"Eclética", mas bastante seletiva e com vontade de fazer apenas aquilo que pode torná-la uma atriz ainda melhor, talvez seja esta a melhor descrição para Joana Ribeiro. Aos 31 anos é uma das estrelas portuguesas que, nos últimos anos, mais tem dado cartas a nível internacional, um salto na carreira que atingiu um novo patamar muito recentemente.

Depois de 'The Man Who Kill Don Quixote', 'Infinite' ou 'Glória', foi escolhida para dar vida a uma personagem portuguesa na série alemã ‘Das Boot: O Submarino'. Um projeto especial onde teve oportunidade de contracenar ao lado de grandes nomes internacionais, tais como Tom Wlaschiha, de 'Game of Thrones'.

‘Das Boot: O Submarino' é uma produção europeia de renome, uma criação de Johannes Betz e Tony Saint que já recebeu mais de uma dezena de prémios. A sequência do icónico filme de Wolfgang Petersen, de 1981, referente à Segunda Guerra Mundial, passa na terceira temporada por Lisboa.. e traz-nos Joana Ribeiro. A estreia no canal AMC aconteceu na passada quinta-feira, 15 de junho, e serviu de mote para uma conversa entre a atriz portuguesa e o Fama ao Minuto. Uma série da qual era fã, quando soube que era uma personagem portuguesa, disse: 'Tenho de fazer isto'

De que forma recebeu o convite ou a notícia de que ia fazer parte da terceira temporada da série 'Das Boot: O Submarino'?

Houve uma self-tape e depois um casting, que fiz na altura que estava em Berlim por causa do European Shooting Stars [uma iniciativa da European Film Promotion para dar visibilidade ao cinema europeu] e houve um dia em que viajei para Munique para fazer o casting com os realizadores e com o Tom Wlaschiha, o ator com quem ia ter de contracenar mais. No final do dia eles disseram algo do género, 'vê lá se não tens nada marcado para daqui a umas semanas'. Respondi que não, mas parto sempre do princípio que dizem isto a toda a gente para serem simpáticos. Depois, uns dias mais tarde, estava ainda em Berlim quando soube que tinha ficado e fiquei muito contente. A experiência do Shooting Stars por si já foi incrível, durante este tempo ter ficado com um projeto numa série alemã, uma série da qual era fã, quando soube que era uma personagem portuguesa, disse: 'tenho de fazer isto'. Adoro séries alemãs, adoro cinema alemão, então, para mim, foi mesmo uma notícia boa.

Há um peso e uma responsabilidade maior por tratar-se de uma série internacional, muito conhecida e, inclusive, que já foi premiada?

Sim e não. O peso para mim era representar bem Portugal nesta que é uma série que tem tantas influências diferentes, França, Alemanha e Estados Unidos. Queria que Portugal estivesse bem representado e sinto que os autores da série perceberam muito bem o que Portugal era naquela altura, sempre houve essa defesa de mostrar o Portugal que passava para as pessoas que tinham dinheiro e que vinham para cá para se protegem e fugirem à guerra e o Portugal das pessoas que vivam cá, que estavam a passar fome e que estavam no meio desta guerra da qual não faziam parte mas, ao mesmo tempo, faziam devido à guerra interna causada pela ditadura. Para mim a maior responsabilidade foi a vontade de querer ser justa e correta com o meu país e com a representação de Portugal e de uma mulher portuguesa nesta altura.

Nunca me senti em perigo, nunca senti que estava a fazer algo que não devia

Já percebemos que dará vida a uma mulher portuguesa, mas que mais nos pode contar sobre esta personagem?

A Inês é uma rapariga que trabalha num casino, ao início não percebemos muito bem o que ela faz e o que é. É uma personagem de certa forma misteriosa e que tem muito a perder. Não quero estar a fazer spoilers, mas é uma mulher portuguesa à frente do seu tempo, uma mulher que, à sua maneira, e com as armas que tem, luta contra a ditadura e contra o regime. Vai encontrando aliados, uns menos expectáveis que outros, tem algo que lhe é muito querido em perigo e ela vai fazer tudo para conseguir salvar esta pessoa.

Que desafios lhe trouxe este projeto e esta personagem em particular enquanto atriz?

Este foi um dos primeiros projetos que fiz durante a pandemia. Fiz a série 'Glória', depois fui para Praga filmar a primeira parte da série e em fevereiro/ março de 2021 estive em Malta. Durante este período era tudo incerto, ninguém sabia muito bem como gerir, mas, ao mesmo tempo, a produção foi incrível e estávamos numa bolha de segurança. Nunca me senti em perigo, nunca senti que estava a fazer algo que não devia. Foi sempre tudo super cuidadoso, senti-me sempre apoiada, tanto pelos realizadores como pelo elenco. Tinha o Marco d'Almeida lá comigo, meu colega português, o Tom Wlaschiha, com quem tive mais cenas, é um ator incrível, super generoso. A maior dificuldade talvez tenha sido tentar ser justa face àquela época em questão. Tentei muito ver se encontrava projetos, séries, filmes sobre aquela altura e quando filmei não havia assim muitos, tentei depois também dar o meu cunho pessoal à personagem e criá-la com os realizadores e com a equipa.

Foi incrível, foi uma das melhores experiências que tive

Fazer parte de uma série de época representa um desafio acrescido?

