A importância de se acabar com a velha estrutura vertical das organizações de Saúde em Portugal torna-se cada vez mais evidente à medida que evoluímos como país. Em Portugal, a classe médica é sempre colocada no topo das decisões, no quadro de uma profunda e antiquada forma de estar da nossa sociedade, em que se tem mantido como principal decisora sobre a Saúde dos portugueses.
No entanto, o que tem prevalecido é a ideia biomédica, que dá a responsabilidade somente a esta classe, colocando outras, incluindo a enfermagem, numa posição inferior em processos de decisão. Seria assim tão estranho que um enfermeiro pudesse assumir a presidência de organismos como a Direção-Geral de Saúde, um conselho de administração ou mesmo um cargo que implique responsabilidade política, como secretário de Estado ou ministro?
É mais que sabido que, de forma geral, os enfermeiros são excluídos dos cargos que envolvem processos de decisão das grandes instituições com produção de resultados. Os seus cargos são, de forma geral, meramente consultivos e sem qualquer poder vinculativo. Neste ponto torna-se difícil perceber que uma profissão com elevada formação, com cada vez mais enfermeiros peritos em diversas áreas, desde a supervisão clínica à economia da Saúde, à gestão e administração de instituições, alguns já doutorados, aliados à sua experiência enquanto profissão que lida de mais perto e por mais tempo com o foco na Saúde das pessoas, sejam desta forma desaproveitados pelas diversas instâncias políticas.
Para que esse desejável aproveitamento surja é necessário um processo evolutivo, uma espécie de rutura com o passado, que aposte numa cooperação em igualdade de circunstâncias com outras classes, de entre as quais a médica, mas não só, também com farmacêuticos, psicólogos, técnicos e outros.
Todos, sem exceção, devem enquadrar-se numa plataforma horizontal e verdadeiramente democrática que pense a Saúde em prol da melhoria dos resultados que verdadeiramente queremos para Portugal. Os estudos existem e comprovam que incluir a enfermagem em lugares de decisão potencia melhores resultados no âmbito da Saúde. Como diz o relatório do ICN (International Council of Nurses), é fundamental promover e investir numa cultura equitativa que respeite a profissão de enfermagem como contribuinte principal para sistemas de Saúde de alta qualidade.
Para terminar, não poderia deixar de referir que a introdução de enfermeiros no topo dos centros de decisão, garantidamente traria uma relação custo/benefício que facilmente seria comprovada. Porque os enfermeiros dominam as ferramentas, conhecem a fundo as necessidades da população e têm contacto direto com a mesma 24h sobre 24h. Entre outros, são fatores que fazem deles profissionais de eleição para o presente e futuro da Saúde em Portugal, num processo horizontal, deixando para os anais da história o velho e antiquado modelo estratificado em pirâmide.
Todas as classes convenientemente encaixadas, nos lugares devidos, desempenhando funções idênticas, em igualdade de circunstâncias, como as peças de um puzzle, poderiam ser o mote para que o resultado final fosse um SNS mais robusto e direcionado às verdadeiras necessidades da população, aproveitando na íntegra o manancial de conhecimento de todos os profissionais de Saúde, para todos os cidadãos.
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