O início de cada ano letivo traz uma repetida preocupação aos pais. Uma preocupação que se prolonga ao longo dos meses seguintes. Como motivar os nossos filhos para o estudo? E o que devem eles fazer para serem bem-sucedidos na escola? Jorge Rio Cardoso, professor do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, responde a estas questões no livro «Este Ano Vais Ser o Melhor Aluno! Bora Lá?», lançado pela editora Guerra & Paz.

Nele descomplica a arte de estudar, partilhando técnicas de estudo que ajudam as crianças a compreender e a aprender. Em entrevista à revista Prevenir,  o autor ensina-nos a motivar os nossos filhos para a escola, identifica as principais origens dos maus resultados e apresenta soluções. Veja também a galeria de imagens com os produtos naturais a que pode recorrer para aumentar a capacidade de concentração e o poder de memorização do seu filho.

Conta nos seus livros que, até aos 13 anos, não sabia estudar. Em que momento se deu a viragem e como passou a ser um bom aluno?

Esse clique deu-se muito por culpa do desporto, no caso, o atletismo. Sem me aperceber, ganhei uma série de competências, nomeadamente em termos de regras, de autoconfiança, de valorização do esforço e de sentido de gratificação. Tanto na escola como no atletismo, comecei a perceber que não era o melhor e que só investindo em mim poderia melhorar e até procurar a excelência, depois de ultrapassar uma série de pormenores.

Quais são os primeiros passos que qualquer pai deve dar para motivar o seu filho para um novo ano escolar?

Mais do que motivar os filhos para o estudo, os pais devem alargar essa motivação para a vida e tentar que os filhos sejam felizes, pois sem felicidade não há motivação, boas notas ou uma formação assertiva. Para isso ajuda, por exemplo, identificar a paixão dos filhos, seja o desporto, a música, o teatro, a dança ou outra, para depois transferir as regras dessas atividades para o universo do estudo, da escola.

Muitas vezes, as crianças e jovens não sabem estudar, não têm foco, sendo essencial procurar uma programação do estudo, principalmente no caso de alunos do primeiro, do segundo e do terceiro ciclo. Se se souber o que se vai fazer antes de começar a estudar, sabe-se o que ler ou que resumo fazer.

Quais os maiores erros que os pais, inadvertidamente, cometem, acabando por desmotivar as crianças para a escola?

Um erro comum prende-se com o facto de alguns pais se sobreporem ao professor na tentativa de os filhos melhorarem as notas, insistindo que a criança estude mais uma determinada matéria. Isso revela desrespeito pelo professor, desacredita a escola enquanto sistema e pode mesmo fazer crescer na criança uma sensação de que as notas menos positivas sejam mais da responsabilidade do docente que nem sabe o que é a matéria ou a disciplina mais importante.

Outro processo negativo é alimentar as pesquisas na internet. Devemos, sim, direcionar essa busca para outros ambientes, pois senão dá-se a entender que as soluções estão no Google e que não é necessário esforçar-se muito. Só assim se fomenta o ato de saber pensar, de encontrar soluções, de cruzar fontes e de criar um pensamento crítico.

Veja na página seguinte: As frases que devemos dizer para motivar os nossos filhos

Que frases podemos dizer aos nossos filhos de forma a motivá-los?

Devemos evitar, ao máximo, a palavra não. Imaginemos uma criança que chega a casa depois da escola e pergunta se pode brincar. Podemos dizer «Não, pois tens de fazer os trabalhos!» ou «Sim, mas antes resolves os trabalhos de casa». É exatamente a mesma coisa, mas podemos tentar criar um ambiente positivo.

Nas alturas em que existe mais frustração, por não conseguir a nota desejada, é fundamental reforçar a ideia de que, ao estudar melhor, conseguem-se bons resultados. Assim, frases como «Tu consegues!» ou «Não desistas!» são excelentes tónicos, promovem a autossuperação e acentua-se o brio e a motivação intrínseca.

O que significa, hoje, ser bem-sucedido na escola?

Essa noção está além das boas notas, ainda que o aproveitamento escolar seja muito importante. Ser um bom aluno passa também pela boa integração no meio escolar, de preferência com participação na solidariedade e associativismo.

E esse bom aluno pode ser cool? 

