Não é todos os dias que um líder religioso fala em público a favor da homossexualidade e do casamento gay. O Dalai Lama arriscou. Casamento entre homossexuais? “É uma questão legal e cada país deve decidir por si”, disse. “Por mim, tudo bem, é uma questão pessoal. Se um casal de duas pessoas se sente satisfeito e concorda, tudo bem.”

As declarações do monge budista e líder espiritual do Tibete foram feitas numa entrevista recente que deu a Larry King, difundida pelo canal Ora TV. Para o Dalai Lama, os fiéis de uma religião devem “seguir a tradição”, enquanto os não-crentes são livres de viver a sua homossexualidade.

Para o grande público, aquela opinião pode ser sinal de um pensamento liberal e progressista. A defesa do casamento gay tem vindo a ser entendida, de uma forma geral, como um reconhecimento dos direitos das pessoas homossexuais. Fala-se em “direitos humanos”. Há, no entanto, correntes dentro do movimento LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgénero) que consideram o casamento uma causa conservadora e inadequada.

Veja-se a já famosa frase de 2011 do primeiro-ministro britânico. “Não apoio o casamento gay apesar de ser conservador, apoio o casamento gay porque sou conservador”, disse David Cameron. “É uma questão de igualdade, sim, mas também de compromisso. Os conservadores acreditam nos laços que unem as pessoas e acreditam que a sociedade é mais forte quando nos apoiamos e nos comprometemos uns com os outros.”

Logo em 1989, quando o tema começou a ganhar protagonismo nos EUA, o comentador Andrew Sullivan, gay e conservador assumido, dizia que a política do movimento LGBT assentava mais na divisão e no antagonismo do que no compromisso com a sociedade. “A maior parte dos líderes de opinião gays agarra-se à ideia de que ser gay é ser ‘outsider’, anti-burguês e radical”. Mas, concluía Andrew Sullivan, “ser gay e burguês não é assim tão absurdo”, pelo que “legalizar o casamento gay vai dar aos homossexuais o mesmo que já hoje é dado aos heterossexuais: aceitação social generalizada e vantagens legais em troca de comprometimento, profundo e sério, perante outro ser humano”.

Longe desta opinião, o escritor britânico Mark Simpson escrevia em 2009 no jornal “The Guardian” que “a maior parte dos gays parece ter-se esquecido de que o sexo homossexual não é tremendamente respeitável e nunca será, por muito que se queira falar em vida doméstica gay”.

Em Portugal, no calor do debate público que levou à legalização do casamento em janeiro de 2010 (com entrada em vigor em junho desse ano), o crítico de artes António Guerreiro rematava no jornal “Expresso”: “Pode parecer uma revolução, mas é uma revolução conservadora.”

Bruno Horta