“O ponto onde as pessoas que estudam a desinformação mais tendem a discordar é se precisamos ou não de uma regulação mais forte”, sublinhou a cientista, que, embora reconheça a existência de “muitas preocupações relacionadas com a censura e com limites para a partilha de dados”, defende a atualização da legislação, tal como aconteceu nas revoluções industriais.
Intervindo no seminário “Ameaças Híbridas, incluindo Desinformação", organizado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros e pelo Serviço de Informações de Segurança (SIS), Joana Gomes de Sá considerou que “sem a regulação, provavelmente ainda existiria trabalho infantil”, pelo que é necessário compreender que a sociedade está perante “uma nova revolução e que a legislação deve ser atualizada”.
Para a cientista, o combate à desinformação não passa por “largar completamente estas ferramentas”, como as redes sociais, mas pela utilização “de forma ética” das mesmas, tendo em conta que não são os robôs destas tecnologias que partilham informação, mas sim os seres humanos, “que têm preferência pela desinformação”.
“Quanto mais surpreendentes forem os títulos das notícias, maior será o número de partilhas” nas redes sociais, apontou a investigadora considerando que esta é “uma característica humana”, tendo em conta vários estudos que têm vindo a ser publicados com base na dimensão demográfica das pessoas que partilham desinformação.
No seu estudo, a investigadora do Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC) aposta numa “abordagem mais conceptual”, segundo a qual se chegou à conclusão de que as pessoas têm tendência a “maximizar a confiança” no seu conhecimento no sentido de “tentar ter menos incertezas” na sua vida.
“Nós subestimamos o quanto sabemos na verdade e esta confiança é possivelmente a razão que leva alguém ao Twitter em vez de ir procurar por coronavírus na ‘Wikipedia’, porque entende que o seu nível de conhecimento sobre o assunto não é suficiente”, explicou, a título de exemplo.
Embora reconheça que “a desinformação não é um fenómeno novo”, dado que “sempre existiram mentiras com propósitos políticos ou comerciais”, a verdade é que “a revolução digital está a torná-la mais perigosa”, sobretudo devido aos algoritmos.
Utilizando a ferramenta de pesquisa do Google como exemplo, a cientista explicou que as pessoas estão a “perguntar ao Google coisas que perguntariam aos amigos mais próximos ou mesmo à família”.
“Estamos a partilhar imensa informação sobre os nossos medos, as nossas preocupações, sobre os nossos interesses, e que é informação muito sensível que nos expõe aos algoritmos, que selecionam depois o que queremos ver a seguir”, explicou, daí que seja necessário, na sua perspetiva, recorrer a uma regulação mais forte para combater a desinformação.
Já Francisco Goiana e Francisco de Abreu Duarte, ambos conselheiros da Organização Mundial de Saúde, consideram que a solução passa por “estabelecer um diálogo entre governos, indústria civil e sociedade civil” para combater, sobretudo, a desinformação de saúde.
A União Europeia (UE) “está a fazer um trabalho fantástico” neste domínio, salientou Francisco de Abreu Duarte, especialista em Direito, apontando, a título de exemplo, o plano de ação que considera “muito interessante” sobre o combate à desinformação online lançado em 2018, a criação do Observatório Social para a Desinformação e Análise das Redes Sociais e, mais recentemente, a Lei dos Serviços Digitais e a Lei dos Mercados Digitais, que preveem a proteção dos utilizadores de plataformas online.
O seminário virtual “Ameaças Híbridas, incluindo Desinformação", organizado no âmbito da presidência portuguesa do Conselho da UE, tem como objetivo encorajar a reflexão em torno da temática da desinformação, da sua influência sobre as sociedades democráticas, das formas de combate a esta ameaça e dos métodos para a sua deteção e mitigação.
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