Escreveu este livro ("As Últimas Horas de Carlos Castro") com que objectivo?

Quero mostrar a vertente humana do Carlos, quem ele era verdadeiramente e recordar o que foi a nossa amizade ao longo dos últimos 15 anos.Qual foi a última vez que esteve com Carlos Castro?

Na véspera da partida dele e do Renato para Nova Iorque, em Dezembro do ano passado. Penso tantas vezes nisso... Afinal acompanhei-o em inúmeras viagens e logo nesta não fui. Se tivesse viajado com eles, teria certamente evitado a tragédia.Quando decidiu escrever o livro?

Foi pensado na viagem que eu fiz com as irmãs do Carlos, Amélia e Fernanda, a Nova Iorque para cumprir a sua última vontade: espalhar as cinzas na Broadway. Mas foi definitivamente decidido quando cheguei e Lisboa e li tantas mentiras na imprensa. Foi escrito em Janeiro, mas só agora foi possível editá-lo.O livro começa, precisamente, com a transcrição dessa vontade de Carlos Castro...

Sim. ‘Já não sei gritar palavras, porque me sinto amordaçado, porque sinto que estou a chegar ao fim... Aos que me amam de verdade peço: quando morrer quero ser cremado, as minhas cinzas atiradas pelas ruas da Broadway, em Nova Iorque. E não me perguntem porquê.' Foi esta a sua última vontade deixada escrita no seu livro, ‘Solidão Povoada', editado em 2007. Eu e as irmãs tornámos possível esse desejo.Não receia que as pessoas pensem que está a aproveitar-se financeiramente da situação?

As pessoas podem pensar o que quiserem, mas, no que me diz respeito, posso garantir-lhe que tudo o que fiz e continuo a fazer pelo Carlos é em nome de uma grande amizade que durou mais de 15 anos. O meu principal objectivo é repor a verdade!O Carlos costumava pedir-lhe a sua orientação como astrólogo?

Ele dizia que não acreditava, mas sempre que conhecia uma pessoa pedia-me para fazer o perfil astrológico. Aliás, no dia em que ele me apresentou o Renato, em Outubro do ano passado, quando íamos no carro a caminho do restaurante para jantar, ele pediu-me que fizesse o perfil do rapaz. Disse-lhe que não era oportuno fazê-lo na presença dos dois e o Carlos acabou por concordar. Onde foi esse jantar?

No restaurante Maçã Verde, junto a Santa Apolónia, em Lisboa. Quem conheceu o Renato como eu conheci, jamais poderia suspeitar que ele seria capaz de uma coisa destas. Socialmente era uma pessoa educada, calma e muito simpática.Quando falou com o Carlos Castro pela última vez?

No dia 5 de Janeiro, dois dias antes de ele morrer. O Carlos ligou-me no dia 2 para me contar que tinha passado um fim do ano maravilhoso na Broadway. Três dias depois liguei-lhe eu, porque achei estranho ele não me dizer mais nada. Quando lhe perguntei se estava tudo bem, respondeu-me: "Está tudo bem mas a gente depois fala", já sem o entusiasmo do dia 2.Sentiu que ele não estava bem?

Senti. Mas nunca me passou pela cabeça que o desfecho pudesse ser tão grave. Ainda hoje não aceito que o fim do Carlos tivesse tido tanto sofrimento, sinto revolta e uma enorme impotência.Gostava de fazer alguma pergunta ao Renato?

Gostava de conseguir perceber o que terá mudado na cabeça dele que deitou por terra o significado de todas as palavras meigas que os dois trocavam, mesmo quando estávamos os três juntos.Alguns amigos do Carlos já afirmaram que ele morreu como queria: em Nova Iorque, a trabalhar e apaixonado...

Não tenho dúvida que ele chegou a Nova Iorque, a cidade que ele mais amava, para passar a semana mais romântica da vida, na companhia do jovem por quem estava perdidamente apaixonado. Só que ninguém merece morrer assim! Tem saudades do seu amigo?

Muitas. Quanto mais o tempo passa, mas sinto a falta dele, mas sei que o Carlos vai estar sempre perto de mim e hei-de lembrá-lo para sempre.(Texto: Palmira Correia)

(Fotos: Joaquim Gromicho/SapoFama)