Sem dúvida. Pode ter-se boas notas e uma boa vida social. Os bons alunos podem ser cool se tiverem método de estudo, ou seja, focarem-se nas alturas certas, mas nos tempos livres conhecem de cor as letras das músicas que passam na rádio, vão à discoteca ou jogam bem futebol.

No fundo, estas questões acabam por ser uma recompensa pelo investimento no estudo. Vou mais longe, essa ideia de ser cool é deveras importante para se ganhar as tais competências que, mais tarde, no mercado de trabalho, os vai tornar profissionais criativos, os tais que pensam fora da caixa.

Quais são os segredos dos bons alunos?

Em primeiro lugar, é importantíssimo fazer-se a programação do estudo.  É muito diferente estudar apenas a dois dias do teste ou ter um método contínuo. O estudo deve ter vários momentos. Existe uma fase de menor concentração, quando são reunidos os apontamentos, a matéria dada na sala de aula complementada com a informação que está no manual de apoio ou passar as aulas a limpo.

A partir dessa base, o aluno deve calendarizar quando vai trabalhar essa informação nunca esquecendo coordenar tudo com os tempos livres. O aluno deve também desenvolver formas, técnicas de compreensão dessa matéria.

Decorar não é uma boa técnica…

Decorar matéria, sem a devida compreensão, é contraproducente e apenas pode resultar no imediato. Ainda assim, em algumas alturas da vida escolar, é indispensável decorar alguns conceitos, mas convém desenvolver o tal sentido crítico e reproduzir esses conceitos por palavras nossas. A lógica, o hábito a criar, é compreender e depois memorizar.

Veja na página seguinte: Os (piores) hábitos de estudo a evitar

Que hábitos de estudo, geralmente, funcionam mal?

Algo muito usual e que leva a uma maior saturação é a intensificação do estudo depois de uma má nota. Aquilo que deve ser pensado não é estudar mais mas, sim, melhor, de forma objetiva. Quando se tem um bom método, conseguem-se melhores resultados em 30 minutos do que em duas horas de estudo desenfreado.

Os pais podem (e devem) ajudar os filhos a estudar ou recomenda uma total independência dos filhos?

Defendo uma independência gradual.  No primeiro ciclo, a dependência dos pais é muito grande e é normal que os pais estejam presentes no estudo. À medida que a capacidade de estudo aumenta, deve fomentar-se a autonomia e puxar-se pela autoestima e autoconfiança. Nos trabalhos para casa (TPC), por exemplo, devemos dar total independência à criança, deixando-a primeiro tentar fazer aquilo que sabe e depois, se necessário, dar um empurrãozinho.

Mas nunca fazer o trabalho por eles. Se tiverem uma má nota, essa situação deve servir de aprendizagem e a frustração deve ser trabalhada, tentando perceber o que falhou e o que pode ser melhorado. Muitas vezes, a presença dos pais nos estudos funciona como uma almofada afetiva e basta esse conforto para ajudar.

Os TPC são um bom método de estudo?

Não, até porque sabemos que Portugal é um dos países com mais horas de estudo em casa e isso não significa melhores notas. Os TPC podem ser uma boa medida, por exemplo, nas férias  da Páscoa, para consolidação de conhecimentos, mas quando se fala em tarefas diárias, em que a sua realização pode até colocar em causa o tempo livre, é contraproducente.

Acho mesmo que os professores deviam coordenar entre si a atribuição dos TPC para não sobrecarregar os alunos. Quanto à realização dos TPC, defendo que se devam fazer logo após o regresso das aulas, pois assim as crianças podem depois brincar sem o peso de ter essas tarefas mais tarde.

Em que casos recomenda que um aluno recorra a explicações?

Penso que as explicações sejam uma medida aconselhável mas, em casos muito específicos, principalmente na aquisição de hábitos de trabalho, de métodos de estudo. Deve abandonar-se a ideia que basta ir para a explicação para se conseguir recuperar a matéria que não se conseguiu entender na sala de aula. O explicador pode, mesmo, desempenhar um papel de coaching, agindo ao nível motivacional, mas deve ser uma medida pontual.

Texto: Carlos Eugénio Augusto com Jorge Rio Cardoso (docente do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa)