A acetona é utilizada na fabricação de uma grande variedade de produtos, como adesivos, antibióticos, componentes eletrónicos, solventes e removedores, tintas de impressão e vitaminas, entre outros. O seu processo de produção, no entanto, é elaborado e perigoso. Para simplificá-lo, torná-lo mais seguro e diminuir custos, um grupo de investigadores do Brasil e da Alemanha desenvolveu um método inédito, que utiliza apenas luz e um composto químico barato: o cloreto de ferro (FeCl3).

Os resultados da investigação, financiada pela FAPESP, foram publicados no jornal ACS Catalysis.

Conhecido como Hock ou cumeno, o processo padrão de fabricação de acetona envolve diversas etapas: primeiramente, o propano – subproduto do petróleo – é transformado em propileno, um gás extremamente inflamável que reage com o benzeno e, em seguida, com o oxigénio a altas temperaturas e pressões para dar origem à acetona. Essas reações também geram um composto denominado fenol – que tem uma procura menor e gera custos para ser transformado em substâncias de maior valor.

O método alternativo, proposto por cientistas das universidades Federal de São Carlos (UFSCar), Federal de Minas Gerais (UFMG) e do Max Planck Institute of Colloids and Interfaces (Alemanha), baseia-se na oxidação do propano usando cloreto de ferro como catalisador homogéneo na presença de luz (reação fotocatalítica).

“Descobrimos que, ao ser irradiado com determinados comprimentos de onda, o cloreto de ferro gera o radical cloro, que é extremamente oxidante e faz a ativação da ligação CH, ou seja, quebra a ligação entre carbono e hidrogénio, dando origem a um radical que, na presença de oxigénio, leva à formação de acetona”, explica Ivo Freitas Teixeira, professor do Departamento de Química da UFSCar e coordenador do estudo. “Realizámos uma reação muito importante de maneira absolutamente diferente e utilizando elementos muito simples.”

A comprovação de que a reação foi realmente conduzida por radicais de cloro gerados pela fotólise da ligação Fe-Cl foi feita por meio de estudos mecanísticos, incluindo análises de espectrometria de massa (que permitem identificar os componentes de uma mistura com base no peso molecular de cada elemento).

Entre as vantagens do novo processo estão o facto de ele ser direto (não há produção de propileno em etapas intermediárias) e mais seguro, pois não envolve reações de oxigénio em altas pressões e temperaturas nem intermediários inflamáveis e perigosos. Além disso, reduz o gasto de energia e o custo, pois possui menos etapas e ocorre à temperatura ambiente de 25 °C.

Apesar de as experiências terem utilizado uma fonte de luz do tipo LED, a ideia é que, no futuro, ela possa ser substituída por luz solar, tornando o método ainda mais sustentável.

Depósito de patente e próximos passos

Com a patente já depositada no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), a ideia agora é encontrar parcerias com empresas para financiar o escalonamento do novo processo para nível comercial.

“Esse método pode se tornar absolutamente disruptivo para a produção de acetona na indústria química, tornando o processo mais seguro e sustentável e viabilizando uma rota para a produção unicamente de acetona, o que reduziria custos e traria competitividade”, diz Teixeira.

De acordo com o pesquisador, o principal desafio, nesse caso, deve-se ao facto de que, na indústria petroquímica, os processos acontecem em grande escala e atualmente não existe nenhum método comercial fotocatalítico.

O projeto de pesquisa também evolui em duas direções: ao mesmo tempo em que testam o novo método com outras substâncias, como metano, os pesquisadores agora já pensam, também, em maneiras de escalonar o processo e adaptá-lo à indústria para que se consiga produção e aproveitamento maiores.

O artigo Direct Synthesis of Acetone by Aerobic Propane Oxidation Promoted by Photoactive Iron(III) Chloride under Mild Conditions pode ser lido em: https://pubs.acs.org/doi/full/10.1021/acscatal.3c02092.