Aos 31 anos, Duarte Gomes conta com vários trabalhos na sua carreira de ator, uma profissão que escolheu na juventude, tendo concluído o Curso Profissional de Artes e Espetáculos na Escola Profissional de Artes e Ofícios do Espectáculo EPAOE - Chapitô, em 2004.

Quando terminou o curso, entrou logo para o mundo televisivo, com participações em programa infantis na RTP2: ‘As Pistas da Blue’, ‘Zig Zag’ e ‘Ilhas das Cores’.

Depois dessa experiência, integrou o elenco da série ‘Morangos com Açúcar’ e, desde então, deu vida a vários papéis da ficção nacional, como Miguel em 'Beijo de Escorpião', em que conviveu com a homossexualidade.

Em conversa com o Fama ao Minuto, o ator falou sobre as experiências que marcaram a sua carreira profissional, recordando ainda a sua infância.

Passou a sua infância num bairro social. Sente que isso mudou a sua perspetiva e maneira de viver? Que contribuiu de alguma forma para o seu percurso?

Sim. Todas as nossas vivências vão ter impacto nas nossas decisões e na maneira de olhar para as pessoas e para as próprias situações. Vivi num bairro social. Felizmente, a minha família sempre teve tudo para nos dar, o básico, nunca passei por nenhum tipo de problemas. Mas, sim, convivi com pessoas que tinham algumas dificuldades em casa, [como] seis pessoas que viviam num t2. Pessoas que tinham algumas dificuldades económicas e eram meus amigos. Obviamente, essa realidade vai acompanhar-me sempre. [No entanto], como não experienciei de outra forma, não tenho nenhum termo de comparação para saber se olharia as coisas de uma maneira diferente. Também tem muito a ver com a nossa educação. Em criança é a fase mais importante para nós. Temos o nosso caráter, isso nasce connosco, não é uma decisão que os nossos pais tomam, mas a maneira como os nossos pais nos encaminham vai ter muito impacto no nosso futuro.

Fui muito feliz com os meus pais separados porque sempre estive com os dois

A separação dos seus pais foi uma fase dramática na sua vida? Como é que lidou com essa condição na altura?

Tinha à volta de cinco anos. Lembro-me de ver os meus pais juntos em casa, mas essas memórias são muito curtas. Fui muito feliz com os meus pais separados porque sempre estive com os dois, com a minha mãe durante a semana e com o meu pai ao fim de semana. O meu pai era muito ligado ao desporto e eu sempre fiz desporto com ele. O meu pai acabava por ser um bocadinho a pessoa mais divertida naquela fase e a mãe a que nos dava mais disciplina, a que nos obrigava a fazer os trabalhos, a estudar... Mas eles acabavam por se complementar, independentemente de estarem separados. E eu vejo agora que o meu pai e a minha mãe não têm muito a ver [um com o outro]. Foi uma separação pacífica e isso não chocou. Se calhar se fosse mais tarde, se vivesse 10, 12 anos com o meu pai, talvez fizesse diferença deixar de vê-lo em casa.

Quando é que sentiu que a representação era a sua vida?

Tudo começa por uma coisa muito simples que é no 9.º ano ter de escolher a área para seguir. Nenhuma das hipóteses que me davam na escolaridade dita normal era atraente para mim, tanto que eu sempre fui um aluno razoável porque não tinha motivação. A minha motivação era passar porque era uma obrigação. Gostava de aprender, mas não gostava de aprender tudo. Chegou uma altura que eu achei que a escolaridade normal não era para mim. Sempre achei graça ao teatro, experimentei teatro amador, na altura até dizia que era um bocadinho amador demais, sem nunca ter percebido nada. Não tinha ninguém, nenhum familiar ou amigo que me pudesse apoiar e para me informar sobre a carreira. A minha minha mãe quis em nova ser bailarina, o meu pai sempre foi um fanático de filmes e isso sempre esteve em mim. Pensei em ir para piloto de aviação comercial porque achava graça aos aviões, a viajar, só que era muito novo para isso. Decidi experimentar [o teatro]. Falei com a minha mãe e ela apoiou-me e ajudou-me a escolher a escola.

