Entre julho de 2017 e outubro de 2020, 180 crianças e jovens do Porto e Vila Nova de Gaia em risco de serem institucionalizados foram acompanhados pelo Projecto Família, um programa de apoio às famílias com crianças e jovens em risco com vista à preservação familiar.
A negligência parental é o principal motivo pela qual as crianças são retiradas das suas famílias. Porque esta deve ser uma medida de último recurso, foi implementado, em 1996, o Projecto Família, desenvolvido pelo Movimento de Defesa da Vida (MDV) com base no modelo americano Homebuilders, que pretende evitar a institucionalização desnecessária de crianças e jovens.
Carmelita Dinis, diretora executiva do MDV explica o projeto: “Tentamos reduzir os fatores que possam colocar em risco estas crianças e jovens, envolvendo toda a família na resolução de problemas...”. Com este método, a percentagem de crianças que permanece em casa e em segurança está sempre acima dos 70%, segundo Mariana Mira Delgado, diretora financeira do MDV.
Em 2017, o projeto foi financiado por um Título de Impacto Social (TIS); uma ferramenta da Estrutura de Missão Portugal Inovação Social que envolve parceiros públicos e privados para financiar projetos inovadores em áreas prioritárias de política pública, mediante a obtenção de resultados sociais mensuráveis.
O TIS foi financiado pela Fundação Calouste Gulbenkian e pelo Banco Montepio no valor de 433.276,00 euros, o que permitiu a implementação do projeto durante três anos, com efeitos positivos monitorizados pela MAZE, a empresa de investimento de impacto com atuação no desenho de serviços públicos e gestão de Títulos de Impacto Social. No final de três anos, 163 das 180 crianças e jovens em risco permaneceram em seio familiar, mais 55 crianças do que o inicialmente acordado com os investidores, ao abrigo do TIS.
Com o investimento e monitorização através do TIS, foi potenciado o sucesso do Projeto Família®, que passou de uma taxa de sucesso de 70% para 91%
No conjunto das crianças envolvidas no projeto havia situações de risco associadas à negligência parental, conflitos familiares e problemas de comportamento dos filhos. A sinalização destas crianças e jovens foi feita por parte das Comissões de Proteção das Crianças e Jovens (CPCJs), tribunais ou Equipas Multidisciplinares de Apoio Técnico aos Tribunais (EMATs).
Para as famílias encaminhadas para o projeto, a participação é voluntária. A intervenção inicia-se com seis semanas de apoio intensivo à família. A fase intensiva divide-se em três partes: estabelecimento de relação de confiança e identificação de problemáticas; definição e validação de competências a desenvolver por cada membro, ajudando a organizar tarefas e rotinas, criando estratégias para momentos de crise ou conflito presentes e futuros; desenvolvimento de competências e preparação para a autonomia.
Os técnicos ajudam a estabelecer redes de suporte e apoio, que passam pela identificação de ajudas estatais ou de outro tipo, como seja a procura de emprego, apoio em termos de especialidade médica, entre outros. Após as seis semanas, o acompanhamento passa a ser feito de forma mais esporádica: no mês seguinte, três meses depois, seis e ao fim de doze meses da primeira intervenção.
Após a intervenção e no final do acompanhamento no âmbito do TIS, concluiu-se que 163 das 180 crianças, tinham condições para continuar no seio familiar, numa avaliação feita pelas CPCJs e EMATs.
“Um resultado surpreendente que só foi possível pela monitorização do projeto. Uma característica chave do Título de Impacto Social é o nível de proximidade dentro da parceria, quer entre a MAZE e a entidade implementadora - o MDV, quer com os investidores. Ao longo dos três anos recolhemos regularmente feedback de todas as famílias com quem o projeto trabalhou e fomos percebendo o que funcionava e onde havia espaço para melhorar. O facto de estarmos a medir o sucesso do projeto com tanta atenção, com foco na preservação familiar, garantiu que as aprendizagens iam sendo integradas e que fazíamos os ajustes necessários para garantir essa definição de sucesso que tínhamos em mente.” esclarece Margarida Anselmo, Head of Government Performance da MAZE.
As aprendizagens do programa
O TIS terminou em outubro de 2020, quando os últimos resultados foram recolhidos. As entidades sinalizadoras sublinham a importância desta resposta na região. “É uma intervenção que complementa as outras e é um instrumento a que recorremos com muita segurança para evitar a retirada das crianças, com resultados tão positivos. Não há nenhuma intervenção, neste momento no Porto, que substitua este trabalho.” referiu o Juiz Nuno Melo, do Tribunal de Família do Porto.
O Instituto de Segurança Social integrou a parceria deste projeto, com o objetivo de identificar aprendizagens que possam ser adaptadas para as respostas sociais existentes. Catarina Marcelino, a Vice-presidente do Instituto de Segurança Social frisa: “O Instituto de Segurança Social (ISS, IP) é parceiro do Projeto Família, tendo aceite a sua metodologia de intervenção. O modelo deste Projeto caracteriza-se pela preservação das famílias em segurança e por garantir o direito que todas as crianças têm em viver com a sua família, o que vai de encontro aos apoios sociais e programas do ISS, IP. É também de sublinhar o cariz inovador deste programa, que permite um apoio intensivo, imediato e individualizado junto das famílias e das crianças. Este Projeto vem na linha do Programa de Acolhimento Familiar de Crianças Jovens, que no âmbito da legislação em vigor, promove o acolhimento num meio familiar estável de crianças até aos 18 anos, com prioridade para as crianças até aos 6 anos. Este Programa visa garantir a estas crianças o acesso a afeto, bem-estar e a um pleno desenvolvimento.”
De momento, o MDV tem por objetivo formar equipas de serviços de proximidade na metodologia do Projeto Família®. Desta forma, as equipas de outras organizações existentes no terreno podem aplicar as aprendizagens e o modelo de sucesso que foi implementado no Porto, desde 2017.
Carmelita Dinis garante que “Uma metodologia semelhante à que foi utilizada no TIS, adaptada ao financiamento disponível em cada região, está a ser utilizada pelo MDV no distrito de Lisboa, nos concelhos de Almada, Seixal e Gondomar. A continuidade do Projeto Família® na zona do Porto é o nosso próximo foco e estamos a trabalhar com os parceiros nesse sentido.”
O MDV, no âmbito do Projeto Família, compreende técnicos formados em ciências sociais e humanas, e com formação específica na metodologia utilizada.
O Projeto Família foi investido em 433.276,00 euros pela Fundação Calouste Gulbenkian e pelo Banco Montepio, no âmbito de um Título de Impacto Social, processo esse gerido pela MAZE.
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