O conceito de autismo surgiu na década de 40 do século passado, “descoberto” quase em simultâneo por Leo Kanner, um psiquiatra de origem austríaca emigrado nos EUA, e outro austríaco, o pediatra Hans Asperger.

Para Kanner, o autismo era uma perturbação extremamente rara e sempre severa. Durante largo tempo resistiu ao conceito, implícito no trabalho de Asperger, de que haveria um espetro de gravidade dentro desta perturbação, e na possibilidade de algumas pessoas, com formas menos intensas da doença, poderem conduzir a sua vida de forma independente, algumas delas com trabalhos fundamentais na Física, Química, Matemática ou Astronomia.

O conceito de espetro dentro do autismo é hoje aceite de forma generalizada. De resto só assim poderia ser quando a incidência é calculada, em alguns estados dos EUA, como sendo de 1 em cada 68 crianças. Também começa a ser aceite a ideia de que uma fração destas crianças, mesmo aquelas que na infância pareciam ter uma perturbação grave, pode evoluir de forma favorável, com plena integração na sociedade e com uma vida pessoal em tudo idêntica ao comum dos cidadãos.

Contudo, a ideia de Kanner permanece no espírito da generalidade das pessoas.

Na atualidade, são reconhecidas formas cada vez mais subtis da perturbação, manifestada como dificuldade na interação social, não por isolamento, mas por discretas dificuldades no ajustamento do comportamento às circunstâncias sociais, ou subtis problemas na comunicação, expressos, por exemplo, na descodificação de mensagens de teor ambíguo. Embora discretas, estas dificuldades podem, no entanto, refletir-se no rendimento escolar.

Mesmo nesta formas mais ténues, o simples pronunciar da palavra autismo cria nos pais uma angústia sem precedentes e, apesar de todas as explicações quanto à benignidade da perturbação em muitos casos, elas de nada servem perante o peso da palavra.

Na minha opinião, o técnico não deverá contudo omitir o diagnóstico com medo de “ferir” os pais. Quantos, por não terem sido corretamente informados, fazem um percurso desamparado, por não saberem com que problema estão a lidar?

Creio que o reconhecimento generalizado destas formas subtis irá, com o tempo, diluir o impacto emocional da palavra autismo, levando ao entendimento de que todos somos diferentes, e essa variedade é, sob muitos aspetos, enriquecedora.

Dr. Nuno Lobo Antunes
Neuropediatra e Diretor do PIN

Site: pin.com.pt/

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