“Os inspetores [da Inspeção-Geral dos Assuntos Sociais, IGAS, organismo francês] acreditam que a responsabilidade do laboratório Bial e da Biotrial está envolvida a vários títulos”, disse esta segunda-feira a governante francesa, Marisol Touraine, numa conferência de imprensa.

Na sua declaração, a ministra da Saúde afirmou que “quatro meses após o acidente dramático em Rennes, o relatório da IGAS permite estabelecer as responsabilidades e identificar as falhas que conduziram a este acontecimento”.

A 17 de janeiro, Guillaume Molinet, de 49 anos, morreu durante um ensaio clínico realizado em Rennes pela empresa especializada Biotrial, enquanto testava uma molécula que atuava sobre o sistema nervoso para o laboratório português Bial.

Outros cinco voluntários tiveram também de ser hospitalizados, e alguns deles apresentam ainda sequelas neurológicas decorrentes dos testes com aquela substância que tinham sido validados pela Agência Nacional de Segurança do Medicamento (ANSM).

Segundo a ministra, a responsabilidade passa pela escolha da molécula BIA 10-2474, administrada aos voluntários. Depois, salientou, “trata-se no atraso da informação às autoridades sanitárias”.

“A gravidade dos acontecimentos é um facto novo suscetível de comprometer a segurança dos voluntários”, disse a governante, que sublinhou que este acidente “deveria ter sido imediatamente comunicado” à ANSM.

Falta de ação

No entanto, referiu, “os laboratórios apenas realizaram uma declaração formal na quinta-feira, dia 14 de janeiro, quatro dias após a hospitalização do primeiro voluntário, e três dias após a decisão de suspender o ensaio”.

“A responsabilidade científica e ética do laboratório Bial está em causa quanto ao seu dever de prosseguir as investigações sobre a compreensão do acidente”, destacou Marisol Touraine, que acrescentou que a Biotrial é responsabilizada pela “condução do estudo e gestão da crise”.

A investigação apontou a ausência de procura de informações em tempo útil, pelo laboratório, sobre o estado de saúde do primeiro voluntário hospitalizado e não suspendeu a administração do produto aos restantes voluntários.

Outra “falha grave” apontada pelos inspetores é o facto de os voluntários não terem sido formalmente informados pelo laboratório sobre o acidente.

A inspeção formulou 19 recomendações para compreender as causas deste acidente e reconsiderar o quadro de proteção dos voluntários que participam em ensaios clínicos, e que a ministra anunciou aceitar na sua totalidade.

“Exijo que a Biotrial forneça um plano de ação que garanta que as falhas graves observadas não se repitam”, disse Touraine, que deu o prazo de um mês para que a empresa entregue este documento, sob pena de perder a licença para funcionar.

Por outro lado, a ministra ordenou que os 90 dossiês dos voluntários saudáveis sejam objeto de uma avaliação independente.

Outras medidas hoje anunciadas incluem o reforço das condições de autorização dos ensaios clínicos, em particular de administração nas pessoas, bem como das avaliações realizadas pela agência nacional especializada, e ainda alterações legislativas que passem a considerar que os testes que envolvam seres humanos sejam automaticamente considerados de alto risco.

Por fim, a ministra da Saúde anunciou que vai prosseguir o seu trabalho com a Comissão Europeia e afirmou ter sensibilizado o comissário europeu da Saúde, Vytenis Andryukatis, para a necessidade de promover uma reflexão para reforçar a proteção dos voluntários saudáveis em testes clínicos, adiantando que foram criados dois grupos de trabalho no âmbito da Agência Europeia de Medicamentos para esta finalidade.

Marisol Touraine recordou que está em curso um procedimento judicial sobre este acidente, o mais grave ocorrido na Europa no âmbito de um ensaio clínico.