É verdade que a "Treta" durou 12 anos?
José Pedro Gomes (J.P.G.) - Sim. Confirma-se.
A vossa relação profissional dura mais do que muitos casamentos, não é verdade?
António Feio (A.F.) - No nosso caso é. Com algumas grandes vantagens: não temos que dormir juntos! (risos...)
Que balanço fazem destes seis meses em que estiveram em digressão com "A Verdadeira Treta"?
A.F. - Acho que o dado mais importante é que, comparativamente com a digressão que fizemos o ano passado com os Monty Python, há mais salas disponíveis. Salas recuperadas, em óptimo estado. Isso é muito gratificante para nós, saber que hoje em dia já se pode andar pelo país fora a fazer teatro em salas com condições tão boas como aquelas que temos por Lisboa.
Pelas cidades por onde passaram, tiveram sempre casa cheia?
A.F. - Casa cheia sempre, e na maior parte dos sítios com grande antecedência. Não sentimos a crise. As pessoas não deixaram de ir ao teatro por não terem dinheiro. O facto mais importante foi mesmo termos passado por imensas salas super-bem equipadas e com programações regulares.
As gargalhadas do público variam muito em função das regiões?
J.P.G. - São quase sempre nos mesmos sítios dos diálogos, mas variam de intensidade. Aqui em Lisboa, por exemplo, o público foi muito simpático, desta vez. Às vezes nós também não estamos muito inspirados neste ou naquele bocado do texto. Podemos dizer que as reacções são idênticas no país todo.
Em cada espectáculo introduziram novas "tretas"?
J.P.G. - Sim, claro. Estamos sempre a improvisar.
A.F. - Não pensamos muito nas coisas. As palavras saem. Hoje, no espectáculo final, brinquei com a Floribela (Luciana Abreu). De repente passo numa banca de jornais e vejo-a numa capa com um "nenuco " de origem africana ao colo a dizer que quer ter filhos. Bem, é ridículo! Só dá para reinar! Mas tudo o que seja deste género dá para brincar...
J.P.G. - Eu nem tinha visto isso. É mesmo ridículo... (risos).
Estes seis meses de digressão tiveram um sabor especial, por causa da doença do António?
A.F. - O mais complicado foi pensar que poderia ter de deixar o trabalho a meio, até porque de alguma maneira o Zé Pedro ficava pendurado. Cheguei a pensar que, se calhar, não iria poder fazer isto. Mas conjuguei tudo com a equipa médica, com os tratamentos e com a produção. Só falhámos dois espectáculos, o que foi muito bom. Eu não queria vir para o palco sem "power" e tinha receio que os tratamentos me deitassem abaixo. Eu impus essa condição: se não estivesse operacional não subia o palco.
Depois de "A Verdadeira Treta" o que se segue?
A.F. - A seguir vamos fazer outro espectáculo. O Zé Pedro como actor e eu como encenador. Será uma peça também neste universo de humor em que vamos falar dos portugueses e de Portugal. Pedimos a alguns humoristas e cronistas para escreverem textos sobre isto do que é ser português.
Regressar ao teatro como encenador não vai ocupar demasiado o António numa altura difícil da sua vida?
A.F. - Penso que não. Dentro de 15 dias vou fazer novos exames para ver como estou depois destes últimos tratamentos. O máximo que pode acontecer é eu ser operado e isso é o mais desejável. É o grande objectivo. Se isso for prioritário, irei passar a bola a outro e o Zé Pedro vai ter que se desenrascar... (risos).
Depois dessa operação vai ter que ficar em repouso?
A.F. - Não faço a mínima ideia. O exemplo que eu tenho é o da minha irmã, que viveu um caso idêntico ao meu. Foi operada e a recuperação demorou algum tempo até estar aí fresca que nem um bacalhau!
J.P.G. - Ela está mais fresca do que isso. O bacalhau é seco, por isso não é a melhor imagem, António ... (risos).
A.F. - Sim, está bem, então um bacalhau antes de estar seco. Ela está óptima, isso é que importa.
O Zé Pedro será a pessoa indicada para nos dizer: o António está com a mesma garra ao fim destes meses de espectáculo?
J.P.G. - Está a cem por cento. Com a mesma garra e com o humor de sempre. A prova disso foi este último espectáculo que fizemos.
A.F. - Houve espectáculos complicados, porque senti algumas dores e foi desagradável. Tive que tomar alguns medicamentos para as dores. Mas foram só meia-dúzia de espectáculos. Neste momento a única coisa de que me posso queixar é de estar mais magro, de resto continuo com a mesma boa disposição.
J.P.G. - Anda toda a gente a querer emagrecer e ele queixa-se de que está mais magro! (risos...)
Como é que consegue encarar a vida com humor perante esta fase complicada da sua vida?
A.F. - Faz parte da minha maneira de ser, não há alternativa. Sei que é extremamente violento e eu contactei com alguns doentes que me disseram "eu não aguento mais isto e vou desistir". Eu ficava sem saber o que lhes dizer... Mas sou muito realista, muito terra-a-terra, e se há um problema, embora resolvê-lo!
Como correram os últimos tratamentos?
A.F. - Acabei os tratamentos há duas ou três semanas. O que aconteceu foi que fiz o primeiro tratamento de quimio, mas não foi o suficiente para ser operado. Por isso partimos para uma segunda fase mais agressiva com radioterapia e quimioterapia. Depois disto temos que deixar passar algum tempo. Se fizesse exames agora os resultados não seriam rigorosos. Devo esperar, para o próprio corpo recuperar da violência.
J.P.G - Os tratamentos foram quimio, rádio e agora... televisão!
Zé Pedro, o seu apoio tem sido fundamental. Como amigo e companheiro de trabalho também não pode ir-se abaixo...
J.P.G. - Eu não me vou abaixo, quem pode ir abaixo é ele... (risos).
A.F. - Exacto!
Então, e para quando é a estreia da nova peça?
A.F. - A estreia será para lá para Outubro, mas ainda não temos nome.
J.P.G. - O António já tem a data marcada e eu ainda nem sei o que é... Sabemos que vamos estrear mas ainda nem sabemos bem o quê.
A.F. - Vamos começar a trabalhar lá para 20 de Agosto e quero estrear em 20 de Outubro. São apenas dois meses de trabalho!
Em Portugal há sempre motivo para "treta"?
J.P.G. - Nós vamos fazer treta até andarmos com um andarilho cada um!(Entrevista: Joana Côrte-Real)
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