A moda da cozinha a baixas temperaturas começou em França, na década de 1970, pelas mãos do chef francês George Praluz. Curiosamente, o foie gras foi a iguaria escolhida para a primeira experiência. Um produto de preço elevado que, à medida que vai sendo cozinhado, perde muita gordura. E, neste caso, quem diz gordura, diz dinheiro por isso, para acabar com o desperdício, o chef lembrou-se que podia fazer a cozedura dentro de um saco (em vácuo) também chamada cozedura sous-vide.

Entretanto, apareceu um cientista francês, Bruno Goussault, que começou a desenvolver este procedimento e hoje dá consultoria em todo o mundo para cozinheiros e restaurantes. Em Portugal, o chef Luís Baena era, no final da década de 2000, um dos especialistas neste método e foi com ele que aprendemos o essencial sobre esta técnica vantajosa para a saúde. Falámos com ele.

O método

Há sempre duas variáveis na cozinha, temperatura e tempo. Quanto mais baixa a primeira, mais tempo demoram os alimentos a cozinhar. Na cozinha, a baixa temperatura, os graus e minutos são trabalhados ao pormenor. Luís Baena explica todo o processo. «Coloca-se o produto dentro de um saco de plástico (especial para este tipo de confecção), em vácuo e hermeticamente fechado», diz.

«Depois, põe-se dentro de um equipamento, um banho termoestatizado ou um forno a baixas temperaturas, que permite manter uma temperatura constante, regulável grau a grau», prossegue. Uma vez terminada a cozedura, os produtos têm de ser servidos de imediato ou arrefecidos, aconselha.

É fundamental que haja uma bacia com água e gelo «porque ao retirar os produtos do banho eles vão continuar a cozer e já que temos uma precisão tão grande nos minutos e temperaturas não podemos deixá-los cozinhar mais» acrescenta o chef, que nos anos seguintes seria seguido por outros cozinheiros.

Passo a passo

A cozinha a baixa temperatura requer um grande rigor técnico. Todos os equipamentos associados, desde a máquina de vácuo ao banho termoestatizado ou aos fornos de baixas temperaturas, destinam-se, «regra geral, a ser trabalhados por profissionais competentes da área», defende Luís Baena. As experiências têm de ser feitas segundo restritas normas de segurança. O chef dá-nos os passos a seguir.

«Quando compramos os ingredientes, têm de ser imaculadamente frescos e não podemos trabalhar com produtos que foram sujeitos a armazenamento durante dois ou três dias», alerta. «Estes devem ser trabalhados em ambientes de total assepsia, onde tudo esteja esterilizado. As mãos devem ser desinfetadas e não pode haver cruzamentos entre produtos», alerta o cozinheiro.

«Se estou a trabalhar com uma alface, não posso estar ao mesmo tempo a cozinhar peixe», refere ainda. Mais, a partir dos 65º C, algumas bactérias morrem, mas outras podem ainda manter-se vivas, por isso é preciso ser estritamente cuidadoso. Uma indicação que se reveste de particular importância, sob pena de comprometer o resultado final.

Veja na página seguinte: Os produtos que mais beneficiam com este método de confecão

Textura e consistência

Aqui, a cozinha é cada vez mais vista como um laboratório, onde os princípios físicos e químicos que estão por detrás da confeção dos alimentos são o mote para a confecção dos pratos. Os produtos que mais beneficiam com este método são a carne, o peixe e os legumes, tanto em termos de sabor como de consistência. Luís Baena apresenta-nos alguns exemplos. «Com o ovo (único produto que não precisa de ser colocado dentro de um saco) sei que a gema coagula a partir dos 65º C», diz.

«Posso cozê-la a 65º C, 66º C, 68º C ou 70º C e isso é suficiente para lhe dar texturas diferentes», assegura. «A clara apenas coagula a 75º C. Por isso, o resultado, se cozinhar a 65º C, é um ovo cozido com aparência de ovo mole (doce regional de Aveiro)», acrescenta ainda o cozinheiro.

«Se quero cozinhar um cachaço de porco, uma carne com muita gordura, sei que no forno vai perdê-la toda e ficar mais ressequida. A baixas temperaturas, posso aproveitar não só a godura que lá fica como o colagénio da carne e ela fica mais saborosa», afiança ainda o chef Luís Baena.

As vantagens do slow cooking

A descoberta do método de cozinhar a baixa temperatura alargou os horizontes aos chefs de cozinha. «Permite-nos trabalhar com novas consistências e regular a temperatura de acordo com aquilo que é a cozedura de cada alimento», afirma Luís Baena. Para isso, servem-se de uma tabela de valores onde apontam temperatura, tempo de cozedura e de conservação.

Um alimento pode manter-se, depois de cozinhado, armazenado durante dias, semanas ou meses, consoante os parâmetros de avaliação que partilham entre colegas, de acordo com as experiências de cada um. Em termos nutricionais e gastronómicos, esta técnica é altamente vantajosa. «Há uma menor perda dos valores proteicos dos produtos. Como os alimentos estão dentro de um saco, não têm por onde se expandir e o sabor vai concentrar-se», explica.

«As proteínas animais começam a desnaturar-se a partir de uma temperatura elevada, por isso a 70 graus, por exemplo, consigo aproveitar mais nutrientes do que a 100 graus. Também se pode trabalhar com menos sal porque, dentro do pacote hermeticamente fechado, o sal não se vai perder. Muito importante é também a pouca utilização de gorduras», salienta ainda.

Texto: Mariana Correia de Barros com Luís Baena (chef)