O projeto nasceu há três anos quando foi lançado ao maestro Sérgio Peixoto, que dirige o coro da Universidade Católica, o desafio de criar um projeto para integrar os alunos do curso de Língua Gestual na vida da universidade.

Sérgio Peixoto nunca tinha tido contato com pessoas surdas, mas aceitou o desafio. A solução encontrada foi integrá-los através da música, criando o coro “Mãos que cantam”, contou à agência Lusa o maestro.

A primeira música escolhida foi “Imagine”, de John Lennon, que foi traduzida para Língua Gestual, mas não literalmente.

“O que fomos descobrindo ao longo do tempo é que seria interessante uma transcrição para Língua Gestual que significasse alguma coisa, que fosse algo realmente artístico”, disse Sérgio Peixoto.

Aos poucos, os elementos do coro foram descobrindo sinais gestuais, aliados ao ritmo da música, compreensíveis pelos surdos.

“Eles começam a ter uma perceção muito importante do tempo espacial da música, da respiração da música, porque a música não é só notas, notas e notas. É também isso, mas muito mais, é sentimento, emoções que se pretendem também transmitir através dos gestos”, disse o maestro.

O projeto, único na Europa, cresceu de “tal maneira” que a universidade concorreu ao programa Partis da Fundação Calouste Gulbenkian, que apoia projetos artísticos de integração social, e foi um dos 17 selecionados.

“Tornou-se num projeto educativo e o objetivo é construirmos sinais gestuais ligados à música e à surdez” que possam ser transmitidos aos alunos e professores surdos nas escolas, disse Sérgio Peixoto.

É também uma forma de os integrar na sociedade e “nós ouvintes conhecermos e percebermos um bocadinho o que é ser surdo” e compreendermos que não há limitação, há é uma maneira diferente se sentir a música”.

“O grande objetivo quando fazemos uma atuação é sentir que as pessoas conseguem compreender que, apesar de serem deficientes auditivos, conseguem superar as suas deficiências e conseguem realizar algo artístico que toca e emociona as pessoas”, sublinhou.

A música também é sentida pelos surdos através do movimento, como disse à Lusa a coreógrafa Ana Figueira, autora do projeto “Segredo Secreto”, um espetáculo de dança que junta bailarinos ouvintes e surdos sem formação em dança.

“Há muitas formas de comunicar e a dança é uma dessas formas que utiliza o movimento e o corpo, assim como a Língua Gestual”, disse Ana Figueira, contando que “os surdos têm uma capacidade muito grande de entender o movimento e de memorizar”.

“Um surdo também ouve e também sente. Sente a vibração”, disse a coreógrafa, que começou este projeto por “ser apaixonada” pela Língua Gestual, ”uma forma muito bonita de comunicar”.

A relação entre a música e pessoas surdas vai estar hoje em debate em Lisboa e no Porto numa iniciativa promovida pela Acesso Cultura, associação que integra profissionais da cultura e pessoas interessadas nas questões de acessibilidade.

Ao preparar este debate, a associação encontrou uma realidade que desconhecia: músicos, bailarinos e elementos de coros que não ouvem, mas que a música está presente na sua vida.

Estes debates pretendem “tocar em assuntos que habitualmente não pensamos e descobrir que o mundo é muito mais do que aquilo que se passa à nossa volta e que há outras formas de viver igualmente válidas”, disse a diretora-executiva da associação, Maria Vlachou.