"Se não se põe um travão a esta situação que está em deterioração constante, estão criadas as condições para uma conflitualidade que pode levar a uma situação lamentável", disse a diretora da AI para as Américas.

Erika Guevara-Rosas falava aos jornalistas no âmbito de uma visita de uma delegação da AI a Caracas, alertando que o país enfrenta "uma crise multiplicada por fatores" que afetam "direitos básicos fundamentais".

Por outro lado a AI emitiu hoje um comunicado advertindo que "a negação quase obsessiva das autoridades venezuelanas de que a emergência económica implica uma crise humanitária no país, a sua falta de autocrítica e o empenho em não solicitar ajuda internacional está pondo a vida e os direitos de milhões de pessoas em alto risco".

"As políticas obstinadas estão afetando seriamente milhões de vidas. A combinação letal da severa falta de abastecimento de comida e medicamentos, combinada com os altíssimos níveis de criminalidade, persistentes violações de direitos humanos e políticas que se focam em assegurar que as pessoas não se queixem em vez de responder aos seus apelos desesperados de ajuda, é a receita perfeita para uma catástrofe épica", adianta o mesmo comunicado.

Durante a visita a delegação da AI reuniu-se com autoridades públicas, organizações da sociedade civil, ativistas dos direitos humanos, advogados e sobreviventes de violações de direitos humanos em diversas localidades, que falaram da "falta crónica de produtos alimentares essenciais e medicamentos, enquanto o país enfrenta uma das piores crises económicas em décadas".

"Acabou-se o tempo para a política mesquinha. O Governo do Presidente Nicolás Maduro, a oposição, empresários, grémios e a comunidade internacional devem participar de maneira urgente num diálogo para identificar e implementar mecanismos inovadores, eficazes e não discriminadores, para levar a ajuda vital a milhões de pessoas que necessitam. Todos os atores políticos devem deixar os seus próprios interesses (...) e pensar nas pessoas que devem ajudar", disse Erika Guevara-Rosas.

Segundo a AI "se quem está no poder não dá uma volta completa na forma como aborda esta dramática crise, é uma situação extremamente séria que se converterá num pesadelo inimaginável".

No comunicado a AI alerta que a escassez de produtos aumentou em todo o país e que, apesar dos esforços governamentais para combater a inflação com subsídios, as pessoas queixam-se de que são forçadas a acudirem ao mercado negro onde os preços são "proibitivos".

Por outro lado explica que o salário médio local oscila entre os 30 e os 60 dólares e que, no mercado negro um quilograma de farinha ou um litro de leite rondam os 2 dólares, um quilo de massa 3,50 e o açúcar e os produtos de higiene são muito difíceis de conseguir.

"Centenas de pessoas são obrigadas a fazerem filas junto dos supermercados, desde madrugada, para assegurarem que podem aceder a produtos, apesar de nunca saberem o que estará disponível", sublinha.

Segundo a AI vários médicos hospitalares denunciaram situações de desnutrição, perda de peso e stress agudo, causado pela falta de alimentos, enquanto há crianças que vão para a escola sem nada mais que 'um mango'.

"A crise económica, a dívida externa e as elevadas taxas de inflação significam que a Venezuela não pode importar medicamentos, a matéria-prima para os fabricar, nem materiais hospitalares básicos", explica, vincando que isso dificulta a atenção e as condições de vida dos pacientes.

A AI alerta ainda que a taxa média de assassinatos na Venezuela é de 58 por cada 100.000 habitantes, chegando em algumas cidades a 91 por 100.000 e a proliferação de armas ilícitas faz com que o "problema seja pior".

Muitos ativistas estão detidos junto com violentos criminosos, sem a realização de julgamentos e alguns dos seus advogados têm sido perseguidos e intimidados.

"A Venezuela é o lar de um sistema de justiça cuja independência e imparcialidade está altamente questionada. As autoridades devem assegurar que o sistema de justiça não seja usado para perseguir defensores de direitos humanos e devem libertar de forma imediata e incondicional todos os presos de consciência", sublinha a Amnistia Internacional, precisando que jornalistas, advogados e juízes "são alvo de ameaças".