A perturbação obsessivo-compulsiva define-se pela presença de um conjunto de pensamentos e imagens repetitivos que são muito invasivos e que a pessoa sente que não consegue controlar – os quais são designados por “obsessões”, e perante os quais as pessoas tentam responder com determinados comportamentos numa tentativa de atenuar o impacto emocional desses pensamentos intrusivos – os quais são denominados por “compulsões” ou “rituais”.

Para o diagnóstico, estes sintomas devem estar presentes durante um período superior a seis meses e com um impacto diário significativo nos diferentes domínios do funcionamento da pessoa – laboral (por exemplo, dificuldades de atenção e baixa produtividade), social (por exemplo, isolamento social pela sensação de incompreensão por terceiros) e familiar (por exemplo, conflitos e/ou perdas de relações pelo questionamento consecutivo do amor do outro).

Tendo em conta que esta perturbação pode integrar um conjunto diverso de medos, como é exemplo o medo do contágio, ao longo dos últimos anos, tem-se vindo a estudar um subtipo desta perturbação – Perturbação Obsessivo-compulsiva Relacional, destacando-se o trabalho do psicólogo Ran Littman, na Universidade de Jerusalém em Israel e do professor Guy Doron, na Universidade de Melbourne, na Austrália.

E em que consiste este subtipo de perturbação?

As pessoas com esta perturbação vivenciam dúvidas, preocupações e pensamentos repetitivos e obsessivos sobre as suas relações amorosas, especificamente sobre dois temas: as características da relação e as características do(a) companheiro(a).

Quanto ao primeiro tema, a pessoa é invadida por dúvidas constantes acerca da veracidade dos sentimentos do(a) companheiro(a) (“será que ele gosta mesmo de mim?”, “não seria mais amada por outra pessoa?”), sobre os próprios motivos que a fazem amar o(a) companheiro(a) (“será que estou realmente apaixonada?”, “será amor, conformismo ou medo da perda?”) e sobre a qualidade e bem-estar propiciado pela relação (“estarei realmente feliz?”, “como será que os outros se sentem nas suas relações?”).

No que remete para o segundo tema, a pessoa questiona-se repetidamente acerca das qualidades do companheiro ("Será que ele é suficientemente inteligente?”) e se o mesmo se encontra à altura do desafio da relação (“Ele é amoroso e cuidadoso, mas gostava que fosse mais atento a algumas coisas”).

E que compulsões ou rituais estão presentes nesta perturbação?

Como mencionado, com o intuito de atenuar os sentimentos de angústia, as pessoas tendem a reagir a estas dúvidas obsessivas com as mencionadas reações compulsivas, as quais podem ser de dois tipos:

  1. Recursos externos, tais como consultar repetidamente outras pessoas sobre a qualidade da relação (“achas que ele gosta mesmo de mim?”, “o que achas deste episódio com a minha namorada?”), procurar na internet formas de saber se está na relação certa.
  2. Recursos internos, como, por exemplo, supervisionar continuamente os sentimentos em relação ao parceiro, comparar as características do parceiro com outras pessoas.

Contudo, este tipo de rituais tende apenas a prolongar os sentimentos de angústia, dada a tendência a provocar mais dúvidas e novas perguntas associadas a cada uma das respostas a que a pessoa chega.

Mas, surge a questão: este tipo de pensamentos não é típico de qualquer pessoa que esteja numa relação? Todas as pessoas, inclusive numa relação considerada saudável, sentem dúvidas e preocupam-se com o futuro, particularmente em fases de transição significativas, como o casamento, mudança de casa ou o nascimento de filhos.

Acontece que nesta perturbação as dúvidas estendem-se ao longo do tempo e ainda apresentam outra especificidade, nomeadamente a intensidade do sofrimento provocado. Não é desencadeado meramente desconforto, mas angústia, tristeza, medo, os quais tendem a ser tão significativos que provocam prejuízo no dia-a-dia da pessoa, como dificuldades de atenção e concentração, instabilidade emocional ou baixa tolerância à frustração.

Outro fator diferenciador é a tendência das pessoas com esta perturbação a ter outro tipo de pensamentos disfuncionais, como uma necessidade de controlo elevada; o medo de sentir arrependimento ou sentimentos de culpa; crenças irrealistas sobre relações (por exemplo, ausência de conflitos) e uma maior dificuldade ao lidar com a incerteza.

Se ao ler este texto, se identifica com os sintomas, poderá beneficiar de ajuda psicológica. Em terapia, encontra um sítio seguro para quebrar o ciclo de pensamentos obsessivo-compulsivos, ao fomentar a capacidade de tolerar as emoções dolorosas que acompanham os pensamentos obsessivos; desenvolver processos de pensamentos alternativos, respondendo às questões de forma flexível e de maneira construtiva, libertando a carga emocional associada a essas questões.

As explicações são de Sofia Gabriel e Mauro Paulino da MIND | Instituto de Psicologia Clínica e Forense.