São autênticos "contos de fadas" da vida real que mostram que ainda vale a pena lutar pelo amor. Alberto Miranda, especialista em famílias reais, dedicou o seu mais recente livro a esta temática. Em 'De Plebeias a Princesas e Rainhas' o autor conta-nos as histórias de mulheres - e um homem - que entraram para o "grupo mais exclusivo e elitista" do mundo: a realeza.

Em pleno Dia de São Valentim relembramos, através da conversa que se segue, romances que ainda fazem sonhar milhões de pessoas em todo o mundo e que provam que o cupido ainda faz das suas.

Começo com uma frase de Margarida II que destaca no início do livro - "São precisos dois para se fazer um bom casamento". No caso dos enlaces reais, o que mais será preciso?

São precisos dois, de facto, mas funcionam como um todo. São histórias de amor entre meios opostos, com circunstâncias de vida diferentes, mas o cupido fez das suas e acabou por resultar em casamentos.

Celebrando-se hoje o Dia dos Namorados não poderia ser mais pertinente o tema.

Sim. Um dos melhores exemplos será o dos grão-duques do Luxemburgo. A sua história de amor é feita da superação de vários obstáculos. Eles casam-se no Dia de São Valentim como uma prova de que o amor tudo vence.

Maria Teresa do Luxemburgo é uma cubana exilada que conheceu Henri, seu marido, numa universidade na Suíça. O casal deu o nó no Dia dos Namorados, em 1981© Getty Images

É uma história com todos os clichés, inclusive o facto de Maria Teresa, alegadamente, não saber no início que Henri pertencia a uma família real.

É um pouco um mito porque eles nunca contaram essa versão, dizem sempre que se conheceram através de amigos em comum. Essa é uma história que a imprensa deu na altura... Mas quando fizeram 40 anos de casados deram uma entrevista na qual disseram que passavam bastante tempo juntos.

Se as pessoas não se identificarem, porque o carisma é sinónimo de identificação, então a monarquia não é firmeComo Manuel Luís Goucha destaca no prefácio do seu livro, houve aqui uma clara mudança de paradigma. Se antes os casamentos reais aconteciam por vantagens estratégicas, hoje tal não acontece.

Estas histórias são reflexo dessa mudança de paradigma. Até à Sónia da Noruega, os príncipes casavam entre si, como foi o caso de Juan Carlos com Sofia - na altura princesa da Grécia. Era este modelo de casamento entre iguais, da endogamia, que é casar-se entre si.

As Casas Reais aburguesaram-se, tornaram-se mais próximas do público. Um outro exemplo é o casamento de Vitória da Suécia com Daniel Westling, o de Matte-Marit com o príncipe Haakon e até mesmo Kate Middleton com o príncipe William.

Estas uniões contribuem para o aumento do carisma das famílias reais, que é muito importante. Se as pessoas não se identificarem - porque o carisma é sinónimo de identificação - então a monarquia não é firme. O que explica esta euforia à volta das monarquias é o carisma que elas emanam.

Ser plebeu não é um termo depreciativo, apenas define alguém que não tem sangue azulE hoje o conceito de plebeu já não carrega o peso que carregava antigamente.

O termo plebeu existe e significa que tem origem no povo, mas não tem aqui uma conotação negativa porque cada um vem de onde vem. Agora, há diferenças. Não nos podemos esquecer que Felipe VI de Espanha foi educado para a realeza, a Letizia não, era agnóstica e foi educada por uma família que não tinha um culto da monarquia. Ser plebeu não é um termo depreciativo, apenas define alguém que não tem sangue azul.

Mas ainda existem puristas nesta questão? Que acreditam que a realeza apenas se deva casar entre si?

O casamento de Letizia de Espanha foi o reflexo disso mesmo. Havia uma fação da aristocracia que não a via com bons olhos. Sim, existem os puristas que acham que o casamento deva ser entre si. Chegou a escrever-se na altura que a rainha Sofia tinha ficado incomodada com o casamento do filho, mas ela veio a dizer que o casamento entre um príncipe e uma mulher da classe média é uma grande mostra de modernidade.

Letizia já foi várias vezes definida pela imprensa como uma mulher obstinada...

Porque a Letizia tem este complexo do berço. Sabe que não é igual ao marido em termos de genealogia, não tem avós reais, e por isso mostra-se uma figura exemplar, o que não tem conseguido a 100%. Mas ela e Felipe VI foram considerados a salvação da monarquia quando Juan Carlos abdicou.

No próximo dia 22 de maio, Felipe VI e Letizia de Espanha completarão 20 anos de casamento© Getty Images

Felipe VI mostra-se bastante sóbrio quando comparado com o pai, até porque nunca foi ligado a nenhuma traição.

Ele tem a noção do cargo que ocupa. Porque é que a história do Harry foi tão polémica? Porque era a antítese. Ele foi educado para dar o exemplo, não para condenar a própria instituição em que nasceu. Quer queiramos quer não, a realeza é o núcleo mais fechado do mundo, é uma verdadeira elite, com esta aura à volta pelo facto de ser hereditário.

Eles não têm escolha...

Diz bem, eles nascem para o trono.

Mas no caso de Harald da Noruega, após 10 anos de namoro com Sónia, este fez um ultimato para que pudesse casar com o amor da sua vida.

