Para Elisabete Jacinto o gosto pelas corridas começou como um hobby, que com o tempo acabou por se tornar em algo mais. “Um dia um dos meus amigos, com que andava de moto de Todo-o-Terreno (TT), decidiu participar numa prova de TT (surgia pela primeira vez o Campeonato Nacional de Todo-o-Terreno em Portugal) desafiando os outros. Na altura não me sentia, de forma nenhuma, capaz de participar numa corrida. Contudo, perante a insistência do grupo, acabei por ir. Fiz a minha primeira corrida em 92, o “Grândola 300” e, depois desta, fiz todas as que vieram a seguir. Tratou-se de uma paixão que se instalou e que nunca mais desapareceu”, refere em entrevista ao SAPO Lifestyle.
No caso de Rita Oliveira, o automobilismo, apesar de ser um hobby, é uma paixão de família. “Desde pequena que acompanho o meu pai em provas do Campeonato Nacional de Todo-o-Terreno e que também faço passeios de TT. Em 2004, convidou-me para ser navegadora dele e assim foi até 2014, altura em que me desafiou para fazer a minha primeira prova como piloto, num UTV/Buggy. Inicialmente foi estranho mas depois aceitei como sendo algo natural e próprio de quem está ligada à modalidade desde criança e adorei.”
Quando questionadas sobre aquilo que lhes dá mais prazer neste desporto, a resposta é unânime: a sensação de superação aliada à adrenalina própria deste tipo de competição. “Esse é o verdadeiro gozo do desporto: perceber que os limites não estão onde pensamos”, afirma Elisabete Jacinto que foi a única mulher a nível mundial a fazer corridas de camião no Rali Dakar.
À semelhança do que acontece em outras áreas, o automobilismo é um desporto dominado por homens. Apesar de ainda vivermos numa sociedade baseada em preconceitos e em estereótipos, Jacinto refere que com trabalho, dedicação e confiança tudo se consegue. “Trabalhar num mundo maioritariamente masculino quando se quer apresentar resultados significa trabalhar muito mais que qualquer um deles e estar sempre a dar provas de qualidade. Temos de ter consciência de alguns aspetos que caracterizam o género feminino e que nos impedem de ter sucesso e corrigi-los”.
Trabalhar num mundo maioritariamente masculino (...) significa trabalhar muito mais que qualquer um deles
Então será que o estigma do sexo frágil, principalmente ao volante, ainda permanece nos dias de hoje? “Esta é uma modalidade muito direcionada para os homens, mas o que é certo é que as mulheres também têm muita garra. Apesar de os homens terem uma aptidão mais natural para os desportos motorizados, as mulheres são menos impulsivas, nervosas e são mais persistentes, pelo que creio que conseguem gerir melhor uma prova com as características TT. Cabe-nos a nós, senhoras, acreditar nisso e ter força para mudar essa mentalidade de que este é um desporto de homens e não nos deixarmos influenciar pelo estigma de que mulher ao volante, perigo constante”, explica Rita Oliveira.
Para quem acha que o automobilismo é só coisa de homens, desengane-se. Embora estejam em minoria, a verdade é que nos últimos anos esta modalidade tem conquistado cada vez mais adeptos do sexo feminino. Para Elisabete Jacinto a explicação é simples. “Acima de tudo as mulheres apreciam o facto de outras conseguirem alcançar aquilo que elas gostariam de fazer mas não têm coragem. Fomos todas educadas no preconceito por isso o sexo feminino gosta de perceber que existem outras mulheres que rompem essas barreiras. Mesmo as que não são verdadeiramente apaixonadas pelos desportos motorizados têm sempre uma atitude de grande simpatia”, frisa. Mas será que o mesmo se verifica junto do público masculino? “A forma como os homens nos encaram depende, acima de tudo, da personalidade e da educação que tiveram. E em termos de atitudes face às mulheres nos desportos motorizados, há para todos os gostos!”
Tal como em qualquer modalidade, para Rita e Elisabete o fair play é algo essencial, assim como o respeito mútuo entre colegas que tem existir dentro e fora das pistas. “Cá fora costumo ser a Ritinha, mas quando metemos o capacete somos todos competitivos e todos ambicionamos chegar ao final e no melhor lugar possível”, explica a piloto que pelo segundo ano consecutivo venceu a Taça das Senhoras do Campeonato Nacional de Todo-o-Terreno.
A nível profissional, ambas revelam, sem qualquer pudor, que são competitivas q.b., que não gostam de perder e que apesar de adorarem emoções fortes também gostam de se sentir femininas, nunca descurando os cuidados com a imagem.
“É possível ser uma senhora dentro e fora das pistas. Aliás, os meus navegadores brincam comigo por isso mesmo! Venha pó, chuva e lama, mas também os cremes, o rímel e o blush! Adapto-me facilmente às condições do TT e gosto da adrenalina das corridas, mas continuo a ser uma senhora com as suas "vaidosices" e preocupações relativamente à sua imagem ainda que com um fato-macaco vestido e sabendo, à partida, as condições que vou encontrar a seguir”, revela Rita Oliveira.
Venha pó, chuva e lama, mas também os cremes, o rímel e o blush
Tal como acontece em outros desportos, a preparação física e uma boa alimentação são extremamente importantes para o êxito profissional dos pilotos Todo-o-Terreno. Apesar das exigências e regras que este desporto acarreta, para Rita Oliveira há sempre tempo para a família e os amigos. “O TT continua a ser um hobby para mim e, por isso, para além das provas não me retira demasiado tempo para bons programas entre amigos e família. Por vezes são eles que se juntam a mim e vêm ver as minhas provas.”
Com quase 15 anos de carreira desportiva em Camião, Elisabete Jacinto reflete sobre a lição mais valiosa que aprendeu com este desporto: ter bom perder. “Se se perde é porque de alguma forma estivemos menos bem e cometemos algum erro. E isso significa que temos por onde progredir. Há que refletir e perceber que motivos nos fizeram perder e é aí que realmente se descobrem coisas fantásticas e se aprende muito. É esta a razão porque digo muitas vezes: progride-se mais quando se perde do que quando se ganha”, remata.
Também é importante não esquecer Madalena Antas e Carina Lima, duas pilotos que tem dado que falar a nível nacional. Lá fora, especial destaque para duas grandes lendas do automobilismo: Sara Christian, que se destacou por ter sido a primeira mulher da história a correr nas provas da NASCAR, e Denise McCluggage que na década de 60 ganhou o prestigiado rali de Monte Carlo.
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