EM CALDA

Trata-se da mais simples das conservas de frutas: após cuidada limpeza e descaroçoamento, caso seja necessário, a fruta é sujeita a uma ligeira cozedura com uma pequena quantidade de açúcar e, proporcionalmente, tanta água quanta fruta, o que permite manter a calda. Lembro-me bem dos frascos herméticos de litro alinhados na despensa com brilhantes cerejas gigantes brancas, num molho doce delicioso que, mais tarde, já num prato, sorvíamos com enorme prazer, mastigando as tenras cerejas, sem mais nada...

A calda doce de frutas ou vegetais também pode ser criada com alguma bebida alcoólica, sendo para isso mais apropriadas as bebidas destiladas, tais como: aguardente, armagnac, vodka ou whisky. Sobremesas maravilhosas por si só, estas receitas funcionam lindamente como complementos de gelados ou sorvetes: imagine uma colherada de castanhas confitadas em armagnac sobre uma bola de gelado de baunilha de papantla, tão simplesmente e sem hora marcada, só porque lhe apetece...

 

COMPOTAS E CHUTNEY

É uma dúvida que geralmente confunde o consumidor, mas a distinção é simples: doces são todos estes preparados, se adoçados forem; compotas são os doces que pressupõem a fervura da fruta, em pedaços, com ou sem casca, numa calda de açúcar e por tempo limitado.

O açúcar não deverá ultrapassar o ponto de pasta e o sumo que é assim gerado, aliado ao facto de a fervura não levar muito tempo, fazem com que a fruta mantenha a sua identidade, em pedaços amaciados pelo processo de confecção.

Compotas fantásticas são as de dois frutos, em que a chave é a combinação. Amplamente conhecidas são as compotas de frutos vermelhos (morangos, framboesas, ameixas) ou negros (cassis, amoras, mirtilos), mas há quem as faça também com cascas de laranja bem cozinhadas na calda de açúcar e, de seguida, mergulhando-lhe pedaços de maçã.

Aliás, a criatividade é o limite. A comprová-lo, o mercado disponibiliza diversas marcas de genuínos criadores de compotas, que se revelam cada vez mais atrevidos nas sua combinações – compotas que mergulham na mesma calda frutas suaves e legumes, como pêssego e ruibarbo, complementadas por uma pitada de alguma especiaria, por exemplo gengibre. O “chutney” (“catni”, do indiano) é, no fundo, uma compota que conjuga frutas (manga, ameixa, figo...) com legumes (cebolas, pimentos...), condimentos (azeite, vinagre, sal) e especiarias (caril, mostarda, cominhos, pimentas...). A sua utilização mais frequente em pratos salgados, de carne, peixe ou vegetarianos, é a cabal demonstração das múltiplas possibilidades de se obterem ligações despreconceituadas.

 

MARMELADA

A marmelada só é possível de obter porque o açúcar atinge o chamado “ponto de estrada” (que se atinge a 110 graus) e, sobretudo, devido à consistência do tipo de fruta utilizado, com polpa e grânulos, frutos por natureza um pouco farinhentos, e que são basicamente o marmelo, a maçã, a pêra e a goiaba. Um mimo para adoçar a boca é o ladrilho, que no Minho é tradição antiga – uma marmelada com mais ponto ainda, seca ao sol em largos tabuleiros, sendo depois cortada em cubinhos que são então embrulhados em celofane, como se rebuçados fossem. Excelentes são as marmeladas em que se adiciona uma pequena quantidade de um outro fruto, por exemplo ameixa ou laranja. Pode ser uma extraordinária experiência de sobremesa associar uma generosa fatia de marmelada de marmelo e laranja a uma colher de natas azedas, devidamente acompanhada por um velho Jerez seco...

GELEIAS

As geleias têm como matéria-prima básica as cascas ou apenas o sumo de uma determinada fruta. Em Portugal, a fruta de mais corrente utilização é o marmelo, até por permitir a elaboração simultânea da marmelada e um total aproveitamento do fruto, usando-se para a geleia a respectiva casca, que se deixa ou não oxigenar (escurecendo-a pela exposição ao ar) para que fique mais ou menos colorida. O seu ponto final (consistência) deve variar de acordo com o gosto de cada um – pode ficar mais líquida, cozinhando-se menos tempo, ou mais consistente e caramelizada, fervendo-se mais. A conjugação de geleia e vinho na sua produção é excepcional – como é igualmente fantástica uma colher de geleia de Sauternes sobre uma tranche de “foie” ou uma geleia de Bordeaux sobre um assado de carne, ou ainda uma geleia de uva Malvasia fina de um Douro branco sobre um cordeiro estufado...

 

Revista Wine/Texto: Isabel Sottomayor: Fotos: IMATEXTO/IMTX