A Microcefalia é uma condição definida pelas muito reduzidas dimensões da cabeça do feto ou bebé, (cerca de 2 ou 3 desvios padrão abaixo das dimensões médias para crianças ou fetos do mesmo sexo e idade).
Causas
Não é uma entidade única, podendo ser visto como uma manifestação com muitas causas possíveis, nas quais está comprometido o normal crescimento e desenvolvimento cerebral.
O cérebro não cresce e não se desenvolve normalmente, e os ossos do crânio, que acompanham esse crescimento, também não crescem adequadamente. A origem da condição é primordialmente cerebral.
Pode ser isolada, ou associada a outras malformações, e as origens podem ser genéticas, ambientais, ou desconhecidas.
Como causa genéticas existem as cromossomopatias, que consistem em alterações numéricas ou estruturais dos cromossomas, (trissomia 21, trissomia 18, trissomia 13), ou mutações num único gene, de transmissão hereditária, que dão origem a síndromes genéticos (microcefalia primária, doenças metabólicas).
Como causas ambientais existem as infeções pré-natais (Rubéola, toxoplasmose, citomegalovírus, varicela), exposição a drogas ou fármacos durante a gravidez (álcool), exposição a radiações, má nutrição extrema.
Parece existir uma associação entre a infeção pré-natal pelo vírus Zika e o risco de desenvolvimento de microcefalia, (aumento significativo de casos descritos de microcefalia no nordeste do Brasil, após o surto de infeção pelo vírus Zika nessa região no início de 2015).
Diagnóstico
O diagnóstico por vezes não é fácil, já que pressupõe uma redução das dimensões cerebrais, particularmente do córtex, e alguns bebés apenas têm a cabeça pequena, sendo tudo o resto normal, e também porque é uma condição habitualmente progressiva, que só se estabelece definitivamente numa fase mais tardia da gravidez, (2º ou 3º trimestre).
É muito importante que a gravidez esteja corretamente datada, o que se faz mais rigorosamente por ecografia realizada no primeiro trimestre, de forma a não considerar pequena uma cabeça de um feto que tem de facto uma idade gestacional inferior.
Alguns aspetos ajudam no diagnóstico, como o aspeto da testa mais inclinada que o habitual, ou a existência de outras anomalias associadas no sistema nervoso central, como por exemplo dilatação ventricular.
O diagnóstico tem por base as medidas da cabeça do bebé, nomeadamente o perímetro cefálico, que se encontra muito abaixo da média dos valores esperados para a mesma idade gestacional.
Podem ser necessários exames adicionais, para confirmação e melhor caracterização da condição, como ecografia transfontanelar, ressonância magnética, TAC.
A avaliação da evolução do bebé nas consultas de desenvolvimento também permite estabelecer com mais precisão o diagnóstico e o prognóstico, (só 14% dos bebés com o diagnóstico de microcefalia ao fim do primeiro ano de idade foram detetados no parto ou antes do parto).
Prognóstico
É uma condição para a qual não existe cura, não existindo uma terapêutica específica para fazer a cabeça ficar de dimensões normais, (exceção para a craniossinostose, situação em que as suturas cranianas encerram prematuramente, sendo necessária uma intervenção cirúrgica para permitir que o cérebro cresça normalmente sem limitações).
A gravidade da condição depende do grau de microcefalia, sendo diretamente proporcional ao desvio em relação à média. Se as dimensões cranianas forem menores que 3 desvios padrão em relação à média, e particularmente se existirem anomalias associadas, o prognóstico torna-se bastante mais reservado.
Pode verificar-se um atraso no desenvolvimento, (aquisição da linguagem, marcha), dificuldades na coordenação ou equilíbrio, baixa estatura, hiperatividade, défice cognitivo (atraso mental), problemas de visão, audição, ou convulsões.
A evolução também vai estar dependente de intervenções precoces, (terapia da fala, fisioterapia, terapia ocupacional), que podem maximizar o desenvolvimento das capacidades intelectuais e físicas.
Pode ser necessário fazer medicação crónica para evitar convulsões.
Recorrência
O risco de a situação se voltar a manifestar numa gravidez subsequente tem de ser avaliado caso a caso, pois varia consoante a causa de base.
No caso das anomalias cromossómicas, o risco de recorrência é de 1% acima do risco basal para a idade.
No caso das mutações hereditárias, o risco pode ser de 50% ou de 25%, consoante seja uma condição de transmissão autossómica dominante ou recessiva, respetivamente.
No caso das anomalias estruturais dos cromossomas pode ser necessário estudar o cariotipo dos pais, já que podem ser portadores de translocações equilibradas, o que aumentaria o risco de recorrência.
No caso das causas ambientais, (infeciosas ou exposição a agentes teratogénicos), o risco de recorrência é mínimo.
Por João Manuel Mendes, Médico Especialista em Ginecologia-Obstetrícia no Hospital Lusíadas Lisboa
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