Acompanho os meticulosos  movimentos com o pasmo de quem  esperava que ele abrisse o vidro e a fizesse voar pela janela… afinal estavamos na autoestrada e as pastilhas são, provavelmente, biodegradáveis.

Ele apercebe-se do meu espanto trocista.

- O que foi?

- Nada. Achei piada à forma como não atiraste a pastilha pela janela do carro. – Respondi.

- Não posso!...- Respondeu ele com uma convicção conformada. Comecei a rir. Qual seria, desta vez, a teoria do meu irmão?

- Mas não podes porquê, Miguel?

- A Ilda diz que os passarinhos pensam que é comida e ficam com a pastilha presa no bico… depois não podem comer e morrem,  coitadinhos…. –

Nesse momento as minhas gargalhadas invadiram o carro. Não sei se achei mais graça à explicação dos fundamentos daquela atitude, se ao ar piedoso que colocou ao descrever o triste fado dos pobres animaizinhos.

- Não gozes, pá! Não me digas que atiras as tuas pastilhas pela janela do carro! –

Não lhe respondi. Mas nos últimos meses, sempre que tenho uma pastilha para deitar fora, lembro-me com carinho, do coração gentil deste meu irmão tão lindo… e de como, por amor à minha cunhada ( e aos pobres passarinhos, claro), ele guarda as pastilhas no carro, para as colocar, depois, no lixo.

  Ana Amorim Dias