Eram outros tempos, outras circunstâncias, o mundo evoluiu tanto... De facto foi preciso fazer esse ultimato, dizer ao pai que continuava a trabalhar para a coroa, mas que não casaria e ao não casar era o fim da casa real.

Harald e Sónia da Noruega deram o nó em 1968 após 10 anos de namoro. O pai do noivo não aceitava aquela que viria a ser sua nora por ser plebeia© Getty Images

Mas também há o reverso da medalha. Embora tenha casado por amor, Carlos Gustavo da Suécia chegou a ser acusado de trair a rainha Silvia, o que gerou polémica.

Por causa da dimensão real dele, mas mostrou igualmente a dimensão humana. O papel de rei tem de ser o de exemplo. A traição já é um assunto polémico por si, numa família real é uma bomba, é um elefante a entrar numa casa de porcelana.

Carlos XVI Gustavo da Suécia disse o 'sim' a Sílvia em 1976© Getty Images

Foi o que aconteceu com o rei Frederico X, quando surgiram fotografias com a socialite Genoveva.

Foi um choque porque víamos nele um homem completamente apaixonado, o que chorou lágrimas grossas no casamento. Foi um facto inesperado.

Manuel Luís Goucha na apresentação do meu livro disse que não acredita nesse casamento... Há uma outra situação igualmente curiosa, a do Mónaco. Com frequência, Alberto e Charlene do Mónaco veem-se obrigados a emitir comunicados a negar rumores de crises no casamento.

Manuel Luís Goucha na apresentação do meu livro disse que não acredita nesse casamento... Não serei tão drástico, mas de facto tem sido um casal de constantes rumores de todo o tipo. Charlene é considerada a princesa triste, a noiva em fuga, diz-se que será um casamento por conveniência. É um conjunto de episódios que tem dado esta fama de casamento infeliz.

Atleta olímpica, Charlene Wittstock abandonou a carreira de nadadora para casar com Alberto do Mónaco. Pouco antes do casamento, a imprensa monegasca noticiou que a princesa teria tentado fugir para a África do Sul, mas que acabou por ser convencida a seguir em frente com o casamento. Hoje, é considerada a "princesa triste"© Getty Images

Ora, se por um lado temos Charlene do Mónaco, considerada a "princesa triste", por outro há a epítome da alegria na figura de Máxima dos Países Baixos.

Sim, é considerada muito emotiva e espontânea nos gestos. A Máxima é também sul-americana e isso também dará um cunho pessoal à própria.

É um contraste engraçado com o marido, o rei Willem-Alexander.

É luterano, calvinista, mais contido, reservado... Mas lá está: o cupido fez das suas. Ela não fazia a menor ideia de quem ele era e os mundos opostos atraíram-se e são um dos casais mais estáveis da atual realeza europeia.

Máxima Zorreguieta, antiga bancária, apaixonou-se por Willem-Alexander em Sevilha. Após o casamento, em 2002, e subida ao trono, tornou-se a primeira rainha europeia vinda da América Latina, conforme destaca Alberto Miranda © Getty Images

E se dúvidas ainda restassem relativamente ao novo paradigma dos casamentos reais, temos o caso óbvio de Mette-Marit e Haakon da Noruega.

Ela tinha um passado muito polémico, mas lá está, poderia a Noruega, país do prémio Nobel da Paz, fazer guerra à escolha do príncipe herdeiro? Poderiam os pais de Haakon oporem-se à escolha do filho quando eles próprios tiveram de esperar 10 anos para casar? Nada disso aconteceu. Mette-Marit admitiu que teve um passado ligado às drogas e o povo igualitário da Noruega rendeu-se ao charme desta mulher que já tinha um filho de uma outra relação.

Mette-Marit tinha um passado negro quando assumiu a relação com o príncipe Haakon. Confessou ter estado ligada ao mundo das drogas e tinha um filho de um relacionamento anterior© Instagram/ Det Norske Kongehuset

Este sangue plebeu, a sua entrada nas cortes, galvaniza as emoções e a euforia popular coletivaÉ a prova que é possível haver a adaptação a uma nova realidade.

Este sangue plebeu, a sua entrada nas cortes, galvaniza as emoções e a euforia popular coletiva. Não deixa de ser curioso em países como a Noruega, Suécia, Dinamarca ou Países Baixos que aceitam e gostam! Os contos de fadas da atualidade, dentro das casas reais, ultrapassam fronteiras.

Não há uma escola que ensine a estas pessoas a serem príncipes, princesas, ou rainhas. Eles têm de aprender com os exemplos e depois dar o seu toque pessoal. E isso faz muita diferença. Isso trespassa a emoção e dedicaçãoMas é preciso haver uma preparação quando se entra numa família real.

É fundamental. O próprio Daniel da Suécia disse isso mesmo, que demorou [a casar] não por não estar seguro dos seus sentimentos, mas porque precisava de perceber o mundo para o qual ia entrar.

Não há uma escola que ensine a estas pessoas a serem príncipes, princesas, ou rainhas. Eles têm de aprender com os exemplos e depois dar o seu toque pessoal. E isso faz muita diferença, pois trespassa a emoção e a dedicação. A comunicação não verbal transmite uma mensagem, que está quase sempre associada ao sonho, ao luxo, ao glamour, mesmo sabendo que a vida deles não é apenas isso. Têm um trabalho de muito mérito em dar visibilidade a causas solidárias.

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