“A questão do isolamento e da solidão dos idosos é de si já um problema grave na nossa sociedade. Neste momento vai atingir pontos críticos que de certeza vão ter consequências a nível de doença mental, de agravamento de alterações no humor, depressão, ansiedade”, disse hoje à agência Lusa o vice-presidente da União das Misericórdias Portuguesas (UMP), Manuel Caldas de Almeida.

Para minimizar o impacto da suspensão das visitas, a UMP montou “na maioria dos lares sistemas para que os idosos possam por ‘skype’ ou ‘WhatsApp’, mas com écrans grandes, poderem falar com os seus familiares não só pelo telefone, mas vendo a pessoa e tentar através disto diminuir um bocadinho a solidão e as saudades que têm dos familiares”, adiantou o geriatra.

“Pensamos que isto poderá parcialmente resolver a situação ou pelo menos amenizá-la durante algum tempo”, sustentou.

Relativamente aos idosos que vivem sozinhos e sem sintomas, as Misericórdias têm os serviços de apoio domiciliário que estão a tentar manter e desenvolver.

Para quem tem sintomas, estão a tentar montar um sistema logístico para levar alimentos, medicamentos, avançou Caldas de Almeida.

Alguns idosos não compreendem porque deixaram de receber visitas, uma situação que lhes deve ser explicada com “as orientações muito claras” de Direção-Geral da Saúde e da Organização Mundial de Saúde.

Os filhos, por exemplo, podem explicar aos pais que estão “impedidos de fazer certas coisas por obrigação legal” e por orientações das autoridades de saúde, explicou.

O mesmo se passa com quem está internado nos hospitais. “Eu sou responsável por um hospital geriátrico, onde estão pessoas idosas internadas, e tenho sentido uma enorme compreensão das pessoas”, contou Caldas de Almeida.

“É evidente que lhes custa, que lhes dói, mas as pessoas percebem que estamos numa situação de perigo e estamos a fazer isto pela sua própria segurança”, sublinhou o geriatra, aconselhando as pessoas que têm possibilidade para usar as novas tecnologias para matar a saudade.

O presidente do Conselho Nacional de Saúde Mental, António Leuschner, também destaca a importância das novas tecnologias para atenuar a solidão, mas adverte que “a população mais velha ainda tem um baixo nível de infoliteracia”.

“Não vamos esperar que todos adiram a isso”, disse o psiquiatra, advertindo que “é muito importante” a sociedade estar atenta aos idosos: “estamos a falar de 20% da população”, muitos deles já reformados, “com redes sociais muito empobrecidas e que, nesta situação, estão mais facilmente abandonáveis”.

Para António Leuschner, vive-se uma situação de “difícil decisão”: “Por um lado, há uma necessidade de os proteger, por outro lado há o risco de os abandonar”.

“Portanto, como é que vamos sair disto? Vamos naturalmente ter de encontrar compromissos, não abandonando as pessoas, garantindo que, por exemplo, as que vivem em instituições não são deixadas para trás, no sentido de não haver sobre elas um investimento que infelizmente às vezes acontece mesmo em situações sem ser de crise pandémica”, vincou.

Por outro lado, é preciso garantir que essas pessoas não estejam sujeitas a um risco de contágio maior do que aquele que será desejado em pessoas frágeis.

“Se o risco de contágio é muito dependente da proximidade social e as recomendações que são feitas é diminuir os contactos sociais nós não podemos transformar isso numa palavra de ordem para o isolamento, para a solidão”, que acarretam a depressão e em algumas situações acentua a curva do declínio que muitas vezes leva à demência, advertiu.

Por isso, defendeu, as pessoas mais velhas que estejam em condições de estar fora de instituições devem quando possível manter-se nas suas casas, mas isto vai exigir um esforço acrescido das respostas.

“Temos que acentuar o interesse e o empenho em manter essas pessoas vivas, com vontade de viver, com bem-estar social”, disse, defendendo uma partilha de responsabilidade entre os setores da saúde e social na prestação de cuidados nos domicílios, nos lares e outras instituições.

“Temos que evitar que esta guerra que estamos envolvidos com o coronavírus dê azo a mais vítimas e que, com as nossas atitudes não muito pensadas, possamos causar alguns danos colaterais”.

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