"O serviço de urgência de obstetrícia está a ser assegurado pelos médicos, porque não há nenhum enfermeiro especialista em saúde materna e obstetrícia a prestar cuidados diferenciados", disse Adriana Taborda, que integra o Movimento Enfermeiros Especialistas em Saúde Materna e Obstetrícia (EESMO). Este movimento recusa, a partir de hoje, a prestação de cuidados diferenciados em protesto contra o não pagamento desta especialidade.

Segundo Adriana Taborda, o bloco de partos do Hospital São Bernardo está a funcionar normalmente, uma vez que os dois enfermeiros especialistas de serviço, um deles a prolongar o turno da noite devido à falta de um/a colega, têm contrato de especialista e são pagos como tal. "Eu estou há nove anos a prestar cuidados diferenciados, mas recebo como enfermeira generalista, enquanto outros enfermeiros que se formaram depois e que já entraram com contrato de especialistas, auferem salários superiores, com uma diferença de, pelo menos, mais 200 euros", disse Adriana Taborda, salientando, no entanto, que esta diferenciação só se verifica no Hospital São Bernardo, em Setúbal.

"Nas outras unidades hospitalares, os enfermeiros especialistas em saúde materna e obstetrícia recebem todos como enfermeiros generalistas apesar de prestarem cuidados diferenciados", acrescentou.

Protesto em Gaia e Espinho

As grávidas de risco internadas no Centro Hospitalar Gaia/Espinho estão a ser acompanhadas hoje de manhã apenas pela enfermeira-chefe, que habitualmente não tem utentes atribuídas, devido ao protesto dos enfermeiros especialistas, foi hoje anunciado.

Joana Gonçalves, enfermeira daquela unidade do Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia/Espinho, afirmou aos jornalistas à porta do hospital que, “de toda a equipa de 41 enfermeiras, 23 estão na condição de ter especialidade [em saúde materna] mas de ter um contrato com o hospital como enfermeiros de cuidados gerais”. Em termos práticos, disse, é a “enfermeira-chefe, que habitualmente não tem utentes atribuídas”, que está, esta manhã, a assumir as grávidas de alto risco, porque, no primeiro turno do dia, a enfermeira destacada para aquele serviço recusou prestar aquele tipo de cuidados, apesar de ter a especialidade.

Essa profissional que se recusou a atender as grávidas de risco, adiantou, “foi já avisada que vai ser notificada” de uma eventual sanção disciplinar, acrescentou Joana Gonçalves. “As chefias vão notificar o elemento que não assumiu as grávidas de alto risco. A colega é generalista, tem a especialidade, mas comunicou que a partir de hoje não a vai assumir”, acrescentou.

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Questionada sobre quantas grávidas de risco estavam às 08:30 internadas naquela unidade, a enfermeira disse que o serviço dispõe de nove camas, estando três ocupadas, mas que havia mais duas grávidas de risco “para entrar” a qualquer momento. “Uma enfermeira de cuidados gerais não pode assumir” este serviço, disse, acrescentando que, naquele hospital, as 23 enfermeiras com especialidade, mas contratadas como generalistas, “vão deixar” de prestar cuidados específicos a partir de hoje.

Segundo a profissional, que exerce há 10 anos naquele hospital e é, há cinco, especialista em saúde materna, este protesto “não é nenhuma greve” e os enfermeiros nesta situação não estão a recusar estar no posto de trabalho, “simplesmente não vão assumir funções para as quais não foram contratados”. “Sou enfermeira, tenho orgulho em ser enfermeira, adoro ser parteira. Estamos há 10 anos, e eu há cinco, a exercer a nossa especialidade porque queremos, mas também porque fomos incentivadas a isso. Já chega! Estamos aqui para defender a nossa classe, a nossa carreira, e a lutar pelo que acreditamos, que é absolutamente justo e legítimo”, sustentou.

Joana Gonçalves adiantou ainda que em nenhum turno do mês estão quatro enfermeiros especialistas na escala de serviço, o que levará a que não sejam “cumpridas as dotações”.

Presente no local, Bruno Martins, representante da Ordem dos Enfermeiros, afirmou que os enfermeiros “têm de prestar os cuidados para os quais estão contratados”.

Sobre a possibilidade de os enfermeiros que recusarem prestar serviços de especialidade serem alvo de sanções, Bruno Martins reafirmou que “os enfermeiros apenas têm de se preocupar em responder aos cuidados de enfermagem para os quais foram contratados”.

Os enfermeiros especialistas recusam-se, a partir de hoje, a prestar cuidados diferenciados, como protesto contra o não pagamento desta especialização, devendo os blocos de parto ser a área mais visível desta contestação.

Segundo a Ordem dos Enfermeiros, que apoia os profissionais neste protesto, existem cerca de 2.000 enfermeiros que, apesar de serem especialistas, recebem como se prestassem serviços de enfermagem comum. Para dar voz a esta reivindicação, foi criado o movimento EESMO (Enfermeiros Especialistas em Saúde Materna e Obstetrícia), o qual organizou quarta-feira uma vigília frente à residência do primeiro-ministro.