Farmácias Portuguesas
Revista Saúda – Sétima Legião, Madredeus, a solo e com convidados. Consegue encontrar pontos comuns entre todos os trabalhos que fez?
Rodrigo Leão – A simplicidade. Há sempre uma certa simplicidade na música que faço. Mesmo nos trabalhos com arranjos mais complexos, há, na essência da música, essa simplicidade. Até porque eu sou autodidacta, não estudei música.
RS – Foi a procura dessa simplicidade que o fez afastar-se da Sétima Legião e de Madredeus?
RL – Queria fazer outras coisas. Foi só isso mas não houve grandes discussões. Andava fascinado pelo computador, por poder ter à minha frente 30 pistas onde podia ir gravando primeiro um piano, depois um violoncelo...
RS – E com tantos concertos por ano, devia ser difícil conseguir compor.
RL – Isso também acabou por influenciar. Se, para eles, que eram músicos mais virtuosos, tocar ao vivo era uma coisa importante, para mim não era tão importante. Gostava mais de compor, de ir para estúdio.
RS – Considera-se um perfeccionista?
RL – Perfeccionista? Não, de todo! Ou seja, quando estou a tentar descobrir as ideias e as bases, eu sei que há umas que são melhores do que outras e, nesse sentido, eu tenho algum perfeccionismo em tentar procurar as ideias boas, depois sou um grande preguiçoso a trabalhar os arranjos, a desenvolver as músicas e é por isso que tenho pessoas fantásticas a trabalhar comigo.
RS – Trabalhar com bons músicos liberta-o para o processo de composição.
RL – Sim, porque quando sinto que descobri uma ideia boa, a minha vontade é descobrir outra ideia e não estar ali a perder tempo. Obviamente, há casos em que trabalho mais profundamente uma ideia e outros em que trabalho menos. Tento sempre que tudo o que está num álbum seja o melhor. Mas é evidente que a perfeição não está ali: faço o que consigo fazer e isso deixa-me muito feliz. Daí até pensar que tudo isto está perfeito... Não, não está!
RS – Nem tem de estar.
RL – Exacto. Até porque há imperfeições que fazem parte deste caminho e até são saudáveis.
RS – Fazer álbuns em nome próprio tornou-o um compositor mais autobiográfico?
RL – Acho que todos os álbuns que fiz são muito autobiográficos, muitas vezes sem me aperceber. Diria que metade da minha música é influenciada pelo que me rodeia e a outra metade são sentimentos que estão dentro de mim e que não sei explicar muito bem. E, por isso, tento passá-los através da música.
RS – O local onde compõe tem influência?
RL – Tudo acaba por influenciar, de certa forma. O dia-a-dia, o que nos rodeia, as pessoas que vamos encontrando, tudo isso acaba por estar directamente ligado às coisas que eu vou tentado fazer, ainda que inconscientemente. Se eu estou a fazer música perto de Avis, onde tenho uma casa, com aquele silêncio, aquele calor no Verão, é diferente de fazer aqui, com vista para o rio Tejo. Ou de compor num quarto de hotel. São ambientes distintos.
RS – Mas, apesar de viajar bastante e de a sua música ter um alcance global, mantém uma certa portugalidade.
RL – Há, de facto, uma certa melancolia que está ligada à saudade, a algum romantismo. Grande parte dos meus trabalhos tem essa melancolia muito presente. É o mesmo tipo de sentimento que eu por vezes encontro na pintura, no fado de Coimbra, na literatura, em muitas coisas que são genuinamente portuguesas. O facto de vivermos junto ao mar, a comida, acaba tudo por estar ligado e fazer sentido.
RS – Tantas viagens certamente obrigam-no a tentar manter-se em forma. Tem algum tipo de cuidados com a saúde?
RL – Tenho alguns cuidados. Eu nunca gostei de fazer desporto, portanto a única actividade física que faço são caminhadas, que gosto muito de fazer. Às vezes, faço caminhadas aqui junto ao rio, até Alcântara e voltamos. Estamos uma hora e meia a caminhar. Para além disso, tomo vitaminas com alguma regularidade. Vitamina C, vitamina E, vitamina D, magnésio.
RS – E com a alimentação?
RL – Com a comida tenho algum cuidado, mas não muito. Cometo alguns disparates mas sinto-me saudável, de uma forma geral.
RS – Sentir-se bem, física e mentalmente, afecta o seu trabalho?
RL – Claro. Eu acho que uma das coisas mais importantes é o humor. A capacidade de nos rirmos muitas vezes ao longo do dia ajuda-nos a ter mais saúde. E as amizades também são muito importantes, o não estarmos muito tempo fechados em nós próprios. Isso tudo contribui para que haja mais saúde.
RS – Ouvir música também ajuda?
RL – Sem dúvida. Acho que já está provado. As músicas podem provocar estados de espírito. Quantas vezes não me apetece ouvir uma música mais alegre porque sei que me vai fazer bem. E depois há música que remete à tranquilidade, como grande parte da música que faço, que acho que transmite alguma paz.
RS – Encontra muitas diferenças entre o Rodrigo do início de carreira e o de hoje?
RL – Acho que continua a haver alguma infantilidade, como a que existia quando era adolescente. E também aqueles picos de entusiasmo que tinha quando era mais novo, que surgem quando tento fazer mais música. Agora, havia coisas muito simples que eu fazia e que se calhar não faço tanto hoje em dia. Pelo menos de forma tão simples. E, obviamente, os meus filhos e a minha família, que são muito importantes naquilo que faço. Eu não os tinha há 30 anos atrás. Mas acho que a essência, apesar de tudo, se mantém.
Texto de Pedro Veiga
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