“É um disparate. O Ministério da Saúde já tem muitas instituições dependentes dele para a gestão global do SNS, seja os cuidados de saúde primários ou nos hospitais”, disse à Lusa Miguel Guimarães, exemplificando: “tem a Administração Central dos Serviços de Saúde (ACSS), que por sua vez tem o conselho nacional do internato medico; tem a DGS [Direção Geral da Saúde]; tem os SPMS [Serviços Partilhados do Ministério da Saúde] (…) e tem as administrações regionais de saúde”.
Para o bastonário, o Ministério da saúde tem “muitas estrutura dependentes, que têm capacidade para aquilo que é a direção executiva do SNS”.
A criação de uma direção executiva para gestão do SNS, assim como a dedicação plena aplicada progressivamente aos médicos, constam do novo Estatuto do Serviço Nacional de Saúde (SNS), aprovado na quinta-feira em Conselho de Ministros.
“Numa altura em que hospitais e ACES [Agrupamentos de Centros de Saúde] deram uma demonstração da sua capacidade individual de resposta, com a pandemia, através autonomia que tiveram em várias áreas (…) vimos criar aqui uma direção executiva para o SNS que não vejo para o que é que serve dentro deste contexto global”, acrescentou.
Segundo Miguel Guimarães, esta autonomia, “que permitiu dar uma boa resposta à pandemia”, e a capacidade de gestão de recursos que hospitais e ACES tiveram “foi uma das facetas mais importantes na resposta positiva que demos à pandemia”.
“Numa altura em que as coordenações destes hospitais e ao ACES deram uma resposta positiva, agora, em vez de termos respostas que dependessem diretamente das grandes unidades de saúde, que estivessem articuladas a nível regional e a nível nacional, vimos criar aqui uma direção executiva para o SNS, que não vejo para o que é que serve dentro deste contexto global”, referiu.
O responsável considera que a criação desta direção executiva para gestão do SNS vai retirar autonomia às unidades hospitalares e aos ACES: “isto numa altura em que todos nós, inclusive os gestores da área da saúde, defendemos uma autonomia maior e mais flexibilidade para tomar decisões, para contratar pessoas e comprar equipamentos, claro que conjugado com um orçamento adequado”.
“É mais fácil um hospital contratar recursos humano do que ser o Estado através do SNS”, acrescentou.
Miguel Guimarães sublinhou: “nada disto resolve os problemas do SNS, nem das pessoas que fazem o SNS todos os dias. São subterfúgios para aquilo que são as reações dos profissionais de saúde”.
“O que precisamos é de transformar o SNS, não vamos conseguir um SNS robusto, moderno, um SNS que responda de forma mais eficaz e em tempo útil àquilo que são as necessidades dos portugueses, se não tivermos um SNS competitivo”, insistiu.
Defendeu que o SNS “não pode funcionar como há 42 anos atrás” e que “tem de estar adaptado às novas realidades”.
“Os profissionais circulam livremente [sem fronteiras] o SNS tem de ter capacidade concorrencial com o setor privado e com o estrangeiro”.
Do estatuto do SNS aprovado na quinta-feira faz igualmente parte o regime de dedicação plena, que se iniciará pelos trabalhadores médicos do SNS, numa base voluntária para alguns e numa base obrigatória para outros.
Sobre este regime, o bastonário da Ordem dos Médicos criticou o facto de não ter havido diálogo prévio com os profissionais e disse não compreender porque não se recupera o antigo regime de dedicação exclusiva opcional.
“Sabemos através da comunicação social, ao mesmo tempo de todos os portugueses, que o Governo, não se percebe bem porquê, decide criar uma coisa que se chama dedicação plena. Presumimos que seja regime de trabalho, e não percebemos, neste contexto, se querem atrair profissionais para o SNS, porque é que não vão buscar atrás aquilo que é a dedicação exclusiva opcional”, afirmou.
“Se o objetivo é melhorar a capacidade de resposta e tentar colmatar as deficiências de capital humano que existem no SNS, porque é que o Estado vem pomposamente anunciar uma coisa que é a dedicação plena, que ninguém sabe o que é”, acrescentou.
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