o gravámos no Parque das Nações estava tanto, mas tanto calor, que uma das bailarinas desmaiou com o impacto da água que era lançada por um camião dos bombeiros.

Hoje em dia não sentem saudades das coreografias?

Sérgio: Isso foi algo que se foi perdendo com o tempo, até porque houve uma fase em que as músicas eram mais pop/rock e tínhamos banda e não dava para fazer coreografias.

Nelson: E também vais envelhecendo [risos]. Mas foi uma fase muito gira da qual nos orgulhamos muito e olhamos para isso com saudades.

Qual é a vossa música preferida?

Sérgio: Temos várias que nos marcaram, as várias fases de sucesso coincidiram com determinadas músicas.

Nelson: Para mim, a balada mais bonita que eu já cantei até hoje é a música que o Sérgio escreveu agora para a Andreia, ‘Eterno’.

Acho que era egoísta da minha parte esconder aquele dia

E foi um sucesso nas redes sociais porque as imagens do casamento foram partilhadas com o público. Porquê?

Sérgio: Tinha de partilhar aquele momento, um dos mais felizes da minha vida, com o público. Acho que era egoísta da minha parte esconder aquele dia.

Como foi escrever aquela música que é um resumo da sua história de amor com a Andreia?

Sérgio: A última vez que tinha escrito letra e música tinha sido no primeiro álbum, há 20 anos. Acho que agora foi o recuperar do meu lado mais poético.

Nelson: O engraçado é perceberes que a música é quase a história de amor de toda a gente.

Vinte anos depois sentiu-se inseguro?

Sérgio: Não é fácil. Lembro-me de que escrevi a música e depois cruzei-me com a Carolina Deslandes no estúdio e mostrei-lhe. E ela ouviu, olhou para mim e perguntou-me: ‘queres que te diga o quê? Está perfeito’. Fiquei mais descansado, mas depois achei que ia correr mal na igreja, porque não iria conseguir cantar. Aliás, no vídeo vê-se várias vezes que estou a cantar de olhos fechados, exatamente para me conseguir concentrar.

Ver o meu filho trazer a mãe ao altar foi incrível

Foi um momento muito marcante…

Sérgio: Foi! E ver o meu filho trazer a mãe ao altar foi incrível. Ter os filhos a assistir ao casamento é muito especial. E é muito engraçado porque vários casais partilharam connosco que viram o vídeo e decidiram que era o momento de também eles casarem.

E para ti, Nelson? Como foi?

Nelson: Eu próprio tive de fixar o olhar no horizonte para não chorar. Estava toda a gente a chorar, até o próprio coro gospel quando entrou começou a chorar…

A música foi escrita para a Andreia, mas agora é de todos até porque foi editada. Ela lida bem com isso?

Sérgio: Ela já está habituada [risos]. Mas há uma música que é só dela e que nunca a vou editar.

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No próximo ano arranca a tour ‘20 anos’. Estão preparados?

Nelson: Claro. O primeiro grande concerto de arranque será no Coliseu do Porto, a 23 de março.

Porquê começar a Norte?

Nelson: É uma forma de homenagear e de dar um carinho aos nossos fãs do Norte que estão sempre a queixar-se de que tudo o que acontece é sempre em Lisboa

E onde é que vai terminar?

Sérgio: Para já é surpresa, mas podemos adiantar que vai ser um espetáculo completamente diferente.