É fácil “bater” no SNS.

As falhas importantes no sistema público de saúde saltam à vista desde logo pela desigualdade no acesso à saúde em função dos rendimentos.

Quase metade dos cidadãos com menos rendimentos faltam ou adiam consultas por razões económicas, uma das maiores cifras no espaço da OCDE.

E no caso dos serviços dentários Portugal é o segundo país onde a diferença entre ricos e pobres é maior.

Porém esta falta de resposta do SNS não persiste apenas no caso da medicina dentária, antes alargando-se às especialidades de clínica geral e hospitalares, aos tratamentos de reabilitação e aos exames complementares de diagnóstico.

Por outras palavras, além da subida das taxas nos empréstimos, nos produtos alimentares com o IVA zero, os Portugueses têm o acesso a consultas médicas fortemente penalizado – ainda que as despesas na saúde tenham até isenção de IVA!

Mas o que mais perturba e assusta é a espantosa nulidade do ponto de vista de planeamento de saúde, em particular no SNS. Até me apetece concordar com o ministro das Finanças, Fernando Medina, quando classificou de “natural” que os sindicatos dos médicos reivindiquem mais em matéria salarial, vincando e repetindo – e bem – que o problema “é mais complexo” do que financeiro. E para reforçar afirmou que, “os recursos existem, o problema é mais complexo do que a existência desses recursos”.

Para um Povo endividado embora o não assumamos e um País atolado, cada cêntimo deverá ser precioso.

Fernando Medina tem razão e a cada cativação faz parecer Vítor Gaspar, o Ministro de Passos Coelho, um aprendiz de feiticeiro em tempos de Troika.

Mas o inexplicável sub-investimento no SNS não se reflecte apenas na saúde dos cidadãos no imediato.

O SNS não sabe o que é planeamento.

Veja-se o exemplo da evolução demográfica. Segundo as previsões, em 2050 os maiores de 65 anos serão mais de 35% da população nacional, isto quando Portugal é dos países onde é menor a parte de vida saudável na terceira idade e onde 75% das pessoas acima dos 65 anos sofrem de duas ou mais doenças crónicas (contra apenas 31,4% na média da OCDE). O sistema público de saúde vai-se vestindo como um pobre serviço para pobres, enquanto os privados oferecem serviços em função da capacidade de pagamento.

Vimos assistindo, desde 2022, a uma sucessão de anúncios e tiros para o ar relacionados com a reorganização do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

A famigerada Lei de Bases da Saúde, aprovada em 2019, pôs todas as fichas na Direção Executiva do SNS, a tal figura de CEO que, na prática vem fazer o que estava acometido legalmente à ACSS.

Já vamos com meses sobre a designação da Direção Executiva e não se conhece um plano estratégico de fundo que permita entender o rumo, as soluções ou as apostas. Bem sei que também falta o enquadramento jurídico e estatutário, mas as nomeações antecedem sempre outro tipo de comportamentos…

Depois anuncia-se o fim das ARS’s e o seu fatiamento por entidades diversas, como as Comissões Coordenadoras Regionais. No entanto, no âmbito da Direção Executiva fica prevista a criação de “unidades orgânicas territorialmente desconcentradas”, dotadas de “conhecimento técnico e sensibilidade territorial”, o que equivale em interpretação pessoal às anteriores, invisivéis e moribundas ARS’s!

E anunciam-se ULS por aí fora, cerceiam-se as ambições dos hospitais, multiplicam-se os órgãos de gestão e reduz-se a visão de integração e a dimensão de escala. Em nome da autonomia das instituições para a contratação de recursos? Então porque não se altera o modelo legal subjacente e porque não se corrige o insustentável trabalho em prestação de serviços?

E finalmente o Conselho Estratégico da Direção Executiva, composto pelo Diretor Executivo do SNS, Presidente do Conselho Diretivo da Administração Central do Sistema de Saúde e pela Presidente do Conselho de Administração da SPMS, Serviços Partilhados do Ministério da Saúde?

O que trazem de novo ou a mais fundamentalmente ao SNS?

Será esta a nova medida da desordem de um sistema ou representação de imprevisibilidade?

É caso para dizer, da Saúde às Finanças ou o Cabo das Tormentas!

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