A agressão injusta à Ucrânia vai agravar a realidade pré-existente. Antes do início da invasão, a crise no leste da Ucrânia já afetava 4.4 milhões de pessoas, causando pelo menos 1.6 milhões de refugiados. Existiam 3.5 milhões de pessoas dependentes de algum tipo de apoio humanitário e de saúde, em consequência do conflito no Donbass.
A lista de problemas que necessitam de resolução é enorme, desde danos na infraestrutura, dificuldade no acesso a saneamento básico e água potável, ao próprio acesso aos cuidados de saúde que se encontra condicionado. É expectável que todas estas dimensões se agravem com o presente conflito. A dimensão do desastre humanitário a desenrolar-se à nossa frente é incalculável. Já hoje, chegam-nos relatos de falta de medicamentos ou da dificuldade da população para encontrar e pagar alimentos e aquecimento.
O número de refugiados, inevitavelmente, irá aumentar. Estima-se que possam chegar a 4 milhões de pessoas, dos quais perto de 400 mil já se encontram deslocados. Precisamos de organizar respostas para as enormes necessidades de saúde que irão inevitavelmente surgir, numa população fragilizada e sem acesso aos cuidados básicos.
A situação é bastante complicada nas regiões onde decorrem os combates. Os bombardeamentos destruíram infraestrutura essencial e de difícil reparação, tal como hospitais, clínicas ou centros de saúde. O abastecimento logístico tornou-se impossível, os cortes na eletricidade condicionam a atividade, sem esquecer que a própria viagem para procurar cuidados, transformou-se um evento de vida ou morte. Os profissionais de saúde, que já não abundavam no território, são agora um recurso escasso e precioso.
Não posso continuar este texto, sem deixar um sincero e profundo elogio aos profissionais de saúde, que nestas condições terríveis continuam a apresentar-se nos serviços e a garantir que os cuidados de saúde estão a ser prestados. É difícil imaginar trabalhar com bombas a cair, num clima de absoluta insegurança e escassez. A transferência de uma unidade de neonatologia para um recém-criado abrigo anti bomba no subsolo, história divulgada esta semana na cidade de Dnipro, é sem dúvida terrível, mas também revela o compromisso dos profissionais em não abandonar quem mais precisa, neste caso, bebés prematuros sem a mais pequena culpa das ambições imperiais do regime russo.
No dia 27 de fevereiro, a OMS lançou um alerta sobre a escassez de oxigénio nos hospitais ucranianos. Há dificuldades na produção, distribuição e armazenamento devido ao conflito, que a curto prazo pode agravar a catástrofe humanitária. A Ucrânia tinha 1700 pessoas internadas por Covid-19 com necessidade de oxigénio suplementar, sem contar com as restantes pessoas e crianças internadas nas unidades de cuidados intensivos, as situações crónicas ou os inúmeros traumas decorrentes do conflito. Todas estas pessoas estão em grave risco de vida, pela eminente falha no fornecimento de oxigénio.
Têm de ser abertos corredores humanitários, para permitir a evacuação de refugiados e a entrada de material médico essencial, desde medicamentos, oxigénio e material de consumo. É preciso garantir que estes bens cheguem a quem mais deles precisa, as necessidades são enormes e não podem ser ignoradas. As vidas têm de ser salvas.
A médio prazo, a situação não se afigura melhor. Mesmo que o conflito terminasse hoje, o impacto nos programas de vacinação e vigilância estaria comprometido no futuro imediato. A Ucrânia apresenta baixas taxas de vacinação, o que permitiu enormes surtos de sarampo em 2019 ou o regresso da poliomielite em 2021. Com o apoio da OMS, encontrava-se a ser desenvolvida uma campanha para vacinar 150 mil crianças para a poliomielite, que com o agravar do conflito, é severamente colocada em causa.
A Europa tem apoiado a Ucrânia diplomaticamente e militarmente. Este apoio é justo e tem de ser enquadrado num objetivo de paz, a curto e longo prazo. Mas não nos podemos esquecer da ajuda humanitária. A saúde dos ucranianos necessita de apoio urgente, não podemos falhar.
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