A Daniela transporta para este seu livro “As Viagens da Comida Saudável”, muita da experiência que traz como enfermeira na área da oncologia, professora de macrobiótica, viajante. Quer explicar-nos?

Este é um percurso que começa não com a macrobiótica, mas porque queria fazer mais pelos meus doentes. Decidi tirar o curso de Shiatsu no Instituto Português de Naturalogia. Isto por ser uma ferramenta não invasiva. Nunca apliquei estas práticas mas percebi que podemos ter uma alimentação diferente. Na época comecei a praticar ioga e o meu professor alertava-me para deixar de comer carne. Isto porque iria melhorar as posturas relacionadas com os exercícios. Fi-lo, mas ainda não tinha uma alimentação equilibrada. O caminho foi a macrobiótica e percebi que havia critérios para termos um prato equilibrado. Acabei por tirar o curso. Tudo passou a fazer sentido.

Como aparecem as viagens neste contexto?

Paralelamente sempre acalentei o sonho de viajar. Na minha perspetiva, a própria prática da macrobiótica está ligada ao ar livre, à natureza. Comecei, então, a visitar outros países e culturas com o meu marido, o Luís, que tem uma empresa, a Zen Family. Uma das primeiras viagens que fizemos foi a Marrocos. No Norte de África apaixonei-me pela cozinha. Como o Luís empreende estas saídas há muitos anos, tornou-se um elemento facilitador. Fora de portas somos recebidos como família. Depois do Brasil veio o Peru e ai deu-se o clique para o livro.

Como se dá esse clique?

Pensei. Porque não adaptar todas as receitas que fui compilando à realidade portuguesa, com os nossos produtos. Ou seja, ingredientes locais e, muito importante, sazonais. Curiosamente este caminho ligou-se à chancela Chá das Cinco (Saída de Emergência) e nasceu o livro “As Viagens da Comida Saudável”.

daniela ricardo
daniela ricardo

Um livro que, no fundo, nos traz a essência da sua cozinha. Como a define?

É uma cozinha consciente. Temos de aprender como se comportam os alimentos no nosso corpo. Isto para fazermos escolhas conscientes. Aprender a ler os rótulos, saber a origem. Calhando, pagar um pouco mais na fatura do supermercado, mas reduzir na conta da farmácia e do médico. Dou um exemplo: muitas pessoas preocupam-se com o consumo de vegetais, mas não com proveniência dos mesmos. Estes crescem de forma pouco saudável, sujeitos a pesticidas. O meu conselho passa por esquecer os vegetais sem aditivos químicos e optar pelos biológicos. Há ainda uma preocupação com o ambiente. Basta ver o custo associado ao transporte de alimentos entre regiões diferentes do mundo.

Fique a saber na próxima página quais os alimentos indispensáveis na nossa dieta diária

Quais são os alimentos indispensáveis na nossa dieta diária?

A base de alimentação para todos vivermos de forma saudável assenta nos cereais integrais, como fonte de hidratos de carbono, os vegetais como fonte de vitaminas e fibras e as leguminosas, como fonte de proteínas. Tudo o resto pode ser incluído. A quantidade e frequência é que terá de ser diferente daquela que praticamos atualmente.

Nesse sentido o livro é um alerta.

Sim, procurei estar atenta a todos estes aspetos quando visitei os países que incluo nesta obra. O país mais macrobiótico que conheci em viagem foi Marrocos. Consomem local e na época de crescimento do produto.

Viagens da Comida Saudável
Viagens da Comida Saudável

Para além da componente receitas o leitor vai encontrar mais neste livro. Certo?

Sim, encontra histórias das minhas viagens em termos de percurso turístico. E, claro, um pouco da gastronomia local. Não aquilo que encontramos nos livros, mas o resultado das minhas experiências com a população. Não podia deixar de incluir a adaptação das gastronomias citadas a uma cozinha mais saudável. O leitor vai encontrar muitas receitas dos diferentes países com adaptação aos produtos portugueses. Por exemplo, a culinária indiana recorre muito ao caju e amendoim. Por serem escassos em Portugal, substituo estes ingredientes pelas nozes, castanhas e amêndoas. Estes, alimentos produzidos no nosso país.

Ou seja, todas elas receitas que facilmente replicamos aqui em Portugal? Foi um processo complicado esta adaptação?

Não. Quando temos paixão pela cozinha, sabemos como os alimentos se comportam. Ainda no estrangeiro, durante as viagens, já estava a ver como iria fazer as adaptações. Depois quando cheguei a Portugal testei os pratos em refeições que partilhei com amigos, família, conhecidos.

Acha que este pode ser entendido como um livro de dietas?

Não. É um livro de estilo de vida. Estamos perante receitas diferentes, mas conscientes, que se podem consumir no dia-a-dia. Já me perguntaram: “do seu livro que receitas acha que são boas para estar em forma no verão?”. Respondi: “todas e nenhuma”. Devemos seguir um regime alimentar saudável todo o ano.

Que ingredientes mais a inspiram?

É difícil responder, pois todos os alimentos me inspiram. Sabe, todos os alimentos são muito especiais. Todos têm qualidades diferentes. Uma das coisas que mais gosto é de ir a uma feira de produtos biológicos e ver o potencial que ali está em termos de preparações culinárias. Esquecemo-nos que muitas vezes a maior parte dos alimentos podem ser consumidos na íntegra. Repare, antes da Segunda Guerra Mundial as sociedades mudaram muito. Hoje, por exemplo, desmerecemos a rama de muitos vegetais, que é excelente. Damos demasiada importância ao peixe e à carne.

Que memória trouxe dos países que visitou?
Da Tailândia, julgo que o título do capítulo sintetiza “sob telhados dourados”. Do Nepal, as montanhas dos Himalaias. De Marrocos, os berberes e o deserto. Já no Vietname, passear nos arrozais, a concretização de um sonho pessoal. O Brasil, significa amizade, o sentir-me em casa e o convívio com a natureza. Ainda na América do Sul, no Peru, a cozinha “feita com o coração”. No Camboja retenho os sorrisos. Na Índia estive no sul, no estado de Querala, onde casei, nos arrozais. Finalmente, Portugal, tenho de eleger um produto, o pão. Temos muitas receitas com pão e, ai, destaco a açorda. Detestava-a até aprender a fazê-la com o meu sogro que é de Baleizão, no Alentejo. É claro que estando a falar do nosso país não posso deixar de referir a importância do regresso às origens.

Jorge Andrade