Em entrevista à agência Lusa, por ocasião do Dia Internacional da Pessoa Idosa, que se assinala hoje, o fundador do Instituto do Envelhecimento disse ter partilhado o sentimento vivido por grande parte das pessoas com mais de 65 anos, consideradas um dos grupos mais vulneráveis à covid-19.

“Como membro que sou do último escalão definido pela DGS [Direção-Geral da Saúde] (80+ anos), tenho consciência que o surgimento do coronavírus foi o pior que nos poderia ter acontecido, fechando-nos em casa e obrigando-nos a tomar todo o género de cuidados que vão até ao isolamento completo”, afirmou Manuel Villaverde Cabral.

Critico em relação ao que se tem passado nos lares de idosos, o professor e investigador considerou que foi “catastrófico”, mas também “previsível”, apontando que os lares “estavam e estão impreparados para a pandemia em qualquer plano que seja, seja no plano médico, seja no psicossocial e económico”.

“O extremo envelhecimento da população portuguesa, assim como em alguns outros países, acompanha logicamente a propagação do vírus”, sustentou.

Na opinião de Manuel Villaverde Cabral, o confinamento em Portugal “teve efeitos devastadores no plano socioeconómico”, mas admitiu que tenha ajudado a conter a mortandade das pessoas com mais de 70 anos.

Ainda assim, afirmou que estas pessoas “foram, de longe, e continuarão a ser até ao dia em que se descobrir uma vacina, as grandes vítimas da covid-19”.

No que diz respeito ao confinamento, o presidente da Confederação Nacional das Instituições Particulares de Solidariedade Social (CNIS) declarou à Lusa que o mais difícil de gerir foi a solidão dos idosos, desde os que estavam nos lares que ficaram sem visitas, aos que iam aos centros de dia e que ficaram confinados em casa.

“A solidão tornou-se dura e houve casos de depressão e de desânimo (…). Para mim, o grande problema dos idosos neste tempo foi o da solidão e a solidão mata”, alertou o padre Lino Maia, garantindo que as instituições tudo fizeram para tentar apoiar os seus idosos, desde logo pelo aumento dos serviços de apoio domiciliário.

Para o presidente da CNIS, a saúde mental dos idosos não foi devidamente acautelada durante o tempo de pandemia e “houve cuidados médicos que diminuíram” quando deveriam ter aumentado.

“Defendo que existe a necessidade premente – e já vamos tarde – de olhar para estas instituições e os idosos e vê-los como cidadãos de pleno direito, com direito a cuidados de saúde, estejam eles onde estiverem”, disse Lino Maia, acrescentando que se isso já tivesse sido feito, talvez tivesse sido “evitado algum agravamento da situação da dependência, da demência”.

O presidente da União das Misericórdias Portuguesas (UMP), Manuel Lemos, reconheceu que o confinamento e o distanciamento físico, e o respetivo impacto na saúde mental dos mais idosos, foi o que mais o preocupou, mas salientou que o principal desafio era salvar vidas e que se tratou, por isso, da “lógica do mal menor”.

Para o responsável, a tónica desta discussão tem de deixar de estar centrada nos lares de idosos para passar a estar no tipo de envelhecimento que é desejado, defendendo que é preciso um “programa de construção de lares mais ‘frendly’, mais capazes e mais asséticos”, e avisando que o país tem de fazer escolhas.

“Isto exige recursos que é preciso ver se Portugal tem ou não tem e se quer fazer ou não quer”, observou, preconizando também uma maior aposta nos serviços de apoio domiciliário.

Lino Maia, por outro lado, apontou a necessidade de um repensar do envelhecimento, em que o prolongamento da vida seja acompanhado de qualidade de vida e de uma vida tanto quanto possível ativa.

“Penso que a grande aposta em relação aos idosos é considerá-los como cidadãos de pleno direito e a promoção de um envelhecimento ativo, com qualidade, intervenção e participação na comunidade”, defendeu.

Manuel Villaverde Cabral vai mais longe e destacou que os lares em Portugal “têm de ser mudados de cima abaixo” e que “é, efetivamente, indispensável repensar as estruturas físicas, profissionais e financeiras dos lares”.

A par disso, sugeriu uma “revisão radical do sistema de reformas”, que neste momento “não só ‘come’ 15% do Orçamento do Estado português, como é profundamente desigual e cheio de ‘subsídios’, ‘remendos’ e ‘outras exceções’ de toda a espécie”.