Fornecer comida e brincar à bola ajudam a criar laços fortes entre cão e dono. Mas uma análise abrangente dos genomas destes animais e experiências que envolveram centenas de cães revelaram algumas variantes genéticas claramente ligadas ao facto dos caninos serem amigáveis com os seres humanos.

Ao que parece esses genes são os mesmos que ajudam a regular a sociabilidade nos humanos e que estão implicados em problemas neurológicos como o autismo o ou Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH).

"As nossas descobertas sugerem que pode haver uma base genética subjacente comum para o comportamento social em cães e humanos", disse à AFP Pers Jensen, autor do estudo e professor de Etologia na Universidade de Linkoping, na Suécia.

Os primeiros cães domesticados – há cerca de 15 mil anos atrás - provavelmente eram lobos que se acostumaram à presença de seres humanos no seu habitat, concordam a maioria dos especialistas.

Desde então, o melhor amigo do homem tem continuado a evoluir, um processo provavelmente influenciado pela nossa coabitação e proximidade.

De fato, os cães divergem dos lobos pelo facto de terem desenvolvido uma tendência inata de procurar o companheirismo dos humanos, mostraram pesquisas anteriores.

Várias experiências compararam o comportamento de cães e de lobos bebés criados como animais de estimação de famílias. Os bebés dos lobo foram retirados à mãe por volta das oito semanas de vida.

Já adultos, quando confrontados - na presença de seres humanos - com tarefas que não podiam resolver sozinhos, os cães e os lobos socializados comportaram-se de forma bastante diferente.

"Em geral, os cães tinham uma forte tendência a solicitar a ajuda humana, ao passo que os lobos", mesmo aqueles criados como animais de estimação, "não o faziam", relatou Jensen.

Jensen e seus colegas realizaram um teste semelhante com mais de 400 beagles nascidos e criados num canil que reproduzia animais para testes de laboratório.

Todos os animais tinham chegado à maturidade sob as mesmas condições e com o mesmo nível de contacto humano.

Nas experiências, cada beagle tentou levantar as tampas de plástico de três tigelas, a fim de obter um alimento que estava lá dentro. As duas primeiras tampas foram fáceis de abrir, mas a terceira era impossível ser retirada.

Os investigadores registaram as reações dos cães, especialmente em que medida é que se voltaram para alguma pessoa presente na sala, como se procurassem ajuda.

O próximo passo foi examinar o código de DNA do genoma de cada cão para procurar correspondências entre o seu comportamento durante a experiência e as variantes genéticas específicas, ou mutações.

Jensen e a sua equipa descobriram cinco genes que se correlacionaram fortemente com os cães mais propensos a procurar ajuda humana - os mesmos genes relacionados com a sociabilidade em seres humanos. Os dois genes que mais se destacaram são conhecidos como SEZ6L e ARVCF.

Ainda não está claro exatamente como é que esses genes influenciam o comportamento, ou se são simplesmente marcadores de algum outro processo ainda não detectado. Esta é uma questão muito difícil de desvendar, afirmam os pesquisadores.

Há um outro quebra-cabeças que no entanto pode ser resolvido: será que essas variantes genéticas evoluíram durante a domesticação dos cães ou sempre existiram?

Para descobrir, Jensen está agora a sequenciar os genomas dos lobos para ver se têm as mesmas variantes. Caso o resultado seja negativo, isso pode sugerir fortemente que esses "genes de sociabilidade" surgiram recentemente.

Mas também é possível, acrescentou o cientista, que os primeiros lobos que fizeram parte da comunidade dos seres humanos tivessem precisamente as mesmas mutações que fazem que alguns cães sejam mais propensos a procurar o carinho dos humanos.

"A minha intuição é que não há o mesmo tipo de variação genética na população de lobos", antecipou Jensen.