Sim, pelo facto de não existirem assim tantas referências. Em Inglaterra ou na Alemanha há imensas referências à forma como as pessoas eram na Segunda Guerra Mundial, há imensas séries e filmes, em Portugal isso não acontece. Também se deve à nossa não indústria e à falta de financiamento para projetos portugueses. Espero que isso mude, acredito que tem vindo a mudar e tem muito a ver com isso. Nós procuramos sempre um registo, li bastante sobre a Segunda Guerra Mundial, falei com o meu avô e vi o que consegui. Foi mais essa procura de adaptação e de criação de uma personagem com a pouca informação que tinha.

Como correram as gravações, a experiência foi positiva?

Foi super positivo, foi incrível, foi uma das melhores experiências que tive. A equipa era espetacular, os episódios eram incríveis. Eu já gostava muito da série, estava super bem escrita, senti-me super bem defendida e aprendi muito. Gosto imenso dessa parte do nosso trabalho de preparação e de busca e foi ótimo para mim poder fazê-lo.

E a integração no elenco, foi fácil?

Isso foi a parte mais fácil. Estávamos no meio de uma pandemia, todos fechados num hotel durante um mês, portanto não foi muito difícil. Conhecia o Marco D'Almeida e já me dava bem com ele, sempre fui fã, e os outros atores fui conhecendo nos ensaios, nas filmagens, depois estávamos todos no mesmo hotel, jantávamos, não havia restaurantes para ir jantar fora. Mandávamos vir comida ou íamos buscar e íamos para um dos quartos jantar, e era a nossa maneira de tentar tornar normal uma situação que não era. Mas acho que tirámos o melhor partido da situação que tínhamos.

Seria incapaz de fazer um projeto internacional se o projeto não fosse bom, mesmo que ganhasse muito dinheiro

A personagem interpretada pela Joana fará parte apenas desta terceira temporada de 'Das Boot'?

Sim, acho que sim. Para já é o que sei...

Já fez parte de várias produções nacionais e outras tantas internacionais, o que me leva a perguntar-lhe: ainda existe uma grande diferença entre o que é feito em Portugal e lá fora?

Há, principalmente a nível de financiamento. É uma grande diferença, nem dá para comparar. Em Portugal, as equipas são muito mais pequenas, toda a gente faz um bocadinho de tudo, há uma maior comunhão, toda a gente se conhece, numa produção internacional há muito mais gente, há pessoas com quem nem sequer me cruzo, cada ator tem a sua maquilhadora, cabeleireira, figurinista, é como se fôssemos várias ilhas que depois se juntam, enquanto numa produção nacional fazemos todos parte da mesma ilha e é muito mais próximo.

Lá está, há coisas boas e há coisas más. É ótimo quando estamos a fazer uma produção internacional ter um espaço onde podemos ir descansar e trabalhar o texto, em Portugal não existe isso. Os atores acabam por socializar na sala de maquilhagem ou num algum local perto, o que acaba por fazer com que as pessoas se deem mais. Portanto, há coisas boas e coisas más, mas depende da produção, depende das pessoas, mas que é muito diferente é. Sinto uma grande diferença.

Continuar a dar cartas a nível internacional é a grande aposta e o foco principal da Joana?

A minha grande aposta e o meu foco é fazer bons projetos, quero muito fazer bons projetos em Portugal e tenho feito. Vou hoje apanhar um voo para Angola para ir filmar um projeto português, quando voltar tenho outro projeto português, quero muito continuar a trabalhar em Portugal e quero muito fazer parte desta nova geração de atores e realizadores, e de novos projetos portugueses. Quero muito fazer parte da cultura portuguesa e, ao mesmo tempo, trabalhar fora também me permite conhecer outras realidades, conhecer outras pessoas, trabalhar mais porque há mais projetos e mais possibilidades.

Infelizmente, em Portugal como não há muito financiamento acaba por haver menos projetos e nós somos muitos e muito bons, portanto, é normal um ator não ter muitos projetos por ano. Sinto que este jogo entre trabalhar fora e trabalhar em Portugal, até agora, tem sido o que funciona melhor para mim e o que quero continuar a fazer.

Não seria capaz de mudar de país e de ir viver para outro sítio, adoro Portugal, adoro o nosso cinema e quero muito continuar a fazê-lo... Mas faço pelo projeto. Seria incapaz de fazer um projeto internacional se o projeto não fosse bom, mesmo que ganhasse muito dinheiro, em detrimento de um projeto muito bom português. Não é mesmo pelo dinheiro, é pela qualidade e pelo projeto em si.

Além desta série, que outros projetos tem reservados para este ano?

Este ano vai estrear a 'A Sibila', do Eduardo Brito, que filmámos o ano passado, uma adaptação do livro de Agustina Bessa-Luís. Vou agora filmar os 'Papéis do Inglês', a partir do romance de Eduardo Carvalho, e depois vou filmar 'Sonhar com Leões'. Muitos projetos portugueses, o que é bom, e internacionais fiz este ano a série 'The Veil' [encomendada pela FX e transmitida na plataforma de streaming Hulu]. Filmámos na Turquia, vai estrear no próximo ano, com a Elisabeth Moss, uma série também muito interessante. Sou bastante eclética em tudo, incluindo no trabalho.

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