Numa série de entrevistas com Jean-Noël Jeanneney, que vão ser transmitidas numa rádio francesa a partir desta semana, Anne Pingeot,  curadora do Museu d'Orsay, fala "com pudor, mas sem tabus", da sua relação secreta com o ex-presidente socialista, que morreu em 1996 vítima de cancro.

A história deste amor viaja no tempo até à década de 1950, quando o pai de Anne Pingeot convidou um grupo de amigos para jogar golfe na sua casa de férias em Hossegor, entre eles François Mitterrand. Anne tinha, na época, 14 anos e Mitterrand 41.

A paixão, no entanto, só se concretizaria cinco anos mais tarde precisamente em Hossegor. A primeira carta do ex-presidente francês data de outubro de 1962.

“Eu não sei se fiz bem”, ao publicar a correspondência e o seu diário pessoal, explicou Anne Pingeot. Mas na sua opinião, esta publicação faz todo o sentido pois fornece “uma melhor compreensão sobre uma das maiores figuras da história do país do século XX”. “Lettres à Anne (1962-1995)” reúne mais de 1200 cartas enviadas pelo ex-chefe de Estado.

Aceitar o inaceitável

Depois de anos de hesitação, Anne concluiu que as cartas deviam ser publicadas enquanto estivesse viva. “Tenho 73 anos e organizei tudo”, afirmou justificando o receio de que a publicação não fosse feita da forma mais correta.

Descendente de um dos seis marechais franceses da Primeira Guerra Mundial, Anne Pingeot recorda o peso da tradição nas grandes famílias burguesas francesas. "O que ouvi, por exemplo, sobre a visão da mulher... que a mulher é alguém que tem que ser submissa, sem nenhuma vida intelectual" e assim "esta parte da submissão fez, no fundo, com que eu aceitasse o inaceitável", afirmou.

Em 1962, François Mitterrand estava casado e com dois filhos. O político nunca ponderou divorciar-se da sua esposa Danielle Gouze.

O romance deixou de ser clandestino em 1994, quando os franceses descobririam a sua existência, escandaloso para alguns, através da publicação de fotografias do presidente com a sua filha Mazarine, nascida em 1974, fruto da sua relação com Anne.

As muito discretas Anne e Mazarine apareceram pela primeira vez em público no dia do funeral de François Miterrand, em janeiro de 1996, ao lado da viúva, Danielle, que faleceu em 2011.