Foram logo nove meses em chroma interativo, que é super difícil. Foi divertido, mas super complicado

Começou na televisão num programa televisivo dedicado ao público infantil, 'As Pistas da Blue'. Como foi viver essa experiência?

Tinha acabado o curso há pouco tempo. Já tinha tido um espetáculo, ‘Romance da Raposa’, depois estava a fazer ‘O Auto da Barca do Inferno’ quando surgiu essa oportunidade. Era a minha primeira experiência em televisão. Foram logo nove meses em chroma interativo, que é super difícil. Foi divertido, mas super complicado.

Nessa altura, as crianças reconheciam-o na rua? Iam ter consigo?

Como fiz muito tempo antes de passar na televisão (gravei em 2004 e 2005 e passou em 2006), quando estava a gravar não tinha contacto direto com nenhuma criança, só depois é que comecei a sentir esse impacto. Uma das coisas mais engraçadas que me diziam era: ‘Muito obrigado porque o meu filho de manhã come que é uma maravilha’.

Sente que isso lhe deu uma boa bagagem para enveredar no mundo da televisão?

Para mim foi, enquanto ator, experienciar algo que nunca tinha feito. Mas é um bocadinho diferente de ficção. Obviamente que era uma personagem, mas eu tinha de fazer tudo para a câmara. Na ficção não trabalhamos para a câmara. Aquele programa era um contexto completamente diferente do que se pode vir a fazer. Acho que nem a RTP sabia o quão difícil era fazer aquele programa.

Hoje voltava a comandar um formato infantil?

Agora acho que não, sem desprimor nenhum. Adorei fazer, mas as personagens que eu procuro agora são mais densas, que puxem por mim, ou personagens divertidas. Mas foi uma fase maravilhosa.

Uma das pequenas falhas - ou não, depende da perspetiva - nas escolas é não ter técnica de televisão

Depois da RTP2, começou um projeto na TVI, a série ‘Morangos com Açúcar’. Como foi toda essa mudança?

Depois [de 'As Pistas da Blue'] fiz mais dois programas na RTP e um deles, que era a 'Ilha das Cores', já era próximo do que é a chamada dita ficção, no sentido em que já era com cenários, com outros atores. Cada um tinha a sua personagem e aí já senti o que é fazer televisão. Uma das pequenas falhas - ou não, depende da perspetiva - nas escolas é não ter técnica de televisão. Aprendemos a trabalhar. Com a ‘Ilha das Cores’ eu já tinha um bocadinho essa bagagem e quando cheguei aos ‘Morangos com Açúcar’ já estava relativamente preparado.

Mas no fundo a sua personagem em ‘Morangos com Açúcar’ era bastante diferente das que teve na RTP.

Sim, tudo diferente e foi uma mudança que tinha de ser feita em televisão porque também queria que as pessoas me vissem noutros formatos. Corremos sempre o risco de ter um rótulo, seja ele qual for. Tento sempre camuflar-me um bocadinho e fugir desse rótulo. Os ‘Morangos com Açúcar’ para mim apareceram na altura certa. Aprendi muito.

Acha que foi, de certa forma, um ponto de partida para conseguir agarrar a carreira no mundo da representação?

Sim, tudo tem o seu peso. Quando fazemos um casting nunca sabemos por que razão ficamos e quando não ficamos também não sabemos porquê. Às vezes pode ter sido um projeto de que gostámos menos e em que se calhar aprendemos muito mais. Outras vezes é um projeto em que nos divertimos, mas que não estávamos a fazê-lo assim tão bem.

Isto porque há muito a ideia de que os ‘Morangos com Açúcar’ foi o lançamento para novos atores na representação portuguesa.

