Este domingo, 14 de janeiro, é um dia histórico para a família real dinamarquesa. Na data em que completa 52 anos no trono, a rainha Margarida abdica do lugar de soberana, passando-o para o filho mais velho, o príncipe Frederico.

Será a primeira abdicação que acontece na história da monarquia dinamarquesa em quase 900 anos. A última vez que se verificou foi em 1146, quando Eric III Lam abdicou.

Falámos com Alberto Miranda, especialista em famílias reais e autor do livro 'As Dez Monarquias da Europa', sobre a abdicação da rainha Margarida e consequente proclamação do príncipe Frederico como rei.

Como é que encarou esta decisão?

Foi uma surpresa para os dinamarqueses, uma decisão inesperada no discurso de Ano Novo da rainha em que ela diz que é altura de passar testemunho à nova geração. Isto mostra que o princípio da hierarquia é, de facto, a hereditariedade. O sistema monárquico determina que o trono se herda por morte do monarca ou abdicação, que foi o que Margarida decidiu fazer. A abdicação é um ato pessoal, mas que tem efeitos constitucionais.

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Eu acreditava que Margarida era como Isabel II, que queria levar a sua missão até ao fimPensa que Margarida poderá ter sido influenciada de alguma forma para a tomada desta decisão?

Não sabemos com rigor o que esteve na cabeça da rainha para abdicar. Os factos que ela elenca é que chegou o momento e depois frisa que fez uma operação às costas em 2023 e que, desde então, passou a encarar a vida com outros olhos.

É tudo especulativo. Eu acreditava que Margarida era como Isabel II, que queria levar a sua missão até ao fim. Não foi o que aconteceu. Margarida é uma rainha artista, muito dada à cultura, é uma grande pintora, cenarista, figurinista, faz bordados para várias igrejas e catedrais. Agora vai ter tempo de explorar esta sua vertente.

A decisão que tomou no final de 2022 em retirar os títulos reais aos filhos do príncipe Joaquim pode ser um indicador da abdicação?

Sim. A própria justificou na altura que era uma forma de modernizar a instituição para o futuro. Queria deixar esta marca no seu reinado, olhou para a instituição com uns olhos mais reformadores para diminuir o núcleo duro da família real - aqueles que trabalham em prol de - numa perspetiva de reduzir os custos ao erário público.

Tínhamos a ideia de que eram um casal modelo e isso ficou um bocadinho diluído, essa imagem foi afetada

Príncipe Joaquim e a mulher, a princesa Marie© Getty Images

A abdicação surge também numa altura em que a reputação de Frederico foi abalada pelo escândalo por causa de um alegado caso extraconjugal.

Foi uma autêntica surpresa. Tínhamos a ideia de que eram um casal modelo e isso ficou um bocadinho diluído, essa imagem foi afetada. O príncipe Frederico era o romântico, que chorava ao ouvir a mulher a falar. A capa dessa revista espanhola, Lecturas, teve o efeito de uma bomba na corte e na Dinamarca.

Príncipe Frederico e a princesa Mary na celebração do seu casamento a 14 de maio de 2004© Getty Images

Tendo em conta este escândalo acha que os dinamarqueses vão receber na mesma de braços abertos Frederico enquanto rei?

Os dinamarqueses são muito arreigados à instituição monárquica. Parece um paradoxo, mas a Dinamarca, que é o país da felicidade, da igualdade, aceita a instituição, a monarquia.

Eles foram muito aplaudidos quando foi a festa de Ano Novo e apareceram juntos e já se sabia que iam ser reis. Isto é um ato pioneiro, não houve - até agora - abdicação na monarquia da Dinamarca. Isto mostra a vontade da rainha em fazer história. Margarida abdica no dia em que faz 52 anos no trono.

Esta abdicação é, no fundo, uma celebração da própria monarquia, em que passa o testemunho ao lado do filho. Não é um momento de luto e festa em simultâneo, como há 52 anosSerá uma sucessão diferente da que Margarida viveu...

Quando ela foi anunciada ao trono estava de luto porque o pai [Frederico IX] tinha morrido e de lágrimas nos olhos. O dia 14 de janeiro será o oposto. Será uma passagem natural sem morte, um momento de celebração, de vida. Esta abdicação é, no fundo, uma celebração da própria monarquia, em que passa o testemunho ao lado do filho. Não é um momento de luto e festa em simultâneo, como há 52 anos. Importa recordar que não há coroação, é uma proclamação, é uma investidura, o rei não é coroado, o único país que coroa o rei é o Reino Unido.

Príncipe Frederico e a mulher, a princesa Mary, futuros reis da Dinamarca © Keld Nameoft, Royal House

Frederico está preparado?

Os príncipes são educados para esta função desde o nascimento. Frederico tem 55 anos e acompanha a mãe nesta profissão desde criança, ele próprio está a educar o filho para esta função e portanto está preparadíssimo, sabe perfeitamente qual é o seu papel, o esforço e a dedicação. O rei não tem poderes ilimitados, é um papel sobretudo de representação. Além disso, terá de preservar a instituição para a geração seguinte.

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