«Cuidado! Pode morder», ouve-se, muitas vezes. O aviso é recorrente. A presença junto de animais e o contacto com eles é muito importante para o desenvolvimento da criança e do jovem e para o aumento da sua responsabilidade, afetividade e preocupação de preservação da natureza. Contribui também para a redução do stresse e para o desenvolvimento da autoestima e das competências sociais, sem contar que a criança pode assim adquirir um amigo confidente e um ser relativamente ao qual tem responsabilidades inadiáveis.

É rara a criança que, a determinada altura, não pergunta aos pais «Posso ter um cão?» ou «Podemos ter um gato?». No meio urbano, a resposta passa por tartarugas, hamsters, canários e pouco mais, embora o número de animais tenha vindo a aumentar. No entanto, dado o risco de ocorrência de traumatismos, ferimentos e lesões acidentais, há que tomar algumas precauções, desde a escolha do animal até ao modo como a criança aprende a lidar com ele.

Evitar situações de risco

O contacto com animais deve ser ponderado e, acima de tudo, pensado para evitar situações de risco, designadamente em relação a animais desconhecidos ou com mau feitio (agressivos e imprevisíveis) e em situações em que o animal não gosta de ser incomodado (quando, por exemplo, está a comer ou está com as crias). Os cães, por exemplo, podem causar acidentes mesmo sem serem agressivos, quando brincam e empurram as crianças que ainda pouco conseguem equilibrar-se.

É necessário algum cuidado quando o animal tem crias, quando é um cão de guarda ou não conhece a criança. É também sabido que algumas raças de cães são mais agressivas do que outras podendo morder, empurrar ou pisar. Um doberman, por exemplo, é seguramente mais violento e desconfiado do que um cocker spaniel ou até do que um vulgar rafeiro.

Por seu lado, os gatos podem ter períodos de especiais ciúmes e atacar as crianças, sendo menos fiáveis e mais imprevisíveis do que os cães, podendo causar feridas por arranhadelas mas também mordem. Saiba também quais são as doenças mais comuns dos cães que também podem afetar humanos e faça o teste que lhe permite apurar qual é o melhor animal de estimação para si!

Respeitar o animal

Mostrar domínio e incitar os animais são alguns sinais de poder para muitas crianças, seguras de que o animal não lhes virá cobrar a afronta. Só que, por vezes, não é bem assim e esse desafio é altamente desaconselhado. E os animais não esquecem e podem mesmo, noutro contexto, resolver desforrar-se dos insultos e dos gozos que as crianças lhes fizeram. Gozar com um animal ou maltratá-lo, especialmente com certas raças, pode acabar mal e deixar marcas para a vida.

O perigo do movimento

Se uma criança, a andar de bicicleta, trotineta ou skate, for perseguida por um cão, deverá parar o movimento. Continuá-lo só vai excitar o cão, que irá buscar aos seus genes de caçador a vontade de perseguir a presa. O próprio ladrar do cão excita-o ainda mais. A criança deve ser ensinada a parar, tentar colocar a bicicleta ou o outro utensílio entre ela e o cão e ficar imóvel, sem dizer nada, mesmo que o animal se aproxime e tente cheirar.

É quase garantido que irá embora e, mal desapareça de vista, a criança poderá retomar a sua atividade, como também refere o livro «Crescer seguro», de Mário Cordeiro, médico pediatra, publicado pela editora Glaciar. Há vários cuidados que reduzem a hipótese de acidentes com cães e gatos:

- No caso do animal ser conhecido

Deixar em paz o animal que está a comer ou a dormir é uma das recomendações. Também não deve tocar em fêmeas que têm crias, mesmo que, no dia a dia, sejam meigas e mansas. Não gozar ou insultar um cão é outra das advertências, uma vez que ele não se esquecerá da afronta.

- Ao ser abordado por um animal desconhecido

Não fazer festinhas em animais desconhecidos, mesmo que sejam pequeninos ou pareçam mansos, sem antes perguntar ao dono se é possível fazê-lo, é uma regra fundamental, assim como se deve evitar o contacto direto olhos nos olhos. Aproximar-se do animal pelo lado e não pela frente ou por trás é outro dos conselhos.

Evitar movimentos bruscos mas manter o animal debaixo de olho é outra das recomendações. No caso de um cão quiser cheirar, dar as costas das mãos com movimentos vagarosos e só depois fazer uma festinha debaixo da zona do queixo ou na parte de lado do peito.

Não dar palmadinhas no cimo da cabeça ou na zona dos ombros do cão e não mostrar a palma da mão aberta, porque esse gesto pode ser sentido como agressivo, são outros dos cuidados a ter. Se o cão atacar, deve tentar dar-lhe algo para ele se entreter para ganhar tempo. A carteira, o casaco, a camisola ou até uma bicicleta, seja o que for, são opções plausíveis.

Veja na página seguinte: O que fazer no caso da criança ser mordida ou arranhada

Como fortalecer a realação entre a criança e o animal

Quando nasce um bebé e vem para casa, deve ser apresentado ao animal, que o irá cheirar para passar a reconhecer como seu amigo. Este momento não deve ser excluído nem feito à pressa. Não é isso que vai provocar doenças no bebé. Deve ensinar-se a criança a respeitar os animais, pois mesmo o cão da casa pode enfurecer-se se estiver em situações vulneráveis em que o instinto fala mais alto, como quando tem crias ou está a comer ou a dormir.

Convém ensinar a dar mimo aos animais, o que reforçará os laços de afeto. A criança deve ajudar no processo de ensino do animal, para que estes passem a respeitá-la como dona. Para isso é também necessário que os animais sintam que a criança se interessa por eles, lhes dá de comer, os leva à rua e por aí fora. Ensine também a criança a nunca atazanar um cão ou um gato pois isso causa irritação e desconfiança por parte do animal.

O que fazer no caso da criança ser mordida ou arranhada

É na face que as crianças são mais frequentemente mordidas, devido ao tamanho das crianças e à proximidade entre a face e a boca do cão, podendo infetar e deixando com frequência sequelas permanentes. Nunca menospreze um incidente. Para lá das possíveis sequelas devido ao ocorrido (medo futuro e/ou stresse pós-traumático), há o risco de as feridas infetarem, embora, curiosamente, menor do que com as dentadas humanas, devido às bactérias das unhas e da boca dos animais.

Estas são as formas de procedimento mais corretas em caso de mordedura:

- Desinfete com antissético

Se a ferida não for grande ou profunda, faça a sua desinfeção depois de lavada com água e sabão.

- Verifique o estado da ferida

Se nos dias seguintes ficar muito encarnada ou com pus é sinal de que está a infetar e a criança deve ser vista por um médico.

- Saiba se o animal está vacinado

Tente saber se o cão ou o gato em causa estão vacinados, designadamente para a raiva.

O que fazer para entender a linguagem canina

Se o cão abanar a cauda, é porque está contente. Por outro lado, se está maçado e quer estar sossegado, levanta os lábios (arreganha), rosna, começa a andar vagarosamente para trás, levanta o pêlo das costas. 20 é o número de casos diários de traumatismos, ferimentos e lesões acidentais provocados por animais e que dão entrada num serviço de urgência. O cão é o animal que mais provoca lesões, sendo responsável por cerca de metade das registadas anualmente.

Texto: Carlos Eugénio Augusto com colaboração e revisão de Mário Cordeiro (médico pediatra)