Joana Carvalho, Margarida Abrantes, Inês Fragata e Liliana Tomé foram as premiadas na 17.ª edição das Medalhas de Honra L’Oréal Portugal para as Mulheres na Ciência. Cada uma vai receber 15 mil euros.
As bolsas são copromovidas pela filial portuguesa da multinacional de cosmética L’Oréal, que financia; pela comissão nacional da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, que designa o júri que avalia as candidaturas.
Joana Carvalho (investigadora da Fundação Champalimaud) vai estudar a relação entre o cérebro e a perda de visão, enquanto Margarida Abrantes (Universidade de Coimbra) irá analisar a sensibilidade à radiação em pessoas portadoras de uma mutação genética na origem do cancro hereditário da mama e do ovário.
O trabalho de Inês Fragata (Universidade de Lisboa) pretende avaliar como a acumulação de cádmio, um metal pesado, em tomateiros afeta o ecossistema agrícola e o de Liliana Tomé (Universidade Nova de Lisboa) propõe-se desenvolver materiais mais eficientes para a captura de dióxido de carbono, por exemplo em gases de exaustão libertados em centrais de energia, e impedir que escape para a atmosfera.
As quatro investigadoras, com idades entre os 28 e os 37 anos, foram selecionadas, entre mais de 97 candidatas, por um júri presidido pelo cientista e deputado Alexandre Quintanilha.
Após a perda de visão, o que acontece à parte do cérebro responsável pela visão? Fica inativa? Vai-se dedicar ao processamento de outros sentidos ou funções cerebrais? A estas perguntas Joana Carvalho, doutorada em neurociências computacionais, quer dar respostas.
O seu projeto de investigação visa “perceber de que forma o cérebro adulto se reorganiza em resposta à perda de visão e estabelecer quais os fatores, por exemplo a exposição à luz, que facilitam esta reorganização”, explicou à Lusa, assinalando que “é inútil conseguir recuperar a função ocular se o cérebro já não conseguir processar a informação visual”.
Para Joana Carvalho, “é essencial perceber se após perda total ou parcial da visão o cérebro mantém a capacidade de processar informação visual, assim como determinar o momento ideal para a aplicação das terapias de restauração e reabilitação de visão”, como implantes de retina e olhos biónicos.
No seu trabalho, em que vai usar modelos animais de deficiência visual, a tecnologia de ressonância magnética e modelos matemáticos, a investigadora pretende, ainda, definir potenciais biomarcadores para doenças neurológicas, como Parkinson, Alzheimer, autismo e esquizofrenia.
O estudo de Margarida Abrantes, professora na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, visa “esclarecer os efeitos da radiação ionizante”, presente nas radiografias, mamografias e tomografias computorizadas, na população com risco acrescido de cancro da mama e do ovário, por apresentar uma mutação no gene BRCA2, e que é sujeita a vigilância regular através de exames de diagnóstico por imagem que implicam exposição a radiação.
O gene BRCA2 atua como um supressor de um tumor, repara danos nas células que “podem ser causados pela radiação ionizante”.
Nas pessoas com mutação neste gene, a reparação celular pode “estar comprometida” e as células “podem sofrer alterações que podem levar a carcinogénese [processo de formação de cancro]”, realçou à Lusa a investigadora e docente.
Ao caracterizar os efeitos da radiação ionizante a que os portadores da mutação no gene BRCA2 são expostos nos exames radiológicos de vigilância que realizam, Margarida Abrantes espera poder contribuir para a sua otimização.
No seu projeto, a investigadora vai irradiar amostras de sangue e analisá-las recorrendo a “diferentes metodologias de biologia celular e molecular”.
Doutorada em Biologia Evolutiva, Inês Fragata quer saber se a acumulação de cádmio, um metal pesado que “pode ser tóxico em elevadas quantidades”, em tomateiros “potencia a proliferação ou extinção de espécies de herbívoros”, como os ácaros-aranha, que comem tomate e são uma praga agrícola.
“Tal conhecimento irá ajudar na tomada de decisões sobre a utilização, ou não, de tomateiros como fito-remediadores de cádmio em solos contaminados por este metal”, afirmou à Lusa a investigadora do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais (cE3c) da Universidade de Lisboa.
A bióloga vai averiguar se duas espécies de ácaros-aranha conseguem adaptar-se à presença de cádmio em tomateiros e, se sim, quais as consequências desta adaptação, procurando “identificar genes importantes para a adaptação dos ácaros à toxicidade do cádmio”.
O cádmio nos solos deve-se, em grande parte, ao uso de fertilizantes agrícolas fosfatados. Ao ser absorvido por plantas, o metal pesado entra na cadeia alimentar, colocando riscos à saúde pública se forem excedidos os limites de consumo diários estabelecidos para a população humana.
A engenheira química Liliana Tomé espera, na fase final do seu trabalho, ter, conforme referiu à Lusa, um “pequeno protótipo de membranas” para separar e capturar, de forma eficaz e sustentável, dióxido de carbono, gás que contribui para o aquecimento global, “a partir de diferentes correntes gasosas”, como os gases de exaustão.
Estas membranas serão baseadas em materiais de líquidos iónicos.
Os líquidos iónicos “não são mais do que sais orgânicos que têm um ponto de fusão baixo (apresentam-se em estado líquido), com estruturas que podem ser recombinadas para produzir novos materiais”, esclarece em comunicado a organização das Medalhas de Honra para as Mulheres na Ciência, acrescentando que “as suas propriedades físicas, químicas e biológicas têm levado à sua crescente aplicação nos mais diversos setores, incluindo indústria farmacêutica, ótica, eletrónica e ‘química verde'”.
Instituídas em 2004, as Medalhas de Honra L’Oréal Portugal para as Mulheres na Ciência destinam-se a incentivar as cientistas em início de carreira a realizarem estudos nas áreas das ciências, engenharias e tecnologias para a saúde ou o ambiente.
A edição de 2020 apoiou, pela primeira vez, uma proposta de investigação na área das alterações climáticas.
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