Quando o meu filho, aos cinco meses e meio, foi internado nos cuidados intensivos por uma convulsão prolongada lembro-me de ter pensado - oxalá seja só uma epilepsia... Era de facto uma epilepsia, mas não como eu esperava…
A epilepsia é relativamente frequente em crianças e jovens sendo, em geral, uma situação benigna e, na maior parte dos casos, transitória. Ao contrário da maioria das epilepsias, a Síndrome de Dravet é uma doença extremamente grave, que obriga a múltiplos internamentos hospitalares para controlo das crises e de outras intercorrências, limita significativamente o desenvolvimento psicomotor das crianças afetadas e condiciona um elevado risco de mortalidade durante a infância e a adolescência.
Foi descrita pela primeira vez por uma neuropediatra francesa, Charlotte Dravet, há exatamente 40 anos mas, por ser uma doença rara, é ainda pouco conhecida tanto pela sociedade como pela comunidade médica e científica. Por este motivo, muitos casos continuam a ser diagnosticados demasiado tarde, sendo deste modo privados de acesso ao tratamento e cuidados mais adequados.
A Síndrome de Dravet resulta de uma mutação genética que afeta a capacidade de regulação da atividade eléctrica do cérebro. Na maior parte dos casos é uma mutação de novo – isto significa que ocorre apenas na criança que tem a doença, não se observando habitualmente nos pais e irmãos.
As limitações e o risco de mortalidade
Ao contrário da maioria das epilepsias, a Síndrome de Dravet é uma doença extremamente grave, que obriga a múltiplos internamentos hospitalares para controlo das crises e de outras intercorrências, limita significativamente o desenvolvimento psicomotor das crianças afetadas e condiciona um elevado risco de mortalidade durante a infância e a adolescência.
As crises epiléticas surgem logo nos primeiros meses de vida da criança e podem ser de diversos tipos, sendo mais graves e alarmantes as convulsões tónico-clónicas generalizadas, que podem ser prolongadas (estado de mal) constituindo uma emergência médica. Ocorrem de forma súbita e com uma frequência variável, podendo chegar a várias por dia! A febre, o calor, luzes ou ruídos fortes, o cansaço, a excitação… todos estes fatores podem desencadear uma crise, mas muitas vezes ela surge de forma inesperada e sem que se perceba o motivo, o que gera uma permanente ansiedade e insegurança nas famílias.
O desenvolvimento inicial destas crianças aparenta ser normal mas, mais tarde ou mais cedo, ao longo dos primeiros anos de vida, começa a tornar-se evidente um défice progressivo tanto ao nível do desenvolvimento cognitivo como da motricidade. Apresentam também algumas alterações do comportamento como hiperatividade, distúrbios alimentares ou do sono, comportamentos de oposição e algumas características semelhantes às do autismo.
São frequentes outros problemas de saúde, entre os quais, patologia musculo-esquelética (com impacto adicional sobre a motricidade) e elevada susceptibilidade para infeções que, quando graves, podem ser fatais. Estudos recentes alertam ainda para a possibilidade de arritmias cardíacas que poderão estar subjacentes ao evento mais devastador, a morte súbita inesperada (SUDEP), que ocorre com uma frequência anormalmente elevada nas crianças com Síndrome de Dravet.
Faltam fármacos e mais investigação
Não dispomos ainda de fármacos suficientemente eficazes para o tratamento desta doença e a maioria dos doentes necessita de associações de vários medicamentos (dois, três ou mais) para obter um controlo das crises minimamente aceitável. Estão em curso alguns ensaios clínicos de novos fármacos, cujos resultados aguardamos ansiosamente. A maior esperança, embora mais remota, vem dos estudos que estão a ser desenvolvidos por vários grupos de investigadores no sentido de conseguir chegar a uma terapia genética que permita corrigir ou, pelo menos, atenuar o défice genético que está subjacente à doença.
Sendo uma doença rara, nunca é demais salientar o papel crucial desempenhado pelas associações de famílias do mundo inteiro que, em rede, se têm mobilizado para apoiar, dinamizar e mesmo financiar muita da investigação que tem vindo a ser feita. Sem elas, o conhecimento sobre esta doença estaria seguramente menos desenvolvido. As associações funcionam também como uma importantíssima comunidade de apoio, solidariedade e partilha entre famílias.
A associação de famílias Dravet Portugal, tem apenas três anos de existência formal mas, além da organização de encontros regulares entre as famílias, já levou a cabo numerosas ações de divulgação desta doença para a sociedade em geral e também para a comunidade médica, angariou apoios para a investigação científica e é membro da Dravet Syndrome European Federation (DSEF) em cujos projetos tem colaborado ativamente.
A vida com Síndrome de Dravet é sem dúvida muito difícil, mas a pertença a esta comunidade de famílias tornou o nosso caminho mais fácil e deu-lhe um novo sentido!
Mais informações em: www.dravet.pt | geral@dravet.pt | 211 367 105
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