Os seus netos também já gostam de culinária?
J.N.: Gostam. O Gabriel já conhece a receita das panquecas, já prepara ele tudo e é só eu ajudar, só no fogão é que ainda não mexe. A Mónica está a começar a mexer em facas, estou a começar a ensiná-la, mas os outros não: untam forminhas, lambem a terrina dos queques (risos) mas mais nada. Já estão um bocadinho presentes quando eu estou a cozinhar.
E gostam?
J:N.: Gostam, gostam, mas eu acho que é aquele gostar de criança, para eles é só um brinquedo diferente. Por exemplo, a Mariana ontem à noite enquanto eu estava na cozinha chamou-me, levou-me de mão dada e disse “Vó, uma surpresa para ti, tens de fechar os olhos” e quando cheguei, lá estava um piquenique, “É só para nós as duas!” Não quis partilhar o piquenique com a Mónica nem com o Gabriel. Quando brinco com eles aos restaurantes uma vez um é o chefe, outra vez é o cozinheiro, (têm todos jalecas de cozinha iguais às minhas), de vez em quando tiram o pedido e depois escrevem e põem coisas na mesa...são brincadeiras!
E pedem para lhes contar histórias?
J.N.: Muitas! Querem história com história, que é uma história dum livro e depois, para aguentarem mais um bocadinho sem adormecer com a luz apagada, querem história sem história: eu invento uma história, e depois eles também têm de fazer o mesmo. Têm muito jeito para inventar histórias, até a Mariana conta uma história. Normalmente contam a história dos “Três Porquinhos e o Lobo Mau”, mas na versão de os Três Netinhos: um faz a casinha de palha, que a mais pequenina a Mariana, o Gabriel faz a casa de madeira e a Mónica que é a mais crescida, é a mais protectora, faz a casa de tijolos.
E conhecem a realidade da cidade e do campo?
J.N.: Sim, é importante eu dizer que a fruta está ali na árvore, que as batatas estão debaixo da terra, que a vaquinha dá leite, que o esparguete não é do supermercado... Quando vamos para a aldeia vamos sempre a falar das árvores, e eu faço perguntas para eles começarem a conhecer um bocadinho de tudo o que há no campo.
Recorda-se da primeira vez que ouviu a palavra avó?
J.N.: Ah não sei, ela devia ser tão pequenina! A Mónica já tem quase 10 anos, mas creio que a seguir a terem dito «pai» e «mãe» devem ter dito «avó», porque sempre foram muito ligados a nós, mas não me lembro quando.
Fica-se com o coração derretido, não?
J.N.: Claro que ficamos! Qualquer coisa que eles façam, as festas de Natal que eles fazem no colégio, o que for, a gente fica sempre com o coração derretido, claro que sim!
Então o seu foco agora são os netos?
J.N.: O meu foco continua a ser a família, mas de qualquer maneira nos meus tempos livres o meu foco principal agora são os netos.
Se tiver um outro compromisso num dia importante para o neto, o neto ganha sempre?
J.N.: Ganha mesmo! Se eu puder fazer ambos, tudo bem, senão...os netos estão primeiro e não tenho pudor em dizer às pessoas porque é que não posso ir. Todos sabem que os meus netos estão primeiro!
Aquilo que não se fizer hoje com eles pode já não vir a fazer, e há histórias que não se repetem, não é?
J.N.: Eu sei que houve muitas coisas que não fiz com o Filipe porque éramos novos, tínhamos de trabalhar, estávamos a construir a nossa vida. Sempre que estávamos juntos tentávamos que fosse um tempo bom, um tempo bem partilhado, sempre com qualidade. Hoje em dia, tiro uma semana de férias com os netos, e depois preciso de outra para descansar: eles são três e eu já não tenho 30 anos! Fico cansada, mas feliz. O avô já anda a pensar onde é que vamos este ano, se calhar a aldeia porque temos lá casa. Preferimos não viajar para muito longe para podermos estar com eles.
E nessa semana que estão com os netos os pais não estão com eles?
J.N.: Às vezes sim, outras vezes não – eles é que escolhem.
Há muita gente que diz que os pais educam e os avós deseducam. Como é no vosso caso?
J.N.: Nós até ensinamos as regras, mas se eles insistem três vezes acabamos por quebrá-las. Os avós, só muda a morada, de resto são todos iguais.?
Como é a mais velha em relação aos mais novos?
J.N.: Se estiverem num ambiente familiar, até é capaz de se estar nas tintas para eles, mas em público eles protegem-se uns aos outros. São muito cúmplices e é isso que eu gosto de ver neles. Em casa são capazes de andar à tareia - que eles chegam a andar à tareia!
Costuma estar a observá-los à distância, sem dizer nada?
J.N.: Às vezes, chego ao colégio, eles estão no recreio e eu fico a vê-los, ou mesmo em casa fico toda derretida a olhar para eles... São a minha paixão, não há nada a fazer.
E quando olha para trás para a menina que saiu de Macedo de Cavaleiros aos 15 anos, sente que os seus sonhos se tornaram realidade?
J.N.: Os sonhos que eu tinha eram de uma vida melhor: uma profissão a que me agarrar, dar uma vida boa ao meu filho para que ele pudesse estudar num bom colégio, viver numa boa casa... O que todos os pais querem para os filhos! Graças a Deus, realizei esse sonho e os meus netos também estão a ter essa vida. Claro, se não tivesse tido aqueles revezes que lhe contei, as coisas poderiam estar melhor. Mas felizmente têm saúde e têm amor, e isso é o mais importante. Além disso continuamos de pé, continuamos unidos, temos um casamento de quase 40 anos...
E reconhecida pelo trabalho que faz, e isso é bom.
J.N.: Sim, eu gosto de ser reconhecida pelo que faço, pela pessoa que sou. Não tenho duas faces, isso é que é importante e verdadeiro.
E ainda lhe faltam realizar alguns sonhos?
J.N.: Falta sempre, a obra nunca está completa e eu não quero parar! Já viu se aos 57 anos eu já tivesse tudo feito?! Então o que é que eu ia fazer daqui para frente! Para já, quero morrer velhinha, muito velhinha...
E na cozinha?
J.N.: Sim, claro que sim. Eu amo aquilo que faço, portanto para mim não é sacrifício, é canseira, mas é o que eu gosto.
Ficaria feliz daqui a uns anos de ver os seus netos à frente de um restaurante “O Nobre”?
J.N.: Eu sempre disse ao meu filho, desde que ele era pequeno: tanto me importa que sejas pedreiro como engenheiro, só me interessa que sejas um grande homem e feliz. Com os meus netos é a mesma coisa. O meu filho não tirou nenhum curso superiorn e eu não fiquei frustrada por isso! Nunca vou impôr nada, e não acredito que o meu filho e a a minha nora lhes imponham algo nesse sentido porque eles também fizeram o caminho deles. Agora, claro que se alguém tiver jeito e quiser ficar com o negócio, se eu cá estiver para ver, ficarei feliz. Mas nós criámos a nossa empresa para ganharmos a nossa vida enquanto fazemos o que gostamos, e eles que sigam o caminho deles e que sejam felizes.
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