A demógrafa Maria João Valente Rosa lamenta que muitos trabalhadores sejam dispensados apenas por serem mais velhos e propõe que se reflita em novas formas de organização da sociedade, como a valorização do mérito em vez da idade.

 

A ideia “muito frequentemente difundida” de que as pessoas mais velhas ao deixarem de trabalhar estão a libertar postos de trabalho para os mais novos é “falsa”, diz à Lusa a diretora da Pordata, considerando preocupante que “a sociedade, pela voz de muitos responsáveis, conviva bem” com este princípio.

 

Apesar do aumento da esperança de vida e das maiores capacidades das pessoas mais velhas, as reformas antecipadas continuam a aumentar e a idade dos novos pensionistas da Segurança Social ou a idade média de reforma/aposentação dos funcionários públicos está muito abaixo dos 65 anos, adianta a demógrafa, que falava a propósito do Dia Internacional do Idoso, que se assinala na quarta-feira.

 

A autora do ensaio “Envelhecimento da sociedade portuguesa”, da Fundação Francisco Manuel dos Santos, lembra que “o envelhecimento da população é um processo inelutável, pelo menos no futuro a médio prazo, e que as sociedades de hoje valem muito pelo fator conhecimento”, que não tem barreiras etárias.

 

A população em idade ativa (15/64 anos) está a diminuir, situando-se nos 6,9 milhões de pessoas, quando até 2010 era superior a sete milhões, e vão existir cada vez mais pessoas em idades ativas superiores.

 

“É preciso repensar a forma” como a sociedade está estruturada, uma vez que o modelo de organização existente “está muito virado para uma sociedade passada, que nada tem a ver com a atual ou a futura”, defende.

 

Um “bom exemplo” disso é o “choque” que está a viver o financiamento das pensões, baseado essencialmente num modelo em que a população ativa financia as reformas.

 

Este modelo “funcionava bem em sociedades do passado com estruturas etárias jovens, mas agora, tudo mudou” e o “equilíbrio financeiro geracional está seriamente afetado, pois os idosos são cada vez mais e têm mais tempo de vida, e os que descontam são cada menos”.

 

Para reequilibrar essas contas, as soluções normalmente apresentadas, como a diminuição das pensões, o aumento das contribuições ou um ligeiro aumento da idade da reforma, são “meros paliativos, que não estão a ir ao fundo do problema, mas a adiá-lo”, reconhece.

 

“É altura de nós, como cidadãos, repensarmos a nossa forma de viver nesta sociedade” e dos governantes “darem sinais claros de que o facto de ser mais velho não está ligado a uma situação de menoridade económica ou social”.


“Os mais velhos não são inimigos dos mais novos” e estas barreiras etárias “criam fossos artificiais perigosos”, adverte.

 

Para contornar esta situação, a demógrafa defende revisões profundas do modelo de vida: “Porque não tornar menos intenso o trabalho na fase central da vida, no período ativo, libertando tempo para a formação e lazer, estendendo esse período de trabalho com a possibilidade de reforma a tempo parcial”.

 

“Como vivemos muito mais tempo podemos, também, imaginar uma vida com várias carreiras e não apenas uma”, apostando sempre na formação.

 

Propõe também que se privilegie o critério do mérito em vez da idade: “Muitas vezes, as pessoas são automaticamente dispensadas do exercício de uma série de atividades apenas por terem mais idade, não tendo em conta os seus conhecimentos e capacidades, o que não faz qualquer sentido e está em total contraciclo com o dinamismo social e económico”.

 

“A sociedade tem que se repensar e passar a contar com todos, pois a maior riqueza da sociedade são as pessoas, qualquer que seja a sua idade”.

 

Por Lusa