Estão quatro mulheres num salão de cabeleireiro.
Uma fala sobre as últimas gracinhas do filho. Outra tenta negociar os centímetros de cabelo a
cortar.

A terceira aproveita para relaxar e a quarta reclama por nunca mais chegar a sua vez. O cenário é ficcionado, mas as personagens são bem reais.
Patrick, cabeleireiro, e Olivier, colorista, conhecem-nas bem e aceitaram falar sobre elas.

A FALADORA
Como a descrevem

«Não vem tanto ao salão para cuidar do cabelo, vem mesmo para falar. Para contar a única versão que vamos ouvir».

Como reagem
«Quando a pessoa vem para se confessar, ouço mas acho que não me compete dizer nada. Se o tema for muito íntimo ou constrangedor procuro desviar a conversa e nunca faço perguntas de ordem pessoal. O meu trabalho continua a ser o de cortar, secar, enfim, embelezar.»

Uma história
«Penteei a legítima mulher, a namorada e ambas foram trocadas por uma terceira pessoa com a qual o senhor casou. Partilharam o mesmo homem durante mais de vinte anos, mas não se conheciam entre elas.»

A INSEGURA
Como a descrevem

«A cliente insegura é uma mulher extremamente clássica, que utiliza argumentos como 'os meus filhos não gostam, o meu marido pediu-me muito para não cortar', ou seja o problema nunca é dela, mas no fundo tem medo de mudar. Há também aquela mulher que no dia-a-dia toma decisões gigantescas, mas cortar meio centímetro de cabelo é um caso sério. É alguém que tem uma ligação muito forte com a sua imagem e faz parte do seu bem-estar não mudar».

Visual
«Este tipo de cliente não é muito gratificante. Já vem com um penteado definido, que normalmente não tem interesse nenhum. É um cabelo com tendência a não ter forma nenhuma, nem curto nem comprido, nem pintado, nem com madeixas...»

Como reagem
«Tento sempre aconselhar para que mude nem que seja um bocadinho e pode ser muito gratificante se ela diz 'estou farta de mim, já não posso mais, quero mudar de visual', mas isso é raro acontecer.»

A QUE NÃO FALA
Como a descrevem

«É uma cliente que vem ao salão por ser um lugar sossegado em que aproveita precisamente para entregar” o cabelo, as mãos, os pés
e relaxar. Tem uma vida super activa ou, por outro lado, não trabalha, mas gosta destes momentos mais relaxados».

Experiência pessoal
«Tenho clientes que conheço há três, quatro anos e não sei se são casadas, se têm filhos, se trabalham ou se não trabalham porque não temos esse tipo de conversa. Podemos até falar de outros assuntos ligados ao cabelo, à pele, às tendências de moda, mas não puxo muito pelo
lado pessoal».

O que fazem
«Penso que o próprio ambiente do salão ajuda as minhas clientes a relaxar. Depois acho que todos nós temos sensibilidade para ver se a cliente está a querer puxar conversa ou não. A própria atitude dela, a forma de se sentar e de estar revela isso».

Veja na página seguinte: A eterna insatisfeita

A ETERNA INSATISFEITA
Como a descrevem

«É a cliente que está sempre a reclamar. Tanto reclama no salão de cabeleireiro como no restaurante ou na papelaria. É algo que faz parte da sua personalidade».

Como lidam com ela
«É preciso saber dar a devida importância
à queixa. Se houver um problema sério então há que levá-la a sério, caso contrário convém não sobrevalorizar».

«A partir do momento em que lidamos com o público, estamos sujeitos a trabalhar com pessoas e personalidades diferentes e há que ter jogo de cintura e muita paciência».

Experiência pessoal
«Tenho uma cliente há três anos que está sempre a reclamar: porque a água do chá está fria, o champô não é bom, esperou dois minutos... Ou seja, a vida dela é uma reclamação, mas é muito engraçada
e divertida e gosto muito dela».

O que aconselham
«Pode acontecer a cliente não ficar 100 por cento satisfeita e, nesse caso, é importante falar caso se pretenda criar uma relação de confiança. Quanto mais conhecemos a cliente e o seu cabelo mais aptos
estaremos a oferecer um serviço melhor».

Texto: Vanda Oliveira com Olivier (colorista) e Patrick (cabeleireiro)