«É preciso aprendermos a desligar as tecnologias para tirarmos partido do seu potencial». Quem o defende é Nicolas Carr, autor do livor «Os superficiais - O que a internet está a fazer ao nosso cérebro», celebrizado pela nomeação para um prémio Pulitzer em 2011.

Segundo o autor, «há cada vez mais evidências científicas de que a internet nos está a tornar pensadores mais dispersos e superficiais», assegura.

Numa sociedade que funciona em rede, os potenciais riscos da tecnologia convivem com soluções inovadoras que se propõem melhorar a qualidade de vida.

A síndrome da saturação

Na década de 1970, o investigador Alvin Toffler cunhou a expressão «sobrecarga de informação», a primeira a referir-se aos efeitos prejudiciais do aumento vertiginoso do volume de informação com que lidamos diariamente. «Cada pessoa, conforme a sua estrutura cerebral e psicológica, tem um limite relativamente à quantidade, velocidade e intensidade de informação que é capaz de processar», explicou à Prevenir Nelson S. Lima, diretor do Instituto da Inteligência, que dá formação na área da neuropsicologia.

Ultrapassado esse limite, podem manifestar-se sintomas como «dificuldade de concentração, memorização e recordação, fadiga, perda de reflexos, insónias, ansiedade, stress e problemas psicossomáticos», aquilo a que o psicólogo britânico David Lewis chamou «síndrome de fadiga da informação».

Tecnologia = prazer?

Ao grande volume de informação soma-se a sua omnipresença, patente na necessidade de estarmos sempre ligados. «Os seres humanos desejam informação da mesma forma que desejam sexo», afirma Nicolas Carr, referindo-se a estudos que revelam que «receber ou encontrar uma informação provoca a libertação de dopamina», um neurotransmissor associado à sensação de prazer.

Segundo a neurologista Teresa Paiva, «isso pode ser parcialmente verdade, mas depende do tipo de informação. Se for uma notícia negativa ou stressante, o cérebro não liberta dopamina, mas adrenalina». Por outro lado, «a noção de que têm que estar constantemente contactáveis é um fator de stress, as pessoas estão em constante desassossego, em estado de alerta».

Os efeitos do multitasking

Um monitor com dezenas de janelas abertas é o paradigma da tendência para alternamos constantemente entre tarefas. O multitasking «obriga a um desdobramento da atenção, reduzindo a capacidade de reação» e é «uma das causas mais frequentes de stress ocupacional e esgotamento», afirma Nelson S. Lima.

«Para realizar funções complexas do ponto de vista cognitivo e emocional, é preciso estar focado», concorda Teresa Paiva, em sintonia com a professora da Harvard Business School Teresa Amabile, que estudou os hábitos de trabalho de mais de 200 pessoas durante mais dez anos e concluiu que a criatividade tende a aumentar quando nos concentramos numa tarefa sem interrupções.

Falta de concentração e baixa produtividade

O esforço requerido para acompanhar um fluxo excessivo de
informação «provoca diminuição da concentração e fraca memorização das
matérias que interessa fixar», explica Nelson S. Lima. Para prevenir este problema, existe uma série de cuidados que deve ter:

- Identifique a tarefa mais importante a fazer e passe para outra
só quando terminar. Pessoas que realizam várias tarefas em paralelo
demoram muito mais e cometem mais erros do que as que completam as
mesmas tarefas em sequência.

- Não consulte constantemente o email, defina períodos específicos
para o fazer. Por exemplo, de hora a hora ou duas a três vezes por dia.

- Altere as definições do computador para não receber alertas de cada vez que recebe um email.

- Reserve cinco minutos para usar as redes sociais depois de um
período a trabalhar. Coloque um alarme para se recordar de que acabou o
tempo.

- Aceda às redes sociais através do telemóvel e levante-se
enquanto o faz. O facto de não estar confortável irá motivá-lo a ser mais eficiente para passar a outras tarefas.

Stress e ansiedade

«A saturação de informação aumenta os níveis de stress e ansiedade,
sobretudo se ela for relevante para nós», explica Nelson S. Lima. Pode
também haver «perda da capacidade de análise e do sentido crítico para
separar o importante do acessório». Segundo Teresa Paiva, neurologista, o
excesso de informação «chega a ter um efeito depressivo».

Para prevenir este problema, existe uma série de cuidados que deve ter:

- Se há algo que o preocupa, resolva esse assunto primeiro ou
escreva tudo o que o incomoda. Depois guarde a folha (ou feche o tablet)
e retome o que estava a fazer.

- Aprenda exercícios de meditação e relaxamento. Por exemplo, faça
exercícios de stopping, fechando os olhos durante alguns minutos ao
longo do dia.

- Pratique exercício físico, caminhando, pelo menos, 30 minutos por
dia. Além de baixar a tensão arterial, as endorfinas produzidas
encarregar-se-ão de a fazer sentir relaxada.

- Se é viciado em informação, considere a hipótese de ver ou
ouvir menos noticiários. «Está provado cientificamente que as pessoas
são muito mais sensíveis às notícias negativas do que às positivas»,
sublinha Teresa Paiva.