E isso foi, de facto, porque era a única série de ficção que nós tínhamos em televisão naquela altura que realmente apostava nos jovens. Daí saíram atores fantásticos. Alguns ficaram pelo caminho, muitos continuaram. Aquilo era um curso intensivo porque nós gravávamos muitas horas, todos juntos, tínhamos uma fantástica direção de atores e éramos obrigados a melhorar. Viu-se depois que quem queria muito se foi focando mais e tentando aprender mais, buscando coisas fora dali para conseguir atingir outros objetivos.

É sempre difícil fazer uma cena íntima seja com um homem ou com uma mulher

Interpretou mais tarde Miguel na novela 'O Beijo de Escorpião', em que conviveu com a homossexualidade e protagonizou algumas cenas íntimas. Foi um desafio difícil para si?

Quando me desafiaram, não vou mentir, fiquei contente. São sentimentos que eu desconheço, coisas que não vi os meus amigos passar porque a personagem Miguel [ao início] escondia a sua orientação sexual. Nunca conheci ninguém que dissesse: ‘Estou completamente enganado, eu sou feliz é por aqui’. Tentar imaginar isso foi um desafio fantástico. Em relação às cenas íntimas, é sempre difícil fazer uma cena íntima seja com um homem ou com uma mulher. Não vou dizer que foi fácil, como também não vou dizer que as outras foram. Há sempre uma intimidade que é quebrada.

Acha que hoje em dia já há mais abertura da sociedade para aceitar os que têm escolhas diferentes?

Acho que sim. Obviamente existe o racismo e uma data de coisas que eu não percebo porquê. O caso da homossexualidade é exatamente a mesma coisa, é uma orientação sexual... há pessoas a dizer que é uma doença. Isso é ridículo. As pessoas nascem assim, nós gostamos disto ou daquilo. As pessoas não devem ser julgadas por causa disso. Não são piores profissionais, não são piores pessoas... não percebo porquê. Espero que [a novela] tenha quebrado algumas barreiras e que tenha feito com que as pessoas abram alguns horizontes. Na altura recebi um feedback fantástico.

Já interpretou vários papéis no mundo da televisão. Um dos últimos trabalhos foi na série 'Massa Fresca'. Como foi regressar a um formato juvenil?

Foi bom. O meu Francisco tinha muitas nuances emocionais, teve de passar por muita coisa na vida dele. Apaixona-se, perde um irmão e tem de cuidar dos sobrinhos quando nem dele próprio cuidava... Isso foi muito giro para mim. Tenho esse lado de família, gosto de estar com a minha família, com os meus amigos que também são a família que eu escolhi. Imaginei o que seria perder uma pessoa muito próxima e eu já perdi, um avô... Foi uma personagem que gostei muito de fazer porque jogou também muito comigo, Duarte. E depois diverti-me muito a gravar com malta nova. Achei que a personagem estava muito bem escrita, credível. Um projeto que vou guardar no coração.

Faz parte da série 'Sim, Chef!'. Este é mais um projeto diferente dos que já fez até aqui. Como descreve esta experiência.

É uma série de comédia, com ritmos diferentes. Fora das gravações, as pessoas estão noutro ambiente, a tentar fazer partidas uns aos outros, a fazer rir uns aos outros. O ambiente é bastante diferente.

Na vida real, Duarte Gomes é um bom chef de Cozinha?

Faço algumas coisinhas: Grelhados, peixe... coisas relativamente básicas, ou seja, não faço feijoadas... Ainda não domino essa arte, apesar de gostar da comida tipicamente portuguesa.

Qual foi para si o trabalho que mais o desafiou e porquê?

É difícil. Em televisão tenho uma paixão louca pelo ‘O Bairro’. Gostei mesmo de fazer aquela série. Tivemos uma preparação incrível com luta, aprendemos luta cénica, manuseamento de armas, como desmontar e montar uma arma, como funciona uma bala, fizemos condução defensiva… Todo o núcleo de atores era incrível. Criámos mesmo um gang à séria, criámos uma união fantástica que dura até hoje. Tenho um carinho especial pelo ‘Massa Fresca’ e depois gosto do último projeto que estou a fazer. Neste caso, 'Sim, Chef!' foi algo que eu nunca tinha feito.