Fadiga

Esta é «a principal consequência do excesso de informação sobre os
nossos ritmos biológicos, nomeadamente o da vigília-sono», aponta Nelson S. Lima, já que «o cérebro é chamado a um esforço suplementar». O
problema agrava-se com «o uso excessivo de computadores, televisão ou
telemóvel no período noturno» que, segundo Teresa Paiva, «é extremamente
negativo para as funções cognitivas», já que «se houver privação de
sono, as pessoas ficam mais deprimidas, com problemas de memória e
dificuldades escolares ou no trabalho».

Para prevenir este problema, existe uma série de cuidados que deve ter e comportamentos que deve adotar:

- Estabeleça com a sua família e amigos que, a menos que se trate
de uma emergência, não devem contactá-lo a partir das 22 horas.

- Durante a noite, tenha o telemóvel no modo silencioso e deixe-o
num local que esteja fora do alcance do seu braço, para que o brilho não
prejudique o sono.

- Nos tempos livres, desligue-se da tecnologia. Está provado que o
contacto com a natureza conduz à libertação de endorfinas, promovendo o
bem-estar.

- Recorra aos avisos de ausência do email para informar que estará
incontactável entre determinadas horas. Se tiver que o consultar ao fim
de semana, resista ao impulso de responder a mensagens.

- Discipline-se no uso do telemóvel. Poupará energia mental e
usufruirá mais de cada tarefa se não falar enquanto faz compras, está no
ginásio ou conduz (além de diminuir o risco de acidente).

Vista cansada

O uso prolongado do computador, televisão, telemóvel e outros equipamentos «não causa danos permanentes nos olhos, mas pode
secá-los e cansá-los», esclarece a American Academy of Ophtalmology
(AAO). Além disso, «é útil não manter os olhos muito tempo focados à
mesma distância, sobretudo para o perto, para não sobrecarregar os
músculos que executam a focagem», explica o médico oftalmologista Luís
Gouveia Andrade.

Para prevenir este problema, existe uma série de cuidados que deve ter:

- «Ler obriga a um esforço prolongado de convergência muscular e reduz a frequência do pestanejar, o que provoca cansaço e
secura ocular», elucida Luís Gouveia Andrade. Deve, por isso, fazer
«intervalos para relaxar os músculos que focam para o perto», recomenda.
A cada 20 minutos, olhe para um objeto que esteja, no minimo, a seis
metros de distância, durante, pelo menos, 20 segundos.

- Geralmente, «usamos o computador em espaços fechados, com luz
artificial e ar condicionado, fatores que acentuam a tendência para os
nossos olhos secarem», alerta o especialista. Tenha na sua secretária
«algum tipo de lágrima artificial ou soro fisiológico para hidratar os
olhos, se causarem desconforto».

- Sente-se a cerca de 70 centímetros do ecrã e posicione-o de forma a dirigir o olhar ligeiramente para baixo.

- Ajuste o tipo de letra, cor, contraste, tamanho e velocidade do cursor.

- Afaste o monitor de luzes brilhantes e janelas e, se necessário, recorra a um filtro de brilho.

- Coloque um aviso no ecrã para não se esquecer de pestanejar.

- Se sentir ardor, comichão, sensação de picada ou irritação de forma persistente nos olhos, consulte o oftalmologista.

- Durma sete a oito horas por noite. «Quando se dorme menos do que o
necessário, os olhos podem ficar irritados. A irritação continuada pode
causar o inchaço e infeção, sobretudo se usa lentes de contacto», lê-se
no site oficial da AAO.

Postura incorreta

O uso prolongado do computador pode conduzir a problemas posturais e
articulares, como é o caso do síndrome do canal cárpico, que afeta a
mão e o punho. Para evitar este tipo de problemas, siga estes conselhos:

- Apoie totalmente as costas ao encosto e posicione os joelhos ao mesmo nível, ou mais abaixo das ancas.

- Coloque os cotovelos num ângulo de 100 a 110 graus, com os pulsos numa posição reta.

- Mantenha o rato e o teclado ao alcance da mão, de modo a não ter que esticar o braço para os usar.

- Ao teclar, mantenha os pulsos em posição reta e não aplique muita força. Use o apoio do teclado apenas ao descansar.

-
Não aperte muito o rato, não estenda os dedos sobre os botões e evite
movê-lo usando o polegar ou o pulso. O movimento deve ter origem no
ombro e cotovelo.

- Coloque os documentos entre o monitor e o teclado ou numa superfície elevada próxima do monitor.

Hipocondria digital

«Após pesquisar informações sobre saúde na internet, muitas pessoas
pensam sentir sintomas relacionados com doenças graves, tornando-se
hipocondríacos cibernéticos», explica o médico de medicina geral e
familiar, Pedro Ribeiro da Silva.

«O receio de terem uma doença grave, impele-os a procurarem mais informação sobre o assunto de forma obsessiva,
o que, em vez de os tranquilizar, os deixa mais ansiosos», acrescenta o profissional de saúde. «Determinado sintoma pode ser comum a dezenas de doenças, pelo que é
recomendado que pessoas preocupadas com a saúde procurem um médico, em
vez de tentarem fazer diagnósticos pela Internet», finaliza.

Texto: Rita Miguel com Luís Gouveia de Andrade (médico oftalmologista), Nelson S. Lima (neuropsicólogo e diretor do Instituto da Inteligência), Pedro Ribeira da Silva (médico de medicina geral e familiar na Divisão de Comunicação e Promoção da Saúde e da Direcção Geral da Saúde) e Teresa Paiva (neurologista do centro de Encefalografia e Neurofisiologia